Num show qualquer.

A banda havia começado seu show. A casa era pequena, porém acolhedora. As luzes faziam seu papel, iluminavam tanto os músicos quanto as pessoas, que alegres, felizes e muitas delas, bêbadas, cantavam junto à seus ídolos enquanto pulavam, extasiadas pelo som.

A garrafa de cerveja, ainda gelada, suava em suas mãos. O som de cada dedilhar de uma corda da guitarrada aguçava sua mente. Cada letra proferida, verso formado, dançava à sua frente. Cada gole dado se assemelhava ao maior dos prazeres vivenciados por ele. Com a mão livre, levantava seu apetrecho eletrônico da nova geração e se punha a gravar uma de suas bandas favoritas. Se não a mais, para ele.

A viagem não era momentânea, sentia o pulsar de cada instrumento, sentia cada verso cantado. O sabor da bebida gelada lhe aproximava do seu mundo imaginado na hora.

À sua frente, o mar de pessoas agitava-se em conjunto, para lá e para cá, sua câmera captava todos os momentos. Ouvia cada som. Seria memorável.

Então, ouviu a voz, mesmo baixa, ao pé do ouvido, lhe dizendo que a melhor parte do show seria quando ele se afastasse para ouvir o som da vida.

Não entendeu. Não quis entender.

Continuou a apreciar. Continuou a ouvir. As vespas zumbiam, mas não lhe encobriam. O bater das asas soados nas cordas dos instrumentos começavam a diminuir. Lentamente sentia seu braço adormecer. Se era o efeito da bebida lhe tragando para outra viagem, talvez, não sabia. Saberia futuramente quando se lembrasse ou se fizesse saber.

Os músicos pararam seu show.

Intervalo.

Nova chance.

Dessa vez ouviu, não tão alto, mas em bom som:

- São muito bons, não acha? – As palavras soaram leves e acompanhadas de um doce perfume, típicos de uma garota que se embeleza para a noite e se vê iluminada pelas estrelas.

- Sim, são os melhores. Os acompanho sempre que posso. - A resposta soou simples demais, fraca demais, o efeito já se fazia sobre ele. O aparelho continuava gravando, sem saber.

- Eu também acho, principalmente quando ouço a que acabaram de tocar. Me fazem flutuar. - Não mentia, sentia seu corpo mais leve a cada toque consciente e pensado daquela música.

Não imaginavam. Não sabiam. Não tanto como se fala. A música constrói laços, eterniza atos. Une corações. Como naquela noite. Como naquela música.

A conversa foi curta, mas longa no que possível. Faltava pouco para o intervalo terminar. E a música voltar a ecoar, junto ao coro de muitos fãs inebriados pela canção que ainda os aguardavam.

Descobriram-se parecidos. Ele, músico amador querendo se profissionalizar. Ela, poetiza, artista e culta. Iguais e diferentes em muitos pontos. O perfume dela, subestimava o cheiro da fumaça de um cigarro tragado algumas horas atrás, por ele.

A banda voltou a tocar. A música tomou conta, novamente, do lugar. A escuridão tomou conta. Mãos uniram-se no ar, em uníssono às vozes de todos que acompanhavam a melodia. Bem como as daqueles dois, por um leve momento, se encontraram e ali ficaram. A câmera não parou um instante sequer. O foco não era mais o mesmo, mas o áudio permanecia intacto. Ao pé do ouvido, novamente, o som baixo se fez mais alto.

Ela se despedia. Tinha de ir.

Ele não podia. Era mais que apenas um fã. Era alguém do grupo. Um da banda. Não podia ir.

Ela compreendeu sem entender. Deixou com ele mais do que a lembrança do toque de suas mãos. Deixou mais que os lábios colados em seu ouvido. Como não se esqueceria nunca mais, a partir daquele dia. Oito números que o fariam se lembrar, oito números para sua vida governar ou destinar a um rumo diferente do qual sempre focara.

A composição musical soava frenética, mas aos ouvidos daqueles dois, soava como uma música tema de filme. Estava ali, mas, não atrapalhava a primeira cena.

A câmera continuava a focar os músicos e suas habilidades musicais.

Ela foi embora.

Não muito depois, após o show acabar, e talvez o efeito deixar-se escapar, procurou em sua mente, um pouco misturada devido ao show, único até então, o êxtase do momento e os números que lhe ocorriam. Tentou e conseguiu discar os números que haviam lhe sido passado. O telefone tocou. Ela atendeu. Um Oi aqui e outro acolá, cada um soou, quando ele foi perguntar o nome dela, o apetrecho eletrônico, até então seu instrumento de trabalho e de fã, deixou-o, juntamente com os números e a voz dela. O aperto lhe tomou conta.

No entanto, a partir de então, em, todos os shows passou a freqüentar, para de volta encontrar sua garota mais bonita da cidade.

Tornou-se o fã mais assíduo sem saber, mas sabia, em seu intimo, que era a melhor de todas, por apenas uma razão. Uma única.

Eber Miom
Enviado por Eber Miom em 11/12/2011
Código do texto: T3383933