Caros visitantes: realmente este conto exige atenção e "entrar no clima" para entender e comentar. Mas, paciente e educadamente,repito a solicitação anterior: não entrem só por entrar, não é de bom tom. Estou até pensando em exclui-lo, uma vez que  quantidade para mim e acredito que também para o autor do poema, não  quer dizer absolutamente nada. Quem escreve quer saber o que pensam os "críticos". É isto que nos impulsiona a ser melhor a cada dia. Obrigada.

***

Uma estória sobre um poema que desencadeou um conto

o Poema:


Menina, menina, para onde vais?

Logo antes da Avé Maria tu sais
para teus maus costumes rituais
com prazeres tardios ou matinais
em lugares obscuros, por ramais,
nas tuas pândegas e teus arraiais.
 
Cedo assinalaste os maus sinais
saltando daqui dali como pardais
vivendo em perfeitos vendavais
desferindo a todos golpes fatais.
Não quiseste bênçãos celestiais
e quanto a boas palavras jamais.
 
Tuas fases da vida são espirais
tão satânicos, imundos caudais
sempre com os gestos habituais.
Menina, menina, porquê o cais?
Não ouviste conselhos dos pais
e já ninguém pode com teus ais.


(Menina, menina, para onde vais?  por Valdemar Pereira)

o conto:

 

Um dia, um belo rapaz conheceu uma menina que vivia a sua vida como “mulher da vida”. Coitada, ainda era uma menina, mas nenhuma pessoa sabia de fato e de direito, a razão e o porquê de assim aquela menina viver e, talvez, nunca procurasse saber, pois ela existia, também, para o seu prazer. Mas, para ela, ou melhor, a seu respeito, o rapaz escreveu uma poesia de alento e conforto, talvez de conselhos e críticas. Ninguém sabe se ela a leu ou se era alfabetizada, ou se teve notícia que sua vida foi inspiração para alguém compor um poema.


O sol nasceu e se escondeu em incontáveis tardes: a lua com suas quatro personalidades, teve vários admiradores para a aplaudirem no palco cósmico, em incontáveis noites. Guerras aconteceram, pazes se fizeram, soldados foram privados de um braço, uma perna, outros enlouqueceram. Enfim, décadas passearam e passaram na vida de todos.

 

Muito mais de meio século se passou para o rapaz e para a Menina do Cais. Imaginava-se que talvez ninguém soubesse por onde estavam os dois. Ou talvez eles soubessem, onde cada um estivera, passara ou vivesse. O conto não conta.

 

E, depois desses muitos e muitos anos, uma mulher que nem tinha conhecido o poema, acordou um grande amigo seu na madrugada e pediu sua ajuda: precisava conversar com ele, logo que o dia raiasse, pois estava com uma dúvida que certamente, não a deixaria dormir. E, assim que o sol raiou, ele foi à casa dela, que o confidenciou: estava preocupada com algo que ele falara há semanas atrás e queria entender; talvez ele precisasse de algo, disse a amiga, ou talvez ela o tivesse magoado; ou quem sabe? ele quisesse magoá-la indiretamente; porém, não obteve nenhuma resposta convincente, pelo contrário, o amigo “saiu pela tangente”; provavelmente ele não confiasse tanto nela como pensava e ela não deveria confiar tanto nele como sempre fazia...

 

No final da tarde, recebeu um envelope a ela endereçado. E o que havia dentro dele? A poesia que o rapaz fez para as Meninas do Cais**.  Ela não entendeu nada e entristeceu-se tanto, que talvez jamais volte a sorrir, porque era totalmente desproposital receber aquela poesia.  Esta mulher, que nunca tinha visto um cais até ficar mulher, perguntou quando adolescente aos pais, o que era “mulher da vida” e continuou sem entender. Foi saber pelas amigas, tempo depois; esta mulher era proibida de passar pelo beco “delas” quando menina e não sabia a razão. E, depois de tantos anos, quando as “mulheres da vida” estão nos blocos nos Carnavais, nos ginásios e quadras de esporte, nas festas de gente da “elite”, nas revistas de “nus artísticos”, ou nas “redes sociais”,  ela já viveu quase setenta anos e recebe a poesia que nada tinha a dizer sobre a causa que a levou a pedir ajuda.
A mulher que recebeu do amigo a poesia feita para a Menina do Cais percebeu então que o imprudente “amigo” não a conhecia nem um pouquinho. 
Ela até podia ter sido uma mulher da vida, mas não foi. Ela chegava quase com o sol raiando em casa na terça-feira de Carnaval , quando ia com a tia, ou a avó. E mesmo depois, com amigos ou namorado ela não precisou ser e não tinha razão para tal. Graças a Deus e à educação rigorosa mas amável que recebeu.

 

Infeliz da Menina do Cais e das Meninas das Ruas e Estradas que encontram homens vadios e ocos de sensibilidade, que nem lembram que ainda existem filhas bem criadas, como foi a sua amiga.
Lamenta a “amiga” que foi surpreendida, mas jamais diminuída, porque nunca discriminou, julgou ou preconceituou as Meninas do Cais.


 


 

Conto por: Yara lima Oliveira

**

A personagem fictícia do conto (o rapaz) não tem nenhuma ligação com o autor do poema que inspirou o conto
(ass.: a autora do conto)

 

 

Yara (Cilyn) Lima Oliveira e Valdemar Pereira
Enviado por Yara (Cilyn) Lima Oliveira em 20/02/2012
Reeditado em 25/10/2012
Código do texto: T3509625
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2012. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.