OS HOMENS COR DE ROSA

     Manhã de outubro no sertão. O sol parece lapidado de tão reluzente. Diocleciano caminha por aquelas veredas de caatinga adentro desde a madrugada na esperança de encontrar a sua novilha – a única que era sua naquele rebanho de mais de duzentas rezes que ele cuidava com tanto zelo. Ia pensando justamente nisto: “o patrão tem tantas, some justamente a minha”...
     Já era quase meio dia, o sol inclemente focava do meio do céu e Diocleciano sem ter a mínima noção de onde se encontrava, depois de percorrer léguas dentro daquela propriedade imensa, resolve parar na sombra de uma frondosa aroeira. Nunca estivera por ali antes – achava mesmo era que ninguém antes havia pisado por aquelas bandas de mata virgem. Para terminar de percorrer toda a terra da propiedade só faltava subir aquela imensa serra pedregosa – o que não seria provável de encontrar o seu animal por lá, certamente ele não subiria em local tão íngrime. Resoluto a voltar, aquele homem experiente com a vida na caatinga estranha um pouco a vegetação naquele entorno. Eram ervas e arbustes de que ele não conhecia e escavando um pouco o chão percebeu que este era frio e de textura leve, diferente daquele tórrido pedaço de chão.
     O vaqueiro percebe que tal característica de solo se limitava a uma estreita faixa de terra que dava em direção a um grande lajeiro de pedras que todos chamavam de “Lajeiro do Pai Antão”. Muitas lendas se contavam daquela serra que se formava de imensas pedras empilhadas de forma organizada que parecia ter sido posta uma sobre a outra com as próprias mãos (o que era impossível pela grandeza das pedras).Os mais antigos falavam de que se avistava sobre aquelas pedras um carneiro dourado que reluzia à noite e assustava até os mais intrépidos caçadores. Clarões – segundo os mais velhos – eram avistados saindo daquele amontoado de rochas imensas.  Aquelas histórias que Diocleciano ouvia desde criança, atribuidas a uma ‘assombração’da caatinga, vinham à sua mente e o instigava a explorar aquele aglomerado de pedras gigantes que ele escalou com grandes dificuldades.
     Por entre uma pedra e outra havia sempre a formação de “tufos” de arbsutes o que dificultava o acesso. Nosso explorador se assutou ao perceber que entre eses arbustes, que ele com dificuldade penetrava, havia uma ventilação, de forma que estes eram bem mais frios que o ambiente ao seu redor. A curiosidade cresceu e o nosso aventureiro não lembrava mais de sua novilha, só pensava em decobrir algo sobre aquele misterioso evento.
     Espremendo-se entre aquelas plantas que saia por entre as fendas de pedras Diocleciano chega uma entrada escura – formada pela junção de três enormes rochas, que deixava uma pequena brecha triangular. O acesso só seria possível agachado e o vaqueiro vestido a rigor não se incomodou de penetrar naquele ambiente inóspito e sair quase que rastejando, agora com certo temor – não do sobrenatural, mas de algum animal peçonhento.

     Após percorrer cerca de vinte metros, aquele pequeno túnel formado por pedras justapostas ia se alargando e se tornando mais frio, até surgir um clarão, que deixa Diocleciano sem conseguir enxergar por alguns segundos. A visão vai se adpatando e o que Diocleciano ver deixa-o arrepiado e com o coração acelerado num misto de supresa e espanto. Em um grande salão - uns cinco ou seis metros abaixo de onde ele se encontrava, iluminado por inúmeras frechas de luz solar vindas do teto daquele ambiente, oito homens seminus, estavam sentados em volta de sua novilha - que ele reconheceu pela cabeça intacta e o chocalho bem ao lado – já esquartejada.  Um deles fazia o trabalho de dissecação dos ossos e carnes enquantos os outros assistiam num silêncio que chegava a incomodar.
     Eram todos magros e altos e com a pele albina de um branco incomum, quase rosa. Os cabelos louros eram tão alvos que parecia ser branco e os olhos, que eles aparentavam dificuldades para mantê-los abertos, tinham no entorno da pálpebra um vermelho instenso que parecia minar sangue.
Concluida a limpeza e repartição das carnes, eles pegaram cada qual uma parte da carcaça e em fila indiana adentraram por uma pequena passagem que parecia dar a um lugar abaixo daquele salão.
     Diocleciano volta pela estreita trilha na caatinga, chegando já ao anoitecer em casa. Pensativo, diz à mulher que uma cobra matou a sua única novilha de gado e resolve que manterá em segredo a existência dos Homens Cor de Rosa.
 
Damísio Mangueira
Enviado por Damísio Mangueira em 07/12/2011
Reeditado em 07/12/2011
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