História da Semente (Fábula)

Era uma vez, uma semente. Como era gostoso ser semente! Dentro de si, trazia uma vida e ansiava por ser uma árvore frondosa, com muitos e saborosos frutos.

Como todas as suas amigas sementes, estava protegida em uma embalagem bem reforçada, com duas folhas de papel bem grosso e costuras em todos os lados. Estava em um lugar seco, porém bem arejado.

Ficara no final da embalagem mas não importava-se. Em breve seria plantada e floresceria. Sabia que aquela época em que estavam era a melhor para o plantio.

Uma a uma, as amigas despediam-se da sementinha, esperando que ela estivesse em breve com elas:

_ Torça para estar do outro lado do bosque. Ouvi dizer que existe uma açude muito bonito lá perto.

_ Como você ficou sabendo se a gente estava dentro do saco? - perguntou a sementinha.

_ É que quando o humano abriu o saco e retirou as que estavam em cima, um passarinho, muito maroto, quis nos ter para o jantar! Veja só! Eu conversei com ele pedindo para que não nos comesse. Ele pensou, ouviu e disse que seria melhor comer o fruto da árvore do que uma simples sementinha! Que danado! Aí começamos a conversar e ele me disse isso. Não é bom?

- Claro que é! Espero que não demore muito!

Ouviu-se um barulho: eram os donos da fazenda que voltavam para buscar mais sementes para colocar na máquina.

_ Acho que está na hora de ir. Tchau!

_ Tchau! Até breve!

Com essa conversa, a ansiedade da nossa sementinha aumentou e muito! Queria ir logo, bem rapidamente!

Assim foram prosseguindo os dias, até que, subitamente, restaram apenas a nossa amiga e mais uma dúzia de sementes.

_ O que será que aconteceu? - pensava a sementinha. - De repente os homens pararam de nos levar e só sobrou a gente!

Teve medo mas mesmo assim acreditava que seria plantada. Os dias foram passando, foram passando e nada... Que tristeza! Estava sozinha porque suas outras amigas não agüentaram, murcharam, perderam a saúde e morreram.

Já velha, nossa semente pensava: "Como eu queria estar na beira daquele açude, virando árvore, dando frutos e criando outras sementes! Aqui estou, esquecida, no escuro... Mas que importância tem o que a gente sonha?

Uma voz dizia, baixinho, para a sementinha:

- São os nossos sonhos o que nos mantém vivos, mesmo assim, como você, solitária no fundo do saco.

Procurou a voz e não encontrou. Entendeu que essa voz era uma semente, como ela, que carregamos em nosso coração. Emocionada, pensando no que aquela voz havia dito, começou a lembrar de toda a sua vida e ficou um pouquinho menos triste:

_ A vida foi tão boa! Tive um monte de irmãs, que virarão árvores e que terão muitos frutos. Que importa que eu não tenha conseguido? Mais infeliz é que nem existiu para se lembrar de quando era pequena, de quantas amizades teve, de quanto viver é bom! O dia que eu ficar velha e não puder ser mais semente, o que não vai demorar muito, eu vou sumir no chão e ajudar as minhas irmãs a crescerem mais bonitas!

Já não estava tão triste. Quando não viveu mais, morreu, foi para o solo e realmente, ajudou a todas as outras sementes.

Tanto isso é verdade, que quando uma pequena parte dela chegou àquela com a qual havia combinado estar à beira do açude, a semente que brotava lembrou-se da amiga e fez uma prece ao Pai Celestial, agradecendo por tê-la sempre perto de si. Lembrava-se sempre de tudo: de quando conheceram-se, da conversa e concluiu que os sonhos das duas tinham virado realidade e moravam na beira do açude, como planejaram.

A noite caiu sobre a plantação e sob seu manto prosseguia a marcha das criaturas.

(P.S.: Esse texto foi escrito em 1999, para uma pessoa que havia sofrido uma perda na família)

André Vieira
Enviado por André Vieira em 10/05/2007
Código do texto: T481848