Não vi que era você

A noite estava inusitada. Enfeites de natal, guirlanda, pisca piscas e gente, gente que se abraçavam, falavam, falavam, gritavam eufóricos e festejavam ao som das musicas que se atropelavam entre os fogos de artifícios. Eram tios, tias, sobrinhos, namoradas e vizinhos.

Feliz natal pra cá e pra lá. Era chamado o nome de uns e de outros sob a fantasia do presente. Sobre a mesa um festival de vinhos, boa comida e enfeites com bolos variados.

Uns dançavam, outros se exibiam com finos trajes enquanto numa das mesas acanhada estava uma família, que de longe parecia humilde, como se a caridade ali se fizesse estadia para abrilhantar e aliviar os pecados.

De tanto que se ria, de tanto que se falava, de tanto que se comia, de tanto que se bebia, que os problemas acabaram por se esconder, esperando o melhor momento para falar com você.

Tudo ali era alegria. Carros do ano entravam e saiam era só uma festa.

Quando chamaram o meu nome fui o antepenúltimo a ir ao centro, fiz pilhéria e até dancei.

Ao chamar o meu oculto...

Tive um susto, pois quem veio receber o presente era meu amigo de infância, que naquele momento saiu daquela mesa acanhada, mal vestido e definhado. Fiquei todo sem graça, dei o presente, que ele descobriu ser um cd de M.P.B. Agradecido ele em seu nobre gemido disse respondendo a todos, que ele não tinha terminado os estudos, que os seus filhos pediam pelas ruas e sua mulher havia falecido por não ter atendimento no hospital.

Naquele momento ele agradecia ter alguma coisa para jantar e não sabia se quando voltasse para casa, a ponte a qual o abrigava ainda teria o seu lugar. E como ele tinha sido convidado, alguém do grupo disse que o presente seria ele estar lá.

Foi ai que lembrei, quando acostado no meu carro próximo ao viaduto numa noite fria, aquela pessoa pediu ajuda para levar a sua esposa ao hospital e com medo do mendigo, pensando ser assalto eu recusei.

No meio de toda aquela pompa, me despi de mim mesmo e me desculpei. Pensei, quão vazios nos tornamos, quando enchemos as nossas casas de ouro e prata.

Dei o meu presente nem sei para quem. Abracei aquele brasileiro e vislumbrando de novo a essência do Natal pedi a Deus amor ao corações.