Pé na cova

Dona Zulmira, em sua lavagem de roupa rotineira terminava de ferver as últimas peças de roupa para estender no varal da vila, quando recebeu a notícia que o senhor Manduca faleceu em serviço. O pobre padeiro todos os dias levantava às quatro horas da manhã e com a sua bicicleta chegava à padaria do senhor Raimundo para dar inicio a sua jornada fazendo entregas de pão quentinho de taberna em taberna. Só saindo de lá às seis e vinte da noite.

Muito conhecido, o senhor Manduca começou a ser chorado desde cedo. Muitos amigos, muitos conhecidos, muitos filhos, vizinhos e uma mulher fogosamente atraente.

A frente do desembaraço do corpo estava o senhor Curinga, proprietário da padaria, como era conhecido pelo nome fantasia de sua empresa.Homem respeitador e bastante justo em tudo o que fazia.

Velado o corpo o dia inteiro da sexta – feira, no sábado de manhã os comentários se arriscavam acerca da viúva, que inconsolada não parava de chorar e se agarrar ao caixão, dizendo sempre ou melhor, pedindo sempre para ir com o defunto.

- Não me deixe aqui Manoel! Eu não irei aguentar sem você!Eu vou ser enterrada junto!Te amo, te amo!.

Aos olhos do povo o sofrimento era tal como clamava a voz da viúva. Pois justiça seja feita ele fazia tudo por ela. E enquanto vivo, os dois se davam muito bem.

Na boca de todos era unanime dizer, que aquela pobre moça iria sofrer muito, com a falta daquele rapaz de ouro. Ainda mais, com três filhos.

Por detrás da porta, sempre alguém reparava de outra forma e tercia comentários maldosos em pleno velório. Assim como: - Quem vai ficar com essa viúva enxuta!

No vai e vem das conversas seguia a prossissão para enterrar o Manoel.

Lá pelas onze horas da manhã, após a cova está aberta e o padre da comunidade proferir as últimas palavras uma chuva fina resolveu benzer o corpo daquele católico ferrenho. Não admirável, mas até exaustivo, o lamento da viúva continuava intenso, seguindo as mesmas retóricas, até que em determinado momento, com a água da chuva a desfazer os montes de terra, onde a viúva se posicionara em prantos com os filhos fez a coitada desabar dentro do buraco, caindo caixão adentro. Ao mesmo que chorava, sua expressão tomou-se de um medo medonho, cujo grito apavorado saiu da boca em desespero a pedir socorro e a gritar repetidas vezes:

- Me tirem daqui!... Me tirem daqui!...Eu não quero morrer.

Num segundo de tudo o que se passou. A ação do coveiro, foi repentina e logo as pessoas começaram a se mobilizar para ajudar a tirá-la da cova que ela tanto fazia questão de ir.

Após o episódio, fez-se um silêncio calado. Até o choro parou e não demorou muito para todos, em sua conveniência começarem a comentar e a rir do incidente da viúva, que também não demorou mais que um mês para ir viver com outro.