Provas de Fogo.

Vamos, é preciso pressa!

A audiência começa em oito minutos. Provavelmente os caras já devem estar todos lá. O senhor Oficial acabando de apregoar... Vamos correr...

E correndo eles foram, tirando fina dos outros carros, feito dois fugitivos da polícia ou da tempestade. Um sujeito de bicicleta deu repentina meia-volta e quase causou um acidente grave.

Devem estar nos esperando, o Juiz nervoso e sobrecarregado, o promotor louco e armado, e escrivã sábia e sem sutiã, o escrevente sem dente e com cara de doente, o réu mais perdido do que um cão de roça jogado no lago dos aflitos. Dona Terezinha deve estar coçando a peruca, pensando no maldito advogado que contratou para seu filho safado, advogado que não chega, mais do que atrasado. Que caralho!

Em situações assim o semáforo é inimigo de morte, os passantes são tidos como retardados retardatários divagantes, e nada é mais como antes. Luz verde, acelera e o carro emperra, engazopa, como diz aquele mecânico da Lapa. Tira o pé do acelerador, espera mastigando os nervos, e de novo acelera. Desta vez foi, mesmo tossindo, o velho Voyage ultrapassando paragens.

Zeca, a testemunha, que no banco do passageiro pensava apenas na cadeia, já que teria que mentir, fumava um cigarro atrás do outro; minister sem filtro. E o peito palpitava...

O trânsito fumegava e o asfalto construído em período negro de político corrupto, obra superfaturada, derretia pelas beiradas.

Dr. Pedro, trinta e dois anos de lida, era fera nisso, mas agora parecia que realmente iria se dar mal. Justamente no dia da Audiência daquele cliente que lhe possibilitou, sozinho, meses de salário. Certamente seria escalpado por dona Terezinha ou mesmo encaixado no meio de um pneu em chamas e lançado morro abaixo. Nem queria pensar nisso, tinha que de algum jeito chegar àquele fórum de tantas e tantas glórias e desforras. Na frente do Juiz todo marmanjo barbado se depila!

A cinco quadras, no entanto, quando viu que o trânsito não mais andaria, pelo menos nos próximos quarenta minutos, Dr. Pedro enlouqueceu. Pegou pasta, disse pra Zeca tomar o volante, e saltou do Voyage, como que ser delirante, correndo sob o sol escaldante, casaco ao vento, pasta esbarrando nos retrovisores dos carros congestionados, transpiração lançada em para brisas, gravata frouxa, verde, nas costas, testa franzida, dentes rangentes, desespero latente, o medo da morte e um arrependimento de ser gente...

Chegou! Ufa! Caralho! Dez minutos de atraso! Ainda dá tempo...

Correu e não viu carro, não viu gente, não viu nada além do fórum fechado! Era feriado!

Obs.: Zeca, a testemunha, não chegou! Sofreu um infarto fulminante no trânsito. Fumava, o cigarro caiu e incendiou tudo!

SAvok OnAitsirk, 11.04.12.

Cristiano Covas
Enviado por Cristiano Covas em 12/04/2012
Código do texto: T3608779
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