Duas tentativas de suicídio

Você está tendo frustração em cima de frustração. Concordo com o Roger, ultimamente só tem sido frustração por cima de frustração. Ele finalmente saiu desse quarto. Uma semana de molho não é brincadeira, sem mencionar o fato de ter ficado quase um mês naquele hospital.

Roger é meio doido e por isso gosto dele. Está na casa dos quarenta e as palavras que mais pronuncia são: MANHÊ, MAMÃE, MÃE! É verdade, ele não consegue se locomover muito bem, um lance com osteoporose. Sempre quando cai quebra o braço em três partes. Coé, cara. Tá com

fome? Não, Roger, tô tranquilo, valeu. Dizer isso me doeu tanto quanto meu estomago faminto nesses últimos cinco dias. Levou um sacode de mulher. Uma porrada tão forte capaz de matá-lo,capaz de matar qualquer um. Isso acontece muito quando um carioca se envolve com uma paulistana. MANHÊ… Prepara um macarrão com bastante molho! O Cristiano vai comer também. Ela corre pra cozinha e eu penso na vida. O círculo tá apertado, sempre esteve, é preciso uma rota de fuga, é preciso um modo de se dar bem na vida, tem de existir alguma forma em

algum lugar. É preciso ter dinheiro no bolso, diz Roger. O que você faz com o seu dinheiro? Drogas? Você nunca compra comida. Qual é, cara. Você não estuda, não paga aluguel, contas. Quais são suas despesas? Cadê tua grana!? Explico-lhe que nem eu sei ao certo onde anda meu

escasso dinheiro. É verdade. Não faço a mínima ideia de como meu dinheiro voa tão longe a ponto de simplesmente sumir. Talvez seja porquê o salário mínimo dos Eua está 1200,00 USD enquanto o nosso salário deve estar uns 700,00 R$ no máximo. O Brasil é o país com os

impostos mais abusivos do PLANETA e nem vou citar qual o destino deste dinheiro pois isso não é novidade alguma. Vai lá pegar teu prato. A macarronada está ótima. Passou muita fome aqui né, parceiro? Ele sabe que o final está próximo. Todos sabem. Você pode não acreditar,

diz ele, mas vai ser foda passar pelo teu quarto sem ver o teu tênis largado na porta. Ir na recepção sabendo que você não estará fumando cigarro escondido. Nunca mais vou te ver, quer dizer, isso é estranho. Compartilhamos banheiros, camas, comidas, bebida, risadas e lágrimas

durante um bom tempo… Pois é, Roger. “Não há nada sem separação”. E pensar que perdemos tanto tempo naquela coisa estúpida que sinceramente nem sei como aconteceu. Eu estava de cabeça quente, retruca, você me conhece. A culpa foi minha, você é um cara legal, não

deveria ter feito aquilo contigo. Relaxe, Roger. Sei como funciona, já fiz isso também, e com pessoas que me amavam… Lavo a louça e a garota aparece. Seu cheiro. Lembrarei deste aroma natural de beleza até daqui a mil anos. É melhor não falar nada, melhor não falar nada

durante meio século. E quem disse que consigo?

Andrei está louco pra sair. Faço esse sacrifício, o garoto é mais novo que eu e já tentou suicídio duas vezes, merece se divertir um pouquinho. Garoto inteligente que possui sotaque porto alegrense. Preciso dizer o quão agradável é sua presença? Nosso papo varia dentre

astronomia a náufragos amorosos. Pub legal aqui na Augusta, e pub legal significa mulher a rodo. Bah, aqui só tem mulher feia. Tudo bem, Andrei, que tal fingir que estamos em Floripa?

Melhor assim, concorda. Como um carioca nascido e criado no subúrbio, todas essas garotas me parecem musas francesas. Duas garotas extremamente gostosas sentadas sozinhas num sofá convidativo. Junto-me as duas enquanto Andrei pede mais bebidas. Não quero papo, diz a mais gostosa. Tratando-se de mulher, a vontade de uma é a vontade de todas, sem chances com uma, sem chances com todas. Game over. Andrei aparece na hora certa. Um vasto gole bem gelado de heineken, precisava disso. Bah, eu só chegaria naquelas duas barangas se estivesse bêbado. Tudo bem, Andrei. Quem precisa dessas “barangas”, não é mesmo? É óbvio que necessitamos de mulher, isso é algo fundamental. Detonamos mais algumas cervejas e resolvemos partir.

Rachamos um táxi e conversamos sobre mulheres e suas barreiras. Confesso estar cansado disso, de mulheres. Jamais recusaria uma bela buceta, mas as vezes isso cansa. Não há novidades, entende? Quero uma mulher que seja minha amiga, alguém que acrescente algo. Estamos cansados dessas filhas da puta que só nos deixam de mal a pior. Concordamos em saltar na praça Sílvio Romero e forrar a pança com dogão. Uma breja antes de dormir? Bah, porquê não? Purê de batata no topo… Até que não é tão ruim… [mas lá no sul é melhor].

cristiano rufino
Enviado por cristiano rufino em 28/06/2014
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