P A S S A G E I R O S III

A sociedade parte II

Quero poder tocar o chão com meus pés, mas, por mais que eu tente não consigo. Meu corpo está flutuando como se não houvesse mais gravidade e estou enjoado por isso. Eu não estou sozinho. Há mais pessoas comigo e posso ver que elas estão apavoradas. O avião continua subindo. Quando o piloto anunciou que os motores tinham pifado, já havia me preparado para cair, mas, não. O avião está sendo puxado por algum tipo de campo magnético. Estamos subindo. Eu estou ofegante e reparo nos demais para ter certeza do que suponho. Eles estão tragando sua última cota de ar. Não resta dúvida, a essa altura já passamos da estratosfera. Preciso respirar. Não consigo. Meus olhos estão saltando para fora. Eu vejo uma senhora a minha frente perder a consciência. Sinto pena dela, mas, não estou em condições de ajudar a ninguém. Ajuda! Preciso de ajuda. Estou agonizando quando uma forte luz toma conta do interior do avião. Meus pulmões estão enchendo de ar novamente. Estou aliviado, mas, espere. Não existe som! Os outros passageiros estão arfando, alguns tossindo. Percebo porque suas bocas estão se abrindo e fechando, mas, nenhuma voz está saindo. Estou surdo. Penso. Levo minhas mãos aos ouvidos e estou pressionando-os com força. Nenhum sinal. Tento de novo. Nada. Meu Deus. Estou mesmo surdo. Meu celular está um pouco mais acima. Eu o alcanço, mas, está sem bateria. Tem outros mais a frente. Quando decido ir até eles, estou caindo rápido. Meu rosto bate forte contra o chão. Tem alguém sobre minha costela. As portas que dão acesso à saída estão se abrindo. Estou meio tonto, mas consigo me levantar com algum esforço. Não tenho certeza se quero sair. O espaço lá fora é incomum. Não se parece em nada com um solo terrestre. Então, percebo. É uma nave. Gigantesca. Uma luz azul vibrante a preenche. Outras naves menores estão flutuando próximo ao avião. Estou com medo. Decido que não irei descer. Não tenho escolha. Uma força invisível está me puxando para baixo. Agarro-me à perna de uma mulher próxima a mim, mas ela me golpeia com um chute bem no nariz e então, não vejo mais nada.

_Acorde Tone!

Alguém está chamando meu nome. Estou sonolento e forço meus olhos a se abrirem. A luz! Coloco-me de pé num ímpeto. Que dor é essa? Um espasmo de dor percorre meu corpo. Estou tombando para o chão, mas, não chego até ele. Estou sendo sustentado por uma pessoa. Não quero ver seu rosto. São eles! Não preciso olhar para saber. São eles! Não. Espere. As mãos! São... Delicadas!

_Está tudo bem? –Pergunta.

Não são eles. Meus olhos estão abertos agora, fixos no rosto de quem me sustenta. É uma mulher. O timbre é forte, mas também delicado. A imagem ainda está turva. Não posso ver com precisão os traços, mas, eu me esforço. Ela pergunta de novo se estou bem, então, o timbre, o reconheço. É Maria. Estou feliz. Então ela está bem! Meu Deus! Eu ainda não havia pensado nela. Sinto a culpa chegando.

_Os outros?¬– Estou falando com dificuldade.

_Estão bem! –Reponde ela.

_Foram eles. –Estou me esforçando. – O Brendon! –Completo.

_Sei disso. Fique calmo.

Há algo errado. Maria está tranquila de mais. Como assim sabe? Mas é claro. Como sou idiota. É claro que ela sabe. Como pude deixar esse detalhe passar? Brendon conversava com outras duas pessoas além de mim na cúpula. Maria era uma delas. Nunca soube o que falavam, pois, me mantive concentrado no meu plano de fuga. Mas, espere! Tem algo mais, consigo me lembrar agora. O rosto dela, não me é estranho tanto quanto pensei. Não. É certo que não. O avião! Estou relembrando. Fora a ela que me agarrei quando a força estava me puxando para fora do avião. Preciso de mais detalhes! Me lembro que quando me agarrei à sua perna, ela tentou se soltar então um objeto estranho veio voando para meu rosto, era uma carteira de identificação. UFOLSECRETS é o que está escrito. Não tenho mais tempo para observar mais, pois seu pé está golpeando meu nariz e me colocando pra dormir. Meu Deus! Estou raciocinando rápido de mais agora. A UFOLSECRETS. Estavam atrás dela. Precisavam resgatar a ela e não a todos os outros. Aliás. Me lembro com pesar e lástima. Os outros passageiros estão mortos. Assassina! Estou culpando Maria agora. Não quero seus braços sustentando meu corpo. Tento me desvencilhar. Estou tombando para a maca. Eu a observo com fúria. Mas, tenho uma dúvida ecoando em minha mente. Porque não deram a ideia para ela cavar o buraco. Por quê? Estou levantando hipóteses e uma delas é bem provável. É claro. Tem que ser isso. Num minuto ela se aproximava de um grupo, noutro eles tentavam fugir e então os guardas vinham e os matava. Hora de Brendon entrar na sala e fazer sua parte, mas, ele não podia ir direto para ela. Certamente os oficiais sabiam de seus antecedentes. No entanto, os meus... Não tinham nada sobre mim que pudessem detectar como ameaça. Maria ainda encontrava um jeito de ajudar distraindo os guardas. Tempo suficiente para que Brendon e eu estabelecêssemos uma relação mais afetiva, então, ela estaria salva. Assassina! Volto a culpa-la. A cena dos aviões sobrevoando a cúpula e desfechando tiros para os outros passageiros está em minha cabeça. Desejo com todas as forças que Maria estivesse lá, mas, não, e a culpa é toda minha. Não quero olhar em seus olhos. Desvio o olhar para a porta. Há outra mulher lá. Escorada e em silêncio. Observo-a! Estive disperso e deixei esse detalhe passar, mas, agora percebo. Não disse uma palavra se quer. É um mistério. Quero me levantar de novo, mas, a perna dói. Decido que vou ficar sobre a maca mesmo, mas, estou me recompondo e articulo uma pergunta.

_Quem é ela? – Respiro fundo depois que atiro a primeira pergunta.

_Jéssica. –Ela mesma se apresenta. Talvez autossuficiente de mais para esperar que outra pessoa o faça. – Muito prazer! – Ela está se movendo rumo à maca. Reparo no decote do vestido. Tem pernas bonitas. Não reparo em mais nada, pois ela está se apressando em falar de novo para que não haja espaço de Maria intervir na apresentação.

_Seria em outra ocasião. –Falo espontaneamente com um tom de malícia.

Ela sorri!

_Certamente! –Responde.

Maria trata de nos interromper. Está me encarando.

_Diga a que veio. –Diz ela para Jéssica.

_Sou integrante da UFOLCRETS.

_Não poderia deixar de ser. –Digo.

_Não somente. –Maria está falando agora.

_E sou repórter de um dos jornais mais influentes do mundo.

_São um bando de...

_Cuidado com o que pretende dizer. –Maria está sobre mim e pressionando minha perna. Eu berro de dor.

_O que vocês são? –Pergunto.

_Digamos que somos uma sociedade. –Responde depois que solta minha perna. –Deixo escapar um suspiro. –Precisamos dar a notícia quanto antes. –Completa.

Estou surpreso. Eles realmente querem revelar ao mundo sobre os extraterrestres. Quem sabe as pessoas ainda tenham uma chance. Pode ser que consigam impedir que... Estou pensando rápido de mais e meu olhar foge do quarto. Maria já percebeu e está me trazendo de volta. Estou olhando para ela nesse momento e quero rebater o que disse. Não perco tempo e o faço.

_Fique a vontade! –Ironizo.

_Não seja idiota. –Ela está alterada. –Você será o nosso porta voz! –Conclui.

_Não. Eu não serei. –Contesto. – Você também esteve naquele avião. É uma passageira. Viu tudo que vi. – Disparo. – Tem todas as informações que tenho, então, vá em frente. –Estou arfando.

_Idiota!

Ignoro o insulto. Maria continua.

_Faço parte da UFOLSCRETS. Podem muito bem ignorar o que tenho para dizer por acharem que estou apenas tentando promover essa empresa.

_A Jéssica também faz parte disso. –Acuso.

_Não. Para o mundo, a Jéssica é uma repórter simplesmente... E... Nossa ponte de acesso a milhões de pessoas.

_Ótimo. –Digo. –Pode começar a entrevista. Caso não saiba, o youtube também pode funcionar muito bem como um jornal de alcance mundial.

_Claro! Quanta credibilidade as pessoas irão dar à nossa matéria! Escuta... –Maria está sobre mim de novo. Espero a perna doer absurdamente, mas, dessa vez, ela não faz nada. –Você diz estar preocupado com a sua família não é mesmo? –Pergunta.

_Exato!

_Então sugiro que pare de bancar o idiota se quer dar a eles alguma chance de viver. Você mesmo disse. Eu estive naquele avião. Eu vi o que você viu. Eu sei o que você sabe. Tenho certeza de entende que aquelas naves não demorarão muito a chegar nesse planeta.

Ela está certa. Mas...

_Nunca transmitirão uma gravação tão polêmica! –Estou especulando.

_E quem falou em gravação. –É a voz de Jéssica em minha mente agora. –Entraremos ao vivo.

Fico paralisado por um instante. Depois volto a contestar.

_Uma declaração não será suficiente. –Aponto.

–Tem razão. Por isso temos sorte em ter mais sete passageiros do nosso lado.

É verdade! Havia me esquecido dos outros. Isaac! Então eles também estarão nessa. Começo a me interessar mais pelo plano da sociedade UFOLSECRETS. Ainda odeio o fato de terem matado os demais passageiros, mas, depois que o mundo estiver em alerta sobre os alienígenas eu poderei encontrar uma forma de denunciá-los. Não. Estou afastando esse último pensamento. Minha vida nunca mais será a mesma daqui por diante. Precisarei de aliados. A lei da conveniência deve prevalecer. Eu me abomino, mas, preciso ser calculista se quiser continuar vivo e manter a salvo as pessoas que amo.

_Se é assim... –Tomo fôlego. Estou olhando nos olhos de Maria. –Que seja rápido. Vamos ao jornal.

_Não podemos agir precipitadamente.

Não consigo entender Maria nesse instante.

_Porque não? –Pergunto.

_Porque estamos sendo caçados pelos oficiais das forças americanas.

Ela diz isso com uma calma irracional. Eu não quero acreditar. Há algo errado. Como? E é exatamente essa minha próxima pergunta. Maria faz uma pausa tensa e sinto que o ar pode explodir meus peitos tão rápido que respiro.

_O último avião. –Ela está dizendo.

_O que tem ele? –Me apresso.

_Alguma coisa deu errado. –Sua fala é arrastada. Estou apreensivo. –Descobriram nosso plano de fuga. O último avião...

_Rápido. –Me altero.

_Não nos pertencia. –Termina.

Estou olhando para os lábios dela. Estão se movendo lentamente. Ela está enganada. Não pode ser isso. A última bomba! A NASA! Eles sabem e partirão com tudo que têm para cima de nós até que não estejamos mais vivos para contar a história.

Não tenho tempo para sentir medo. Brendon está na sala apavorado. Ele grita para sairmos o quanto antes dali. Os oficiais estão vindo. Eles vão nos matar. Droga, a minha perna está quebrada e não posso correr por conta própria. Estou sendo carregado para fora do quarto por duas mulheres. Isso é constrangedor. Não fosse a situação, eu certamente deixaria o orgulho tomar conta de mim, porém, não poço me dar ao luxo agora. Enquanto passamos pelos corredores vejo Isaac e os outros se apressando para a saída também. Um carro nos espera. Estou melhor agora que o vejo. Mas, fui rápido de mais ao sentir alívio. Os oficiais já estão nos cercando. Não faço ideia de como escaparemos dali, seus revólveres estão apontados para nós. Estamos sendo advertidos em não tentar fazer qualquer movimento suspeito se não quisermos ser baleados. É o fim da linha de novo... Não. Lembro-me do diálogo um tanto desagradável que tive com o Marcos. “Nós também temos poder” ele disse.

O carro que nos espera está se movendo lentamente rumo aos oficiais à frente. Acontece um primeiro disparo por parte deles. De repente não tenho mais apoio e estou caindo para o chão. Os outros estão fazendo a mesma coisa. Os oficiais! Eles continuam disparando para o carro que segue até que algo inesperado aconteceu. O carro explodiu. Uma fumaça preta está tomando conta de tudo. Esta é nossa chance. Brendon e Isaac estão me levantando. As mulheres fugiram. Pelo menos agora não preciso me sentir tão inútil. Os outros já desapareceram na fumaça. Onde estão? Estou preocupado. Então os vejo. Há outro carro ali nos esperando. Marcos está no volante. Eu estava certo. Deram um jeito de nos tirar mais uma vez de uma situação de risco. Eles têm poder! Penso. Assim que estamos dentro do carro o motor esquenta e deixamos os oficiais presos na fumaça bem atrás de nós.

_Para onde vamos agora? –Pergunto.

Sem olhar para trás, Jéssica responde com o timbre um tanto embargado.

_Interromper uma transmissão ao vivo.

Silêncio!

Não pergunto mais nada. Apenas espero ansioso para revelar ao mundo o que teremos que enfrentar logo mais adiante.

C O N T I N U A . . .

Héryton Machado Barbosa
Enviado por Héryton Machado Barbosa em 07/04/2014
Código do texto: T4759207
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