Questão Ambiental.

Chegou um tempo em que a crise ambiental, o derretimento das geleiras, o furo na camada de ozônio, o aquecimento global, as enchentes, tudo, tudo isso era fruto das sacolinhas plásticas dos supermercados.

Além disso, a gana consumista do cidadão capitalista vinha corroendo os antigos conceitos da Natureza selvagem. As pessoas não queriam mais andar a pé, subir escadas, manufaturar alimentos e artigos artesanais, caçar o imprescindível para a subsistência, se exercitar e refletir sobre o Todo, o ar, a terra, o fogo e a água.

Diante isso, naquele tempo tenebroso, o governo da Sapolândia, antecipando tendência mundial à preservação do meio ambiente, baixara decreto proibindo todo tipo de embalagem plástica, independentemente do produto ou fornecedor. A pena era de banimento cruel e trabalhos forçados em redes de esgotos.

As pessoas passaram a ir ao mercado com suas bolsas sintéticas – não se usava mais plástico nem couro – ou mesmo portando caixas de papelão ou baldes; assim iam jogando dentro o que precisavam, pagavam e iam embora. Os alimentos nos mercados ficavam acondicionados em repartimentos divididos por número, gênero e grau, secos e molhados, úmidos e mofados, Tom Jobim e Eduardo Dusek. O risco maior inicialmente travado fora com os ratos dos porões de acondicionamento. Caso houvesse precariedade, a pestilência seria fatal. E muitos garotos curiosos perderam a vida experimentando alimentos podres.

E os ambientalistas, juntamente com o governo daquele país, concluíram que, se não tudo, ao menos grande parte da calamidade climática planetária era advinda das malditas sacolinhas plásticas.

Os cristãos afirmaram que as sacolinhas eram fruto do fruto proibido, da tentação do cão, que queria impelir o homem ao comodismo marasmático e doentio, deixando-o por fim feito ameba pálida e gelatinosa lançado num sofá macio num fresco fim de noite primaveril, sem ter que ao menos se esforçar para pensar.

As pessoas não queriam pensar, afirmavam os filósofos locais, já que o maquinismo da modernidade, aliado à tecnologia mirabolante, faria tudo que precisavam, desde preparar a torrada, até raciocinar a respeito do que comer no café da manhã do dia seguinte. A cidade grande tornara o homem um ser artificial, vil e vulgar, condicionado e dependente de tudo. Os calos e a transpiração desapareceram do corpo humano. O raciocínio imediato, o improviso, a imaginação e a pulsação por um amor perdido viraram tema de documentários e novelas baratas. As sacolinhas de plástico dos supermercados haviam desconfigurado a própria natureza humana.

A crise inicial fora tão calamitosa que, atendendo ao clamor público, derrubou até o antigo primeiro ministro do país, por suposta participação no escândalo das sacolinhas, quando o mesmo, angariando propina do sindicato das empregadas domésticas locais, fora flagrado por uma câmera escondida guardando sacolinhas na cueca e nas meias, sendo em seguida banido e condenado a vinte e sete anos de trabalhos na central de tratamento de esgotos da capital Sapoboi. Disseram que os radicais andaram asfixiando dissidentes com sacolinhas, mas quanto a isso restam apenas boatos. O que se tem de conclusivo é que a questão das sacolinhas se tornara na época prioridade do governo daquele país, bombardeado por militantes ambientalistas, que, com o passar do tempo, foram ficando cada vez mais radicais e perigosos. Chegaram inclusive a propor que arrancassem o asfalto das grandes cidades para o fim de haver melhor escoamento da água das chuvas, bem como para manter o contato humano com o solo, a pele com a terra, a energia vital.

Com o passar dos anos a conscientização de mudança tomou conta do ideário popular, da educação e folclore locais, levando grande parte da população a migrarem para as florestas. Muitos foram morar sobre as árvores, em choupanas de pau e palha; outros, ainda, os mais idealistas, voltaram a andar sobre quatro patas, bebendo água dos rios e se alimentado das folhas e relvas de Walt Whitman.

SAvok OnAitsirk, 05.04.12.

Cristiano Covas
Enviado por Cristiano Covas em 05/04/2012
Reeditado em 05/04/2012
Código do texto: T3595508
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