A Justiça em pessoa

Um dia todas as ideias se materializaram em carne e osso, e passaram a andar sobre a Terra com um corpo como o nosso.

A Justiça percorreu o mundo todo, ficou horrorizada com o que faziam em seu nome e com o seu nome. Convocou todos os advogados da Terra, que prontamente responderam, mas sobraram poucos quando souberam que seria "pro bono", só os inspirados. Ela pleiteou o seu direito de resposta e foi em busca de si própria. Com algum tempo percorrido, chega a notícia do veredicto, ela seria ouvida no mundo todo. Gravou a sua mensagem, se apresentando para o mundo:

- Eis como sou, humanos - disse, despindo-se das vestes em nu frontal, e fez questão de mostrar todos os seu melhores ângulos - aqui estou diante de vós, me entendem? Já sabem quem sou eu agora que me conhecem de fato? - Os seus olhos transmitiam tudo o que ela era e ficaram todos boquiabertos, até as mulheres.

Os advogados aconselharam um tom menos ousado, mas a Justiça disse que estava segura de si mesma e não poderia ter sido mais verdadeira. Todos concordaram porque eram apaixonados por ela de longa data, mais ainda agora que a conheciam, nua e crua. Era maravilhosa por dentro e por fora. Mandaram a fita assim desta forma explícita, não poderiam ser mais claros que isto. Os veículos de comunicação receberam a ordem judicial e a colocaram no ar.

Foi um escândalo na sociedade contemporânea quando a Justiça em pessoa se mostrou daquela forma, magnífica, e tão diferente do que os homens ensinavam, mas os mestres e doutores eram tão orgulhosos que não podiam reconhecer terem ensinado errado por tanto tempo, resolveram esconder o seu ledo engano e bolaram mais um ardiloso plano.

- Aquela senhora despudorada que se dizia a Justiça em pessoa foi declarada louca pelo médico perito, e para a proteção da sociedade será internada em uma clínica do Estado, ficando incomunicável enquanto não se encaixar ao nosso entendimento, pra não mais incomodar--nos, digo a incomodá-los - disse pigarreando pelo ato falho o assessor de imprensa do governo, por ter sido o escolhido para representar tal falsidade, sua expressão foi, no mínimo, enigmática.

Hoje a Justiça vive num quarto junto com a Verdade e a Consciência dos Homens. Passam o tempo jogando conversa fora e sonhando com a Liberdade, que o Estado ainda está perseguindo.