A formiga e o homem

Estava lutando para alcançar uma muleta, enquanto mirava o horizonte, sob o sol de Agosto. Buscava respostas. Sentia-se uma faca cega. Achava que o mar, o calor dourado do sol e umas cervejas agissem como morfina para suas angústias ou espantassem, mesmo que temporariamente, a tristeza que tomara conta dele. Durante muito tempo observou o horizonte, tentando esquecer o passado, não pensar no futuro e entregar o presente.

De repente, quando seus olhos já cansados de lutar contra a melancolia, avistou uma formiguinha. Suas antenas buscavam assim como suas entranhas. Hora para um lado hora para o outro. Pediu mais uma cerveja. Voltou a buscar o vazio no horizonte. Alguns minutos depois, baixou os olhos e lá estava ela.

Diferente dele, a formiguinha nunca parava para pensar na vida ou nos sentimentos. Talvez para sorte dela nem saiba o que isto significa. Suas antenas buscavam alimento, não respostas vagas para males imensuráveis como o gigante à sua frente. Suas anteninhas não tardaram a encontrar algo: um gigantesco monte branco. Circundou objeto desejado inúmeras vezes até que tentou levantá-lo. Uma formiga consegue carregar 10 a 50 vezes o seu peso e ainda tem capacidade de andar com essa carga. Muito diferente do ser humano que muitas vezes não consegue nem mesmo arrastar sua própria carcaça.

Ela logo tombou. Nervosa, ia de um lado pro outro em completo frenesi. Não seria admissível perder esta montanha preciosa. Correu em busca de ajuda. Um corredor de formigas subia e descia na junção entre o piso do bar e um pequeno muro de pedras. Nas pequenas reentrâncias as formiguinhas entravam. Contatou suas iguais. Nada. Um grupo trazendo um pedaço de alface quase a atropelou. Seguiu o grupo. Na boca da toca, um turbilhão de formigar cada qual com seu quinhão não prestava atenção.

Resignada, retornou ao local onde se encontrava seu monte branco e tentou erguê-lo mais uma vez. Após três tentativas, conseguiu erguê-lo. Novamente tombou para a esquerda; contudo, dessa vez, equilibrar o peso e estabilizou. Lentamente seguiu rumo à toca. Lá certamente as companheiras ajudariam. Aos olhos humanos era menos de um metro que a separava de felicidade, porém, para a formiguinha era uma jornada longa.

Outra vez tombou. O homem sorriu. Viu seu ser refletido no gesta da formiguinha. Ele não era o único ser quer havia tombado inúmeras vezes em sua jornada. Seus planos nunca deram certo; seus amores despedaçados; sua vida...

Levantou o dedo e pediu a sexta cerveja ao garçom. Ao olhar mais uma vez para baixo, aterrorizou-se. Viu a formiga a um dedo de distância de seu destino. Suas colegas logo perceberam e partiram em seu auxilio. O homem estremeceu. Não seria possível que uma miserável formiga sem inteligência fosse capaz de carregar um fardo muitas vezes maior que seu peso e ainda por cima encontrar ajuda, enquanto ele, um ser racional, era assolado por uma tempestade de frustrações, ao mesmo passo que colecionava decepções. Isto não era justo. Levantou-se, esmagou as formigas, retornou a seu lugar e voltou a olhar o horizonte.

Antonio Deodato M. Leão 15/05/2012

Tonny Lion
Enviado por Tonny Lion em 20/05/2012
Reeditado em 24/05/2012
Código do texto: T3678479
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