Acontecimento

"Em tudo dai graças", pensava ela enquanto estendia a roupa no varal. Com mais uma hora terminaria o serviço de casa. Chegariam as crianças da escola, o marido depois. Tudo seguia sua ordem. Como sempre.

Depois da última peça estendida, o pregador ainda nas mãos, sentiu um friúme e um estranhamento por dentro. O céu estava azul e o sol, quente e intenso. Seus olhos piscaram, seus lábios entreabiram-se num espasmo. E ela sorveu uma lufada de vento com sofreguidão.

Deixou-se estar assim por um tempo. Um instante que durou pouco mais que um piscar. Mas que foi intenso. Recolheu tudo, virou-se para entrar em casa. Há muito o que viver ainda.

Um copo de água fresca, aliviou a garganta. De pé na janela, viu que tudo estava igual. Esboçou um sorriso. Acendeu o fogo... que fazer para o almoço? Isso era tudo o que a perturbava naquele instante. Mais nada. Nem ninguém.

O portão bate. As crianças entram falantes. O marido beija sua testa. Ela se sente feliz. Que fazer de uma mulher feliz que se sente feliz? Jogou os pensamentos numa bacia com água. Era tempo de saladas e sucos. Amém.