A Toca

A Toca

São três horas da manhã. A maioria das pessoas dorme. Mas, à frente da Toca, os primeiro fregueses começam a chegar. Xibungo foi o primeiro a escorar-se num canto. Nego D’água, cinco minutos depois. Para a alegria dos dois primeiros, Pé Rachado trouxe três dedos de bombinha* numa garrafa suja. A noite terminava lenta, quente e úmida, ao passo que o coração dos três dava pulos frenéticos. Eles formavam figuras bizarras na escuridão; figuras disformes. Um dia foram homens.

Às quatro horas, Tião Conhaque chegou arrastando sua carcaça. Amaldiçoou os companheiros porque não guardaram nem um pouco do néctar para ele. Agora, teria que esperar minutos infindáveis para acalmar suas entranhas. O corpo suplicante tremia. Ele pegou a garrafa vazia e começou a cheirar. Afastou-se do grupo, embrenhando-se nas sombras. Com sofreguidão segurou a garrafa vazia nas fuças: revirou os olhos tremendo. Por fim, aquietou-se.

O ranger das portas e o tilintar dos utensílios domésticos anunciavam que o despertar estava próximo. Angústia! Pinga Fogo, Chorão, Estrume, Fedorento, Lula, Pulguento e Piolho se juntaram ao grupo sem algazarra. Um a um surgiam com zumbis na noite. Agonizavam como os companheiros. Estavam todos fracos. Precisavam refazer as forças. Enquanto isso, a lua cheia e majestosa deslizava lentamente. Estava incrivelmente bela, mas eles não a percebiam.

Coelho ligara a luz interna da Toca. Expectativa! O cadeado fora aberto. Falta pouco! Formaram fila. Os corpos trêmulos aguardavam diante do balcão. Ânsia! A espera era quase insuportável. Excitação! As portas se abriram. As entranhas foram expostas. A Toca expunha suas preciosidades. Os olhos infantis deleitavam-se. – Quem é o primeiro? – Coelho perguntou. Após o primeiro gole, a escuridão cessou. O líquido translúcido em seus copos fez a dor partir. O brilho no fundo da Toca era intenso, superior a todas as estrelas do céu. Ele guiava os passos desses seres curvos, esquálidos. Bichos! Nem o sol seria capaz de ser mais sublime. De repente: Tião conhaque caiu no chão. Assombro! O corpo ficara imóvel. Um líquido negro começou a escorrer por seus lábios rachados.

– Vamos beber o defunto!

– Saúde!

A. D. M. Leão - 11/02/2011

*bombinha = tipo de cachaça vagabunda

Tonny Lion
Enviado por Tonny Lion em 21/08/2011
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