A suicida *

Dionísio é um desportista e todas as manhãs corre à beira do lago. Há três dias observa uma mulher trajando roupa branca, parada a olhar o rio. Ou está sentada segurando os joelhos ou de pé, mas olhando o rio.

– Que hábito estranho! Se é que se trata de hábito! – pensou e prosseguiu em seu trajeto.

No dia seguinte, o quarto dia, viu-a novamente e resolveu ir falar com ela.

– Bom dia, senhora. Desculpe, se a incomodo. Na verdade, meu espírito de futriqueiro me cutuca, pois há dias vejo a senhora assim, olhando para o rio.

– Não se moleste. Estudo meu futuro, olhando para ele.

– Não entendi.

– Vou me matar e estou fazendo isso premeditadamente. Não conte à polícia; poderiam tentar me impedir. – Eu ia abrir a boca para protestar, mas ela notou, e erguendo a voz, atalhou-me: – Ora, moço, tenho esse direito!

– Não senhora!

– Não acha que tenho o direito de arbitrar sobre mim mesma?

– O direito é o que menos contesto. Minha negação é um protesto. Como uma moça tão bonita pode calcular seu fim? Tem um motivo?

– Estou buscando um.

– Como?! Nem sequer tem um motivo? Está deprimida. É isso.

– Amigo, se todos nós algum dia morreremos, decidi que quero escolher meu tipo de morte. Quero decidir sobre, como, quando e onde.

Dionísio pensou um pouco. Não concluiu nada, achou muito louco e preferiu seguir sua corrida matinal. Talvez, de sangue frio, pudesse entender aquela doidice. Isso fez que ele pensasse, deveras, sobre fim e começo.

Não se escolhe quando, nem onde nascer; não se escolhe quando, nem onde morrer, onde estaria, então, o livre arbítrio? Poderia acontecer de aquela mulher morrer atropelada ou ter um ataque fulminante do coração. Seus planos de termo planejado seriam interrompidos sem que ela pudesse fazer nada. Ora, ansiedade para morrer! Essa era nova!

Talvez devesse adverti-la de que o universo poderia, simplesmente, não dar a ela esse gostinho. Portanto, pensou ele, um dia, minutos, segundos, que ela perdesse planejando tempo, local e modo para morrer, poderia ser atrapalhado um plano universal superior ao dela. Quem sabe, diria a ela para premeditar menos e agir mais?

Agir? Diria isto? Pareceria muito insensível, mas se ela estava disposta a se matar, perder tempo com planejamento poderia acabar cruzando com a linha da morte natural, e isso frustraria os planos da suicida.

Ora, mas o que estava pensando?

Voltou ao seu trajeto, na manhã seguinte, e avistou-a. Fez uma curvinha e freou ao lado dela.

* Trecho do livro: ARREBOL, da escritora Maria Montillarez

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http://www.livrariacultura.com.br/scripts/resenha/resenha.asp?nitem=82695510

http://www.livrariasaraiva.com.br/produto/7506496?PAC_ID=18659

http://store.kobobooks.com/pt-br/books/arrebol/Ajtl-ACMKkaYYL6xu0xk4g?MixID=Ajtl-ACMKkaYYL6xu0xk4g&PageNumber=1

http://www.siciliano.com.br/prod/7506496/arrebol/7506496?FIL_ID=102IBA

Boa leitura,

http://www.iceib.com.br

MARIA MONTILLAREZ. Disponível em: www.mariamontillarez.com.br
Enviado por ROGÉRIO CORRÊA em 06/11/2014
Reeditado em 06/11/2014
Código do texto: T5025485
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