Sophia: parte III - Desencontro

Foi muito rápido. Mal dei-me conta estávamos um nos braços do outro. A primeira vez que acordei ao seu lado, procurei os detalhes da noite anterior na memória, para certificar-me que não havia sonhado. Lembrei de dois corações batendo frenéticamente, seguindo o ritmo dos nossos corpos que se amavam sem receios. Senti-a completamente entregue, por isso também me rendi. Não queria pensar em qualquer outra coisa que não fosse leva-la ao prazer máximo.

Ficamos dias assim, como se o mundo lá fora não existisse. Só veio-me a realidade quando ela disse-me , quase em suspiro, que precisava mesmo de inspiração. Trouxe-me então toda a história de que seus livros seriam o retrato, algumas vezes, de sua vida íntima. Olhei-a intrigado e como se adivinhasse meu pensamento disse que não me preocupasse, havia dispensado os outros. Depois riu descontraída não sossegando minha dúvida se falava sério ou não.

Respondeu-me com o tempo. Fui conhecendo-a devagar. Uma mulher compenetrada, que odiava expor-se. Os amantes que presenteavam-na, não passavam a maioria, de meros pretendentes. Soube também que sofria. Aquela bela mulher,

tão invejada possuía algum mal interior. Dormia com tranquilizantes e quando deixava-os de lado, tinha um sono agitado, pesadelos, acordava no meio da noite aos prantos. Abraçava-a e ela olhava-me agradecida por não questiona-la, mas aguardava ansioso o dia que me revelaria o que se passava em seu ser.

Tinha -me como um cúmplice, um amigo, mas algo ainda incomodava-me. Somente em sua intimidade revelava-se. Quando abriam-se as portas de seus aposentos, era transformada. Era de novo aquela Sophia de olhar distante. Pedia-me segredo sobre nosso relacionamento. Temia que me tranformassem em mais um de seus casinhos. Então diante da sociedade era para ela um estranho.

No começo contivi-me. Levei com bom humor. Quando passava pelo segurança dizia que não conhecia-me em tom de brincadeira. Aos poucos tornou-me um fardo. Odiava vê-la em público dizer que não tinha compromisso. Doía o ciúme de ver homens aproximando-se dela em razão disso.Não duvidava de sua fidelidade, queria apenas poder orgulhar-me de estar ao seu lado em todos os momentos. Ela pedia-me paciência. Dizia querer terminar seu novo livro sem maiores especulações.Então acalmava-me com seus beijos e por um tempo rendia-me.

Enfim ela terminara seu livro, que não me deixara ler uma página sequer. Enquanto estava sendo editado daria uma entrevista pra pronunciar-se sobre ele. Antecipei-me perguntando se então diria a verdade sobre sua vida particular. Disse-me que se arguída com as melhores palavras sim. Fiquei louco com a expectativa. Pela primeira vez tive medo que não mexericassem sobre sua vida.

No então esperado dia, enfie-me frente ao televisor, esperei ansioso a pergunta e a resposta prometida. A entrevistadora mal pode conter o entusiasmo quando Sophia concordou em responder perguntas pessoais dizendo que nada tinha a esconder.

Finalmente: "Dizem por aí que você está tendo um caso com um famoso jornalista. Conte para nós , é verdade?"

Tremi.

Ela sorriu e apenas disse:"Não, não é verdade."

Tremi de novo. Agora de um ódio imenso. Ela negara.Não conseguia acreditar. Com total frieza negara. E o desfecho da entrevista não trouxe nenhuma retificação.

Passada a fúria entrei em um estado de inatividade. Não sei quanto tempo fiquei jogado em meu sofá, até ouvir o telefone tocar. Era ela, mas não atendi. Ligou-me repetidas vezes. Não me manifestei. Fiquei montando um quebra-cabeça. As coisas encaixavam-se. Os boatos. Ela usara-me. A inspiração de sua obra.

Dei um telefonema. Minutos depois estava de férias. Desapareci. E se ela procurou-me não tivera notícias.

De onde estava procurei um tempo curioso o lançamento do livro dela, que inexplicavelmente adiou-se. Queria comprovar se relataria algum fato verídico em suas páginas. Seria odioso. Dias depois recebi um pacote postado por meu melhor amigo, o único que soubera do meu envolvimento com ela. E não sei se por causa de sua veia cômica ou mesmo por amizade mandou-me um exemplar de "O encontro do amor". O livro!

Li-o com avidez e desapontado deparei-me com uma história de amor muito diferente das que costumava escrever. Simples, melosa, com final feliz. Murchei. Queria motivos para procura-la, dizer -lhe desaforos. Minutos depois acendi-me de novo. Inspirou-me. Frente ao laptop escrevi frenéticamnte e mandei à revista minha coluna da semana. Nomeei-a "O encontro da verdade". Falava nela sobre inspiração. Dizia-me um estudioso que nunca escrevia sem conhecimento de causa. Repudiava quem pudesse escrever sobre artes sem conhece-las, sobre moda sem prestar-lhe atenção e principalmente sobre o amor sem senti-lo.

Momento nenhum nomeei Sophia, como mesmo nunca fazia, mas imagino que o até o menos atento dos meus leitores não teria dúvida do que eu falava. Reforçava-me a crítica, os boatos que corriam sobre sua vida. Uma mulher inconstante.

Como sempre recebi manifestações de todos os gêneros, mas o que me interessaria mesmo seria ver a reação dela.

Nos encontramos. Não a sós, mas em um evento. Ela como sempre rodeada de gente e eu acomapnhado de uma bela mulher. Dela não vi qualquer reação.

Mais poucos dias passados, li uma nota que dizia ter o livro de Sophia uma reedição, onde a autora presentearia seus leitores com um anexo. Pensei somente em um golpe de vendagem, já que sua nova obra passar bem longe dos números alcançados.

Novamente meu melhor amigo, agora pessoalmente e sem nenhum resquício de humor, presenteia-me com a nova edição do livro.

Desdenhei no começo, mas em pouco tempo aguçou-me a curiosidade. Seu novo prefácio intitulava-se " A verdade encontrada". Argumentava a respeito da mentira e da omissão, em um interminável discurso, quase enfadonho. A ponto de desitir da leitura, encontrei o seguinte trecho por ela narrado: " Certa vez perguntaram-me se eu estava tendo um caso com um famoso jornalista. Disse apenas que não. Os mais intrigueiros disseram que menti. E afirmo, não menti. Minha resposta teria sido diferente se perguntassem-me se eu tinha encontrado o grande amor da minha vida ou então se eu estava vivendo uma linda história de amor. Certamente diria que sim. Coisas assim não se escondem, apenas protegemos a fim de não despertar a inveja, a ira dos que não tem coração e não suportam a felicidade alheia sem dissipar-lhe veneno..."

A partir daí não pude prosseguir a leitura. Fui lembrado novamente de que tinha um coração, que agora batia comprimido, sufocado, causando-me uma dor quase insuportável.

Vieram suas palavras à minha cabeça "Se me perguntarem com as melhores palavras..." Senti-me um grande tolo como só me senti quando a vi pela primeira vez.

Mais calmo só pensei que queria vê -la de novo. Mesmo que por uma última vez!

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Continua...