Invisível

Nasci invisível. Vim junto com meu irmão. Ele saiu primeiro e eu logo depois. Quase não me notaram. Por pouco não continuei na barriga de minha mãe.

Meu irmão logo morreu. Fiquei somente eu. Um estranho bebê que quase não chorava. E que ninguém notava. Várias vezes fiquei com fome, muita fome, antes de minha mãe se lembrar que tinha que me amamentar (não me pergunte como sei disso).

Quando dei meus primeiros passos, ninguém estava observando. Ninguém ligou.

Sabe aquele filme "esqueceram de mim"? Pois é, era normal meus pais saírem e eu ficar sozinho em casa. Às vezes eles se lembravam, quando chegavam, que havia uma outra pessoa naquela casa.

Certa vez aconteceu de uma vizinha me ver sozinho em casa. Tinha cinco anos. Quando minha mãe chegou ela foi tomar satisfações. Que era um absurdo que uma criança pequena ficasse sozinha o dia todo. Minha mãe olhou para mim, olhou para ela e bateu a porta na cara dela.

Quando entrei na escola a situação ficou pior. A professora só falava meu nome na hora da chamada. Rapidamente desisti de levantar a mão para responder alguma pergunta. Ela nunca percebia.

Na hora do recreio eu ficava sozinho. Só interagia se eu me dirigisse à algum colega. Nunca vinham até mim.

Cresci assim. Sem ser visto. Atravessar a rua era um perigo. Aprendi a esperar alguém para atravessar junto. Se estivese sozinho tinha esperar passar os carros.

A muito custo consegui um trabalho. De almoxarife. Ficava no galpão da empresa, cadastrando e controlando os materiais. Por diversas vezes fiquei trancado e passei a noite lá, pois se eu esquecesse a hora e deixasse para sair depois, as portas já seriam trancadas.

Fiz faculdade. Trabalho em grupo? Com certeza. Esperava meus colegas se dividirem, escolhia um grupo e me apresentava. Fazia minha parte. Mas tinha que ficar atento. Às vezes esqueciam de colocar meu nome. E aí eu tinha que apresentar um trabalho substituto, pois os professores não acreditavam que eu fazia parte daquele grupo.

Certa vez fiz um teste. Entrei no vestiário das meninas, depois da aula de educação física. Não precisava ficar escondido. Bastava ficar em um canto que não atrapalhasse a passagem. Belas visões.

Mas ser invisível tem suas vantagens. Nunca fui assaltado. Nunca fui chamado para ser jurado. Nunca fui multado.

Mas que é chato ser invisível, isso é...

DIMAS ROCHA
Enviado por DIMAS ROCHA em 14/12/2011
Código do texto: T3388733
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