As férias de Oscar (julho de 2011)

Hora do almoço, e meio expediente cumprido, Oscar levanta-se da escrivaninha, junto à janela do escritório imobiliário, e antes de atravessar a sala rumo à gerência acena para uma colega de trabalho que estava do outro lado da sala; ela conclui “é a hora de falar de férias com o patrão”, murmurando para si mesma. Esta era Sueli.

Assim, os olhos de Sueli e Oscar encontraram-se por um instante. Mas, Oscar seguiu em frente rumo à sala da chefia, a gerência, assobiando pelo caminho o hino de seu time de futebol, o Flamengo. Pensou, ao chegar ao final do pequeno corredor, à porta do chefe de repartição, “Eis a sala do seu Durval”, e só então arrumou a gravata para bater depois na porta três vezes.

“Bom dia, seu Durval”, disse Oscar ao entrar na sala, e completou “gostaria de saber se podemos conversar no final do expediente” ao que respondeu seu Durval com um sorriso amigo, “sim, mas o caso é pertinente em quê?” ao que redarguiu Oscar, “É que necessito falar-lhe das minhas férias”. Finalizou o chefe, “Volte então no final do dia e conversamos”.

Oscar fechou então a porta, silenciosamente, e com um sorriso de satisfação talhado na face voltou à sala de trabalho, tamborilando com a ponta dos dedos a parede do corredor que levava da sala da gerência da imobiliária à sala principal de trabalho. Sob o olhar atento de Sueli, Oscar retornou à sala. Murmurou, ela, e gesticulou ao vê-lo: “E aí?”.

Fez-se de desentendido e, sem responder a Sueli, Oscar dirigiu-se à sua escrivaninha, erguendo o telefone (que chamava), e colocando-o sobre a orelha. Franziu assim o cenho, com sinal de tamanha seriedade, e depois disse à pessoa do outro lado do aparelho: “Pois não?” e continuou, “Seu Manuel, pois não? Retorno em minutos a ligação, encontramos uma casa.”

Sentou-se na cadeira e repousou as duas mãos sobre a cabeça. Estava cansado e ainda teria de retornar uma ligação que prometera fazer, porque havia uma venda que não poderia perder. Esta casa, com esforço e alguma sorte, haveria ele de vendê-la para o seu Manuel. Mais de dois meses se passaram com as negociações do imóvel e agora seria hora de vendê-lo.

Uma silhueta feminina parou rente e em frente de sua escrivaninha. Era Sueli. De sua parte, Oscar, de cabeça baixa e com as mãos sobre a cabeça, assim ficou por alguns segundos. “E aí, gente grande?”, disse Sueli. Oscar ergueu a cabeça e lançou um olhar aterrador sobre a colega de trabalho.

“Cruzes, parece que quer me matar. Não faz isso. Queria saber como foi com o chefe... Conseguiu licença para as férias tão sonhadas? Quer dizer, seu Durval vai liberar você para as férias em julho? Olha, eu tive que argumentar com problemas de saúde no ano passado, ou não conseguiria. Você se lembra?”

“Nosso encontro foi muito rápido, não conversamos ainda, mas estou esperançoso em que tudo vá correr bem. Vou ter com o chefe mais tarde, no final do expediente. Já faz dois anos que não tiro férias, e estou finalizando minhas vendas para o mês. Estou acima da meta, faço bem o trabalho de casa... e, para completar, acho que o seu Durval está de bom humor hoje.”.

“Que sorte a sua.” Cumprimentou-o Sueli e continuou, “Onde vai almoçar hoje?” “Podemos almoçar juntos?” Respondeu-lhe o colega Oscar, “Não vou almoçar hoje, tenho de finalizar algum trabalho, dar telefonemas... hoje não almoço. Lembra-se de seu Manuel?” e inteirou, “Encontrei uma casa que, garanto, ele vai gostar. Tenho de mostrá-la a ele amanhã.”.

“Boa sorte, colega”, emendou Sueli. “Vou descendo, estou faminta. Quer que lhe traga alguma coisa da rua?” Encompridou Sueli, mas Oscar fez-se todo de silêncio. “Bom... eh... colega, então vou tomar o elevador e já estou de volta. Diga, por favor, aos clientes que perguntarem por mim que retorno as ligações que fizerem. Obrigada.”

O dia brilhava já a pino, e sob o sol a cidade parecia movimentar-se em grande velocidade. Ônibus em profusão tomavam conta de praticamente todas as vias. Avenidas inteiras, vistas do escritório da imobiliária, pareciam grandes, gigantescos, caminhos de formigas. Para cada ‘formiga’, havia um coletivo ou um automóvel. Um grande formigueiro humano.

Tão logo o horário de almoço terminou, os corretores retornaram ao trabalho sonolentos. Cada um foi para a sua escrivaninha, acoplada a um terminal de computador, e a um telefone. Na tela dos computadores havia fotografias de casas e apartamentos: Imóveis em Vitória e região metropolitana. Oscar era o único no recinto e parecia estar ocupado ao telefone.

“E aí, gente boa? Trabalhando duro?” Disse Sueli para Oscar. E continuou, “Algum cliente para mim? Sabe que necessito muito de uma comissão gorda ainda para esse mês.” Respondeu-lhe Oscar, “Em primeiro lugar, sim, trabalhando duro na venda da casa que lhe falei antes. Em resposta à sua segunda pergunta, Sueli, não ligaram para você enquanto esteve fora. “

Paciente, sabia esperar. Sueli era boa corretora, sempre fechava as metas de vendas, bastava que se aplicasse mais e fosse paciente. Trabalhava no escritório havia muito tempo antes de Oscar, e era uma corretora de referência para todos os clientes que procuravam a imobiliária; um exemplo para seus colegas de trabalho, parecia conhecer tudo sobre a profissão.

Mas, Oscar não sabia pensar em Sueli, não queria pensar na comissão ou nas metas a atingir ao mês. Tudo o que conseguia pensar era nas férias. Se tudo desse certo viajaria para Florianópolis, em Santa Catarina, onde ficaria por um mês na companhia de amigos catarinenses. Havia programado o passeio há muitos meses e faltava-lhe apenas a licença.

Uma gargalhada estrondosa interrompeu o trabalho de todos na sala. Um empregado, chamado Alfredinho, entrou na sala e chamou para si a atenção de todos. O que tinha a dizer era desconcertante provavelmente apenas para Oscar, o que sabia muito bem Alfredinho: “Deixou o prédio pelos fundos agorinha mesmo o seu Durval, pedindo desculpas ao Oscar.”.

Aproximou-se Sueli de Oscar, falando baixinho para que só ele ouvisse: “Eu lhe disse, não é fácil conseguir férias aqui, é osso duro, melhor seria se dissesse que precisa afastar-se por razões médicas. Não vai conseguir férias este ano, e sinto muito por isso.”. Oscar mais uma vez cerrou a face, em profundo silêncio, mas dessa vez suspirou, e respondeu, “Sim, tinhas razão.”.

Leo Marques
Enviado por Leo Marques em 14/07/2011
Reeditado em 13/07/2017
Código do texto: T3094769
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