O pirata

Estamos falando de meados do século XVII, quando as navegações transatlânticas eram intensas, trazendo ouro das colônias européias na América do Sul e levando armas, vinhos e outros suprimentos para as colônias.

Tão intenso tráfego de preciosidades, a muito já fomentava a pirataria naquele período...

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No Magdalena, caravela da coroa espanhola trabalhava, um jovem marinheiro chamado José Gonzáles, exímio içador de velas, ábil dançarino e ainda melhor conquistador.

Tinha cinco filhos, um par de gêmeos em Barcelona, uma linda mourazinha em Madri, um que se quer conhecia no México e uma terceira filha que lhe causou especiais incômodos com uma escrava brasileira chamada Zilda.

Esta devassidão, que podem julgar característica de José na verdade era compreensível frente a realidade que viviam os marinheiros daquela época.

Vagando pelos portos da costa européia provavelmente descarregavam sua carga de libido acumulada durante a viagem em tabernas, nas quais eram oferecidos um bom vinho e alguns serviços adicionais.

Devido à carência de látex naquele período, suponho que até então os métodos contraceptivos de baixo custo não eram muito comuns.

Assim famílias eram fecundadas, ou deixadas para traz nas muitas das vezes em que levantavam âncora.

Mas a filha de Zilda era especial, não a filha em si, mas a própria Zilda baiana vendedora de acarajé na baixada fluminense.

Ela havia movido um processo civil contra José junto a delegacia da mulher que teve como veredicto da juíza: “O senhor José Gonzáles, réu dessa corte cumprirá a seguinte pena. Estará obrigado a manter financeiramente a jovem Cacilda Gonzáles da Silva, filha de Zilda da Silva com uma pensão mensal de dois dobrões ou equivalente em moeda corrente. Até que a jovem complete dezoito anos de vida, ou vinte e um em casa de ingresso comprovado no ensino superior. O não comprimento dessa determinação acarretará em enquadramento do réu pelo artigo doze de mil seiscentos e trinta do novo código penal da coroa portuguesa”.

Infelizmente, a sorte não andava de boas com José no ano de mil seiscentos e setenta e dois um decreto da coroa espanhola determinava que todas as embarcações daquele reino deveriam implantar um novo sistema de controle de instrumentação.

Era o NAVIGATOR 6.0, um complexo sistema de polias e engrenagens que adaptado as embarcações reduzia a necessidade de tripulantes pela metade. Patente registrada em uma das colônias inglesas.

Assim se seguiu um período de crise, os indicadores econômicos ao fim daquele ano indicavam um milagroso aumento de quarenta e oito por cento no PIB (48,37% para ser mais preciso), em total controvérsia com o aumento de exatos trinta por cento no desemprego.

Naquele período de recessão um grupo de marinheiros se agrupou, formando um movimento sindicalista liderados por um tal “Capitão Barba Grossa” um velho marinheiro, famoso pelo ataque que sofrera de um tubarão em uma viagem as Bermudas, que o deixou mutilado de um dos dedos.

José ao procurar o sindicato a fim de conseguir apoio na luta por seus direitos trabalhistas acabou por descobrir que a taxa anual de filiação era de vinte quatro dobrões exatamente o valor anual que deveria mandar a Zilda no Brasil para manter-se longe do xadrez.

Afundado em um mar de duplicatas, sem crédito na praça já que seu CPF estava bloqueado, com menos de dois quilos de feijão e cinco garrafas de rum na dispensa, viu-se obrigado a adotar como única saída o mundo da criminalidade.

José tornou-se pirata. Dez anos depois em um motim a bordo da caravela viúva negra, matou seu antigo capitão e se autoproclamou capitão J.G., o terror do atlântico sul.

Nada mais coerente do que se tornar pirata, já que navegar era seu único ofício, e os únicos na época que recebiam sem trabalhar eram os políticos e seus respectivos secretários, cargos para os quais apesar de não exigirem experiência previa, exigiam graduação acadêmica.

É interessante como na maioria das vezes somos levados a marginalizar figuras como José, apoiando-nos apenas em evidências obvias como suas atitudes ilícitas.

E nos esquecemos que personagens como J.G. só existiram graças ao sistema vigente, cada vez mais tecnológico desvalorizando a mão de obra não especializada. E graças a acumulação de bens por parte na nobreza que só intensificava a má distribuição de renda e diminuía a qualidade de vida dos menos favorecidos.

É claro que passa longe de mim, a intenção de inocentar uma figura como J.G.; tenho sim a intenção de mostrar o outro ladro do dobrão. Mostrar o José vítima do sistema monárquico antidemocrata e desprovido de políticas sociais adequadas.

José, ou melhor, o capitão J.G. se tornou o pirata mais temido daquela década, realizando desde pequenas pilhagens a navios alimentícios até grandes saques em navios de ouro e armas.

No início do século XVIII, capitão J.G. comandava todo o mercado negro de armas, fornecendo para famosos piratas da época como Capitão Blah e Capitão Gancho.

Até o trafico de mercadorias sem nota fiscal como tabaco, rum, vinhos e eletroeletrônicos era comandado por ele.

Nos finais de semana como atividade extralaboro, o que hoje preferimos chamar de bicos procurava tesouros perdidos em ilhas desertas do caribe. Estas expedições eram especialmente árduas, já que além do protetor solar, elas eram sempre regadas por muita água de coco e moqueca de peroá.

Por: Reginaldo Junior 15/01/07