Ordem Natural das Coisas.

Havia um velório em frente ao cemitério. Pessoas reúnem-se sobre o cadáver. Quem morreu num dia como hoje deve ter olhado o céu azul e a placidez do dia e exclamado: que dia lindo pra se morrer!

A ordem natural das coisas é imutável. Uns vão, outros vem vindo, uns dirigindo caminhões, pedreiros, juízes nos fóruns ditando a lei, comerciantes ansiando por dias melhores, o agosto chegando..., todo mundo feito formigas, para lá e para cá, transitando cada qual com seus porquês, suas histórias, suas lutas, alegrias e tristezas.

Há pessoas furiosas dentro dos edifícios, das casas, prédios e departamentos, se descabelando, veias da fronte ululantes, pílulas de nervosismos... Há ruas em que jamais sonharão passar... Talvez nunca ouviram músicas dos The Beatles, nunca pararam numa tarde vazia, no meio de uma praça e escreveram um poema nas beiradas de um jornal de anúncios que estava lendo...

Desde que o mundo é mundo batalhas são travadas, às vezes por tamanhas banalidades que dá até dor no coração, só de pensar... Tanta coisa perdida, tanta coisa jogada ao léu, história forjada em certos pontos para engrandecer quem na verdade não foi o causador daquilo. Muitos heróis foram mortos para que seus feitos fossem concedidos a outros...

Hoje estou bem. Amanhã posso não estar, mas nada apagará o bem que senti e sinto hoje. Um bem-estar eterno dentro de minhas lembranças. Sou feliz e sei disso! Ou melhor, estou feliz... E uma gata mia daquele jeito, em plena luz do dia. Silêncio... Acho que a chutaram ou acertaram-na uma pedrada de estilingue...

O homem nunca precisou muito para desejar tanto... Tantas coisas acumuladas, imprestáveis...

Minha mulher está grávida, deitada no sofá, assistindo programas da tarde... Tudo que ela pede eu faço, desde buscar um copo d’água até sair e viajar 100km para conseguir o que está com vontade. É nosso primeiro e provavelmente único filho, por isso vale a pena todo tipo de esforço de nossa parte, e, já que ela está ali como corpo para tudo, estarei eu do meu lado disposto, pronto para ajudá-la. Pai tem que fazer isso. A mulher faz a parte mais sacrificante, que é doar seu corpo para a gestação. Nada custa ao homem prestar todo tipo de auxílio... Aí ficamos imaginando nomes... Muitos nomes... A história do mundo, muitos nomes por aqui registrados...

Ouço Legião Urbana em meus 35 anos de vida. O quanto já ouvi as músicas dessa banda não está escrito. Ouvi tudo, e muito. Vivi milhares de sentimentos, situações e locais mágicos e outros tristes ao som do grande Renato Russo e seus caras... Algo surreal e único na música nacional... Penso em amigos, festas, amores, locais...

Quero ser um cara calmo, mas não consigo. A calma vem em dias assim, sem sentido, sem planos, prazos, injustiças, golpes e televisores jorrando sangue em minha face... Pessoas falando tantas besteiras que dá vontade de vomitar na rua, na cara de quem azeda o mundo...

Só quero escrever e ficar calado, aqui, em meu canto, ouvindo minhas canções e sonhando com outros dias assim... Fico pensando na Amy Winehause, chocante, que não se contentou apenas com o prazer de um bom porre de cerveja, se afundando na lama da fama e sucumbindo sem conhecer a parte saudável e gostosa da fruta... Comeu bichos e putrefarias, achando o caviar um santo alimento e a pedra algo que se fumava, e que não havia luz além das noites em que vivia...

A pessoa pode até “querer” morrer jovem, mas jamais isso pode acontecer sem que “conheça”... Mas, conhecer o que?

Nada mais triste do que “Whem a men loves a woman”, de Percy Sledge. Remonta-me à depressão americana da década de vinte, o “crack”, quando pais de família até então estruturadas viram suas bases ruírem.

Por incrível que pareça, ainda acredito na humanidade, independentemente de minha persona degradada, corrompida pelas ruelas sujas da vida.

A noite chega. Uma senhora procura seu papagaio que parou de falar... Alguns seres brotam de bueiros inabitáveis e rumam para os bares...

Amanhã é sexta feira e não se tem muito que fazer... As pessoas gostam muito da sexta feira, a não ser quando é a 13, minha preferida, onde se mantém ainda certos tabus, talvez por causa do “Jason”.

Comprei umas cervejas cujo prazo de validade se encerrava hoje. Bebi três e até agora não morri. Minha mulher faz uma macarronada, desejo, enquanto agora passo para Pink Floyd.

Sempre gosto de falar do agosto, pois sinto que é um mês onde Edgar Allan Poe curtiria..., no Brasil...

E foi logo quando pensei o pensado na minha frente. Coisas estranhas caminham sob o sol, já diziam os filósofos.

Não tenho 27 anos, e se tivesse morrido com essa idade, juro que não “saberia”. Aos 35, idade em que me encontro, confesso que se tivesse que ser agora, iria em paz... Porém, Deus sabe bem o que faz...

Dei um pouco, ou quase sempre, a cara a tapa... Fui e sou o que sempre me propus, sem receios, sem meio termo, por vezes até parecendo ridículo, e isso me anima..., ainda...

Savok Onaitsirk, 28.07.11.

Cristiano Covas
Enviado por Cristiano Covas em 28/07/2011
Código do texto: T3125197
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