A DOR DA EXCLUSÃO

A DOR DA EXCLUSÃO

Olhar fixo era o que sobrava naquela criatura. Nada lhe escapava à visão. Na quietude, era só contemplação. Do alto da sua observância a tudo via sem fazer um só comentário sequer. Algumas vezes presente, em outras, na mesma medida, desaparecida.

Esse era o perfil que melhor se adequava a ela, fosse onde fosse, estivesse onde estivesse. Comia pouco, em relação a sua massa corpórea, mas tinha uma tendência danada para engordar. Talvez, as roupas usadas ressaltassem ainda mais este aspecto apresentado.

Tinha uma mania de cantar em horas, para alguns, inoportunas. Pior do que isso só o próprio canto que parecia expressar toda a melancolia do mundo. Arre, não tinha quem aguentasse ouvir aquele lamento seguido. Era a tristeza encarnada.

Poderia deixar maluco o melhor dos psicólogos com aquele seu jeito impassível de ser. Houve quem desconfiasse que aquilo não era da parte de Deus e ainda sugerisse que teria parte com o demônio.

Ah, coitada! Além de feia e tristonha ainda era amaldiçoada. Tudo ao seu redor parecia arquitetar um plano para eliminá-la da face da terra. Não chegava a ser nojenta, mas era comparada ao ser mais asqueroso.

Houve quem comentasse que se ela tivesse filhos, todos teriam a sua semelhança e, por associação, seriam igualmente condenados à rejeição. Sendo mortos, quem iria sentir falta daquela prole horrenda? Qualquer um poderia atirar pedras e já teria um álibi perfeito e pronto.

Um dia teve filhos e seguiu uma vidinha monótona, mas feliz. Continuava atenta aos detalhes e ensinava aos filhos a desenvolver os mesmos comportamentos que apresentava em sua rotina diária. Saia exclusivamente o necessário e mantinha um estado de vigilância constante. Era de doer nos nervos.

Um belo dia, quer dizer um dia qualquer, pois para ela os dias eram sempre iguais, teve uma surpresa ao chegar a sua casa. Encontrou a residência vazia quando deveria encontrar a prole na expectativa do seu retorno. Sim, a prole porque o companheiro havia sido morto antes do nascimento dos gêmeos caçulas.

Ficou louca e saiu desesperada para procurar. Bateu todos os logradouros públicos, esteve em hospitais especializados, escavacou muitos recantos e tudo em vão. Quando já estava perdendo as forças e as esperanças encontrou um informante que disse saber do paradeiro dos seus filhos.

Seguiu junto até o lugar apontado por aquele que friamente mostrou o que sobrou deles. Chorou copiosamente e não queria sair dali por dinheiro nenhum. Por mais que fosse consolada pelo informante, não se resignava por nada desse mundo. Ao contrário, demonstrou toda sua indignação quando o desgraçado comentou que o planeta tinha ficado mais bonito com a ausência da feiura dos seus filhos. Pobre coruja.