INCÓGNITA PARTIDA

Espalhado pelo chão, o lixo denunciava certo desleixo. A poeira sobre os móveis confirmava que o desleixo era total. Desistira da vida e, agora, ali sentado em frente ao televisor, assistia Bob Esponja. O som estava alto, mas o que importava? Nada ouvia mesmo...

O dia amanhecera ensolarado. Na padaria, ao pedir uma dose de conhaque, vira algumas senhoras o olhando com repulsa. Bebendo, a essa hora da manhã? Mas o que elas tinham com isso?

- Não liga pra essas mal amadas – disse a balconista, cúmplice, servindo-lhe a bebida.

Com os cinqüenta centavos que sobrara, comprou o jornal que atiçava a curiosidade dos leitores – também, por esse preço, não se poderia exigir profundidade nas matérias.

Ao chegar em casa empurrou a porta. Ela estava só encostada. Sentando-se à mesa, pôs o pãozinho sobre a toalha imunda que a cobria, e, olhando pela janela, sentiu os olhos sendo fustigados pelos raios solares que invadiam a pequena sala. Sala? Aquilo era um a cubículo com mesa, sofá, cama, e fogareiro – que fogão caberia ali?

Não se animara a esquentar a água para o café. Com a alma ensombrecida e os pensamentos turvos, teve ânimo apenas para sentar-se no sofá. À dor amiga que lhe apertava o peito de vez em quando, não fez caso. Com o cabo da vassoura, ligara o televisor... em extrema-unção.