Chade – Khalil – Eu sou combatente na fileira da frente



É naquela vastidão elevada entre imensos cordões de montanhas, transformadas em áreas desérticas por toda a região norte do Chade nas fronteiras com a Líbia. Partindo-se na direcional do centro do país, surge na prontidão geográfica uma mega área de savanas que se aprofundam até o magistral Lago Chade. É nesta colossal que advém às múltiplas misturas étnicas e culturais concentradas nos beirais daquela extensão de água. Desde os primórdios do século XIX, o território do Chade foi dividido em vários sulfanatos africanos aos determinados objetivos ingleses e franceses na expansão do colonialismo, marca registrada naqueles lençóis humanos. Na baliza dos acontecimentos, as guerras, invasões, explorações, dominações, doenças, assassinatos, perseguições, rebeliões, são um dos constantes atos na existência cotidiana de um povo pobre que se renovam dentro do país africano sem contar com as esperanças dos grandes organismos estatais.

E neste contraste, não se arrima as distâncias dos países vizinhos que comungam na provocação constante do caos com as invasões e preparações de atos de confrontos armados, resultando numa carnificina sem fim. Contudo, apesar de que na capital a segurança é mais apropriada, e os rebeldes chadianos se alojam no Sudão, Líbia e Nigéria para atacar a zona norte e leste do país.

Embora não possuir qualquer segurança e estabilidade marcada em sua constituição, a cultura no meio das guerras e conflitos bélicos não conservou o memorial do passado e suas manifestações culturais, sobressaindo apenas os artesanatos locais, mesmo se localizando a capital N`djamena no sul do Lago Chade, a guerra civil demarcou por longos anos os mais destroçados rumos de uma nação. Sobressaindo entre o medo e a coragem muitos monumentos e lugares para visitação como o Museu Nacional, Praça da Libertação, Palácio do Povo, Centro Cultural Francês, Hipódromo e o Mercado de Artesanato. Nas ruas e avenidas da capital é bastante ativa e barulhenta, vendo as chadianas passarem com seus traços coloridos e algumas tatuagens remarcam os traços. Sem realçar a categórica cidade Sarh que por diversas vezes foi invadida pelos árabes na perseguição e capturas de escravos, ali, é a capital da região das plantações de algodão, onde se desenvolve no ritmo ainda arcaico.

É nesse país devastado pela fome, seca e guerra onde podemos encontrar na cozinha chadiana a gastronomia em seus mais diversos sabores na zona do Grande Mercado com peixe da água doce, brochetas de carne de vitela acompanhado com arroz e outras delícias, o que chama o sabor na cozinha. Obviamente, nas compras, são destaques primordiais os belos tapetes de lã, tecidos coloridos, sem se falar dos artesanatos de metais preciosos, couro e cerâmica, além das fantasiosas lojas da mais conhecida Avenida Charles de Gaulle na imensa capital chadiana, repousando naquela miscigenação o duto das marteladas do poder e corrupção.

A população é constituída de pretos sudaneses e semitas e uma minoria europeia que vem decaindo, assim como a zona norte é ocupada pelos árabes com descendência nômade por todo aquele território. Pousando no povo sulista o entretenimento e suas festividades islâmicas com variações no calendário lunar no vestuário maciço da cultura. E não muito longe do centro da cidade, vê-se o Aeroporto Internacional com a aterrissagem dos aviões Air France, Cameroum e Air Afrique, arrancando no ar paupérrimo a massa de ar ao caminho da navegação aérea. Quanto à tipificação do transporte público através de ônibus é precário por todo o país, assim como o automóvel particular que não oferece qualquer segurança ao visitante. Tomando um destino desconhecido as estruturas do desenvolvimento que se enfia na desordem com centenas de ônibus velhos circulando pelas ruas poeirentas, aliando-se as moscas que sobrevoam toda a área geográfica.

É no território da República do Chade onde convivem milhares e milhares de famílias e órfãos que evadiram do gigantesco massacre em Darfur, no Sudão e que se alojam nos campos de refugiados na dura divisão do provimento da boca carregando dezenas de doenças. Gira neste tabuleiro esquisito e infernal os grupos armados e subdivido nos campos de refugiados como forma de pressionar aquelas almas que não encontram outra saída. Num portal onde a morte é de graça aos espelhos da miséria aberta aos céus na movimentação do braço mais forte por um saco de trigo lançado dos pequenos aviões aos cães humanos e famintos.

Vê-se que a mortalidade infantil e maternal é assombrosa nos dados, assim como a educação mistura-se na densidade de um deserto de analfabetismo e prostituição por um prato de comida. Crer-se que a ética e os elementos da personalidade não fluem nos indivíduos amordaçados pela visão silenciosa das dores e o atraso de um futuro onde a lua não prateia as areias alvas do sentimento humano. O comércio de crianças é o retrato mais comum entre os pedaços de almas que veiculam naquele verdadeiro inferno onde a ONU semeia a discórdia por um minguado de comida e água que não vem do céu.

A violência das armas, os senhores da guerra, a seca, a fome e o desabamento do preço do algodão transformou o Chade num inferno sem procedências, onde a expectativa de vida não passa de quarenta anos.

Foi naquela manhã de sol de 2005, ardente no pequeno vilarejo nas proximidades de um campo de refugiados, em que o menino Khalil e Jim, brincavam ao lado do pequeno casebre quando repentinamente, duas Toyotas de cor brancas, atravessaram a pequena estrada poeirenta do povoado, cobrindo aquele espaço por uma densa poeira que nem o vento se eleva. Rajadas precisas das metralhadoras atingiam as mulheres e velhos que corriam para todos os lados. Cansados, recebiam a misericórdia dos únicos tiros na cabeça com os corpos sem vida caiam na desgraça de um pequeno poderio de valas improvisadas e sujas em que desce os dejetos. Os dois meninos correram e adentraram em suas casas, porém, os insólitos homens não pouparam esforços na perseguição dos menores.

Khalil, um garoto de nove anos de idade, ajudava os pais na plantação de algodão e Jim, o amigo vizinho de apenas seis anos, trabalhava também com os pais na fabricação de artesanatos. Ao perceberem a barulhenta velocidade dos carros nas areias, Khalil afirma ao amigo:

-Vamos se esconder Jim. Venha! São os rebeldes, eu não quero ir com eles. Ajude-me, por favor.

-Sim, são eles.

-Vamos! Segure na minha mão.

Jim, com olhar em profundo desespero, afirma:

-Khalil! Eu não vou conseguir. Eu não posso correr.

As lágrimas escorriam da face do meigo menino, e com tristeza, dizia:

-Não chore! Nada vai acontecer. Vai! Suba nas minhas costas.

Com uma deficiência na perna direita sucedida por explosão de uma mina, Jim é levado pelo amigo.

Ali próximo, na pequena sala do compartimento, estavam orando Marjoran e sua esposa Dinil, adeptos do cristianismo. Com a chegada da abertura religiosa motivados pelas grandes ações criminosas contra os cristãos, a capela não resistira ao fogo ateado pelos muçulmanos e dessa forma, fizeram um miúdo oratório no lar. Naquele momento, surpresos com os gritos dos meninos ouviu a voz do filho Khalil.

-Mãe! Os rebeldes estão chegando. Mãe! Pai! Os rebeldes estão aí!

Abraçando os meninos, e as lágrimas que desciam dos olhos, o garoto indagava:

-Mãe! Será que eles vão nos matar? Estão atirando para todos os lados.

-Escondem-se detrás da casa, logo.

O pai aflito, dizia:

-Com fé em Deus e no sangue do misericordioso não haverá sangue. Rápido! Fujam crianças.

A esposa agonizava-se e chorava com a porta fechada, apenas observando o crucifixo de Jesus na parede. Instantes em que a porta do casebre é aberta com violência com tiros e pontapés. E um dos algozes indagava:

-O que faz essa imagem em tua casa?. Não vês que Maomé não permite?

A mulher e seu esposo se ajoelham perante os algozes de armas em punho, momento, ela suplicou:

-Por favor! Não nos mate pelo amor de Deus e nosso Senhor Jesus Cristo.

-Como disse? Não estou entendendo. Digam-nos e reafirmem o nosso lema? “Eu não confio nesse Deus sem nome, eu renego a esse tal Cristo e dou a minha vida a Maomé”. Se repetires por três vezes, nada faremos.

Vertendo lágrimas, a mulher disse:

-Sim, eu não confio nesse Deus e renego a Jesus Cristo e dou a minha vida a Maomé.

Logo adiante, um outro rebelde, chuta o rosto de Marjoran e inquire:

-Então, não vais fazer como a tua mulher que renegou o tal Cristo?

-Sim, meu senhor. Eu também renego a Jesus Cristo e Maomé é o meu único senhor e Deus.

-Cadê os teus filhos?

A mulher pranteando, pediu:

-Não mate o meu único filho, é a nossa única alegria.

E diante daquela mistura étnica entre os povos redesenhando novas culturas com a implantação à força a religião muçulmana. Um dos rebeldes surgiu com o garoto seguro nos braços. E disse a um dos rebeldes com arma em punho:

-Levamos esse que tem saúde, o outro é aleijado para nada serve.

Marjoran, observando as lágrimas do pequeno nas mãos dos rebeldes, suplica:

-Pelo amor do profeta Maomé, não mate o meu filho é única esperança de minha vida. Levam-me! Eu posso lutar e ser devotado nas fileiras da guerra. Essa criança não tem força para segurar uma metralhadora. Não sabe o que é um combate em guerra. Por favor! Deixem esse menino com sua mãe.

-Não desejamos velhos em nossas fileiras.

Empurrando o menor que vestia uma túnica azul, lançou na carroceria da Toyota. Sem dizer uma palavra, os olhos do menino desfilava na tristeza da existência a dor da separação no cruzamento de sangue e aflição que caminhava à sua frente. Ardia o tempo poeirento da desventura e o veículo saía do local em disparada.

Na densa poeira que cobria o pobre vilarejo, podia se ver outro menino correndo numa velocidade de um pássaro atrás da Toyota. Com passos agigantados, segurava um bastão feito de um pedaço de árvore seco. Numa única perna, ele voava ao destino do amigo para resgatar pela última vez as marcas deixadas pelo veículo num espaço de poeira na dança que envolvia a tristeza.

Seus pingos incolores derramados na terra transformavam-se em asas voadoras, e a voz gritante apenas dizia:

-Khalil! Khalil! Eu vou lhe salvar, amigo! Eu posso!

Articulando com os braços na carroceria ao lado dos rebeldes, Khalil grita desesperadamente:

-Não Jim! Não venha! Fique aí mesmo!

O garoto numa distância de cem metros, ainda soluçava o nome do seu amigo em voz alta:

-Khalil! Não se esqueça de mim!

O miúdo chadiano ainda gritou em árabe passando as mãos amarradas nos olhos e disse:


لا، لا يأتي! يبقى هناك حق، من فضلك! لا تفعل ذلك. الانتظار بالنسبة لي سأعود اللعب بالنسبة لنا.

-Não Jim. Não venha! Fique aí mesmo, por favor! Não faça isso. Aguarde-me que eu volto pra gente brincar.

Um tiro certeiro na cabeça do anjo com a Toyota em movimento calou os sonhos de Khalil que tentou se jogar da carroceria aos gritos com os pulsos amarrados. Entrelaçado com gemidos recebeu uma coronhada na cabeça, adormecendo numa pequena lagoa de sangue em sua volta. E mais tarde, na frente da batalha com um fuzil kalashnikov quase do seu tamanho, a agonia acompanhava os seus passos em cada amanhecer.


E assim, continua a perseguição religiosa nos conflitos internos entre cristãos e mulçumanos do norte, no desentranho do princípio de todas as guerras aos direitos da liberdade religiosa. Permanecendo o sul do Chade com o norte as desavenças na eclosão sem limites do ódio.

FIM


ERASMO SHALLKYTTON
Enviado por ERASMO SHALLKYTTON em 12/08/2012
Reeditado em 12/08/2012
Código do texto: T3826947
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2012. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.