DORA

Já quase sem vida, deitada na cama do hospital da pequena cidade de José Bonifácio, Dora volta aos treze anos de idade, quando fora deixada naquela cidade. Sem condições de ser criada pelos pais, a deixaram na casa da família Ferchansy. Trabalhou feito escrava durante um ano sem nada receber. Transformava-se em uma mulher muito bonita a cada dia que passava, tinha cabelos longos e escuros, pele morena clara, o corpo formava curvas generosas. Assim começou a chamar a atenção de Dário, dono da casa, que era casado com Leonora, que estava grávida do segundo filho. Muito enciumada, Leonora resolve que não queria mais ficar com Dora e a levou para um bordel que ficava nas proximidades e a deixou.

Deitada na escuridão de um quarto que exalava um perfume que a enjoava, Dora não sabia o que viria no dia seguinte, sentia o quanto chamava a atenção dos homens, embora não conhecesse nada sobre a vida sexual. Durante a semana, fez trabalhos domésticos, e Cleuza Furacão, a dona do bordel, estava poupando a garota dos serviços sexuais, não por bondade, esperava uma oferta generosa pelo corpo virgem de uma garota muita bonita.

Foi numa sexta-feira de muita chuva que Dário Ferchansy, fez uma oferta irrecusável pelo corpo da menina.

À espera no quarto com um vestido vulgar e uma maquiagem extravagante, que a fazia parecer mais velha, Dora se assustou quando viu adentrar seu antigo patrão. Nos quatro anos seguintes ele pagou por Dora com exclusividade, era seu único dono, até que ela engravidou, deixando Cleuza muito irritada. A matrona do bordel exigiu que tirasse o bebê, mas sobre os protestos de Dora, que lhe era muito rentável, cedeu diante da promessa que levariam a criança assim que nascesse.

Dora deu a luz a uma linda menina. A esposa de Dário tinha três meninos e era enlouquecida por uma menina, então Dário a levou e nunca mais voltou ao bordel.

A vida de Dora se tornou ainda mais triste a partir daquele dia, servia a diversos parceiros, e rezava toda noite pela filha, para que tivesse um futuro melhor que o seu. Acompanhou discretamente o crescimento da filha, a via na escola, não existia um dia que não pensasse nela.

Os anos passaram, com a morte de Cleuza, Dora assumiu o bordel. Soube orgulhosa da formatura da filha em medicina, mas não a via, fazia anos, pois estudava na capital. Era imensamente grata a família Ferchansy, pela dedicação e amor a filha postiça.

Bendita foi sua emoção, quando internada naquele hospital, estava com a respiração comprometida pela doença pulmonar obstrutiva, quando adentrou um anjo vestido de branco e se apresentou como doutora Fernanda Ferchansy. Ela olhava com adoração para a filha, que amorosa tocou-lhe a face e secou as lágrimas da mãe. Quando ouviu o agradecimento quase sem voz da mãe, Fernanda lhe disse que era ela quem lhe devia agradecimentos, pela presença constante em oração na sua vida, sempre a sentia como um anjo que a protegia. Só soube de toda história da sua vida pela manhã, quando seu pai perante a situação debilitada de Dora, resolvera lhe contar a verdade.

Quando Fernanda proferiu a frase “sinto muito mãe”, Dora respirou sem mais nenhuma dificuldade, abraçou a filha sentindo a única felicidade da vida e partiu.

Lilia Costa
Enviado por Lilia Costa em 18/09/2011
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