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A frase, inventada de repente, o fiz rir sozinho na sala de sua casa: “Como quereis caridade para contigo se não a tendes para comigo?”.

- Que frase bárbara! Vai fazer o maior sucesso na pregação de hoje à noite, e fará aquela turma de ovelhinhas deste bom pastor fazer doações muito maiores, dar os dízimos mais caprichados ainda, se bem que não possa me queixar. Até que minha turma é boa e bem desprendida dos bens materiais, mas eu quero é mais. Quero muito mais. Quero tudo que puder arrancar deles em nome da caridade, em nome de Deus, em nome de Jesus. Em O Nome do Senhor Jesus. Aquele carro novo da “Chevrolet” tem freqüentado meus sonhos ultimamente e não vejo porquê não ter um se o meu templo é bom e bem freqüentado. Vou treinar a nova frase em casa até conseguir dizê-la de um modo que comova a todos, da primeira à ultima fila. O truque é fazer a voz vibrar. Vibrar bem alta, bem sonora, bem emocionada, gritando para que todos ouçam: “Como quereis a caridade para contigo se não a tendes para comigo?”, e depois explicar que o “comigo” refere-se ao próximo, ao Senhor Jesus, à caridade para com o próximo. Garanto que essa frase vai arrancar as últimas moedas que eles tiverem nos bolsos. Posso apostar e apostar alto. Aquele carrão da “Chevrolet” está cada vez mais próximo de minha garagem. Estou sentindo isso. Aleluia, irmãos em Cristo. Aleluia! Amém?

- Falando sozinho, meu bem?

- É, minha querida. Estava aqui burilando uma frase. Veja o que você acha: “Como quereis caridade para contigo se não a tendes para comigo?”. Bem bolada, não é?

- Legal. Só caprichar no modo de dizer, que é tudo, afinal de contas, e a turma vai se deixar tosquiar de cabeça baixa. Mas não se esqueça de explicar que o “comigo” refere-se à caridade, ao Senhor Jesus, ao próximo...

- Claro, meu amor. Claro que terei que explicar, senão poderão pensar que o comigo é comigo mesmo e não posso deixar que pensem assim; não é mesmo?

Rindo muito, abraçaram-se e ela aproveitou para cobrar o templo que ele prometera fundar para ela havia um bom tempo.

- Calma, paixão, muita calma nessa hora. Faltam apenas seis prestaçõezinhas para meu templo virar sede própria. Prometo que, quitando a última parcela, o próximo templo a ser construído será o seu.

- Mas eu quero independência. Não quero ser sua franqueada não. Quero minha renda pra mim, sem ter que te prestar contas.

- Você é quem sabe, minha querida. Mas, neste caso, se passar aperto pra pagar os aluguéis ou as prestações e as despesas, também terá sua independência. Esqueça que eu existo se por acaso passar aperto. Sendo minha franqueada você terá mais sossego, terá meu apoio total, minha pense bem.

- Você vai é querer ficar com a maior parte e fechar os bolsos pra mim, já sei muito como será. Já te conheço.

- Injustiça, meu amor. Injustiça pura. A gente divide a renda meio a meio e eu cuido de sua tranqüilidade financeira.

- Bonito, não é? Você tem a sua renda e ainda fica com a metade da minha. Uma beleza mesmo...

- Esquece que quem banca as despesas da casa sou eu?

- Isso quer dizer que não posso ter minha renda e ajudar na despesa da casa?

- Sei lá se você é boa pastora...

- Claro que não sabe. Nunca me deu uma chance, sempre com medo de perder seu cartaz, de eu ter chance de mostrar que sou melhor que você.

- Não estou a fim de discutir. Minhas condições são essas: meio a meio com a minha ajuda, ou cem por cento pra você sem apoio meu. Você decide.

- Decido muito...Se eu disser que quero tudo pra mim você vai enrolar e não vai construir nem alugar o meu templo.

- Aí é que você se engana, minha querida. Vou cumprir minha promessa o quanto antes. Só o que quero é que você depois banque as despesas da casa sozinha.

- Maravilha das maravilhas...Pra você, safado. Então eu tenho que carregas a casa nas costas enquanto você esbanja por aí ou acumula dinheiro no banco?

- Mas o investimento não será todo meu? É mais do que justo que retorne de alguma forma.

- O investimento não será todo seu. Esquece que enquanto você tosquia suas ovelhas eu cuido dos bastidores? Quem cuida da casa? Quem cuida dos filhos? Quem cuida de tudo quanto é tipo de documentação pra tudo? Quem leva os filhos ao médico, ao dentista, à escola? Quem cuida de você quando fala demais e fica sem voz? Ou vai dizer que não faço nada disso?

- Está bem, está bem. Reconheço que faz tudo isso e merece seu templo. Pronto. Assunto encerrado. Quarenta por cento pra mim e sessenta pra você.

- Vamos começar tudo de novo...Cem por cento pra mim e sua ajuda quando eu precisar. Ponto final. Assunto encerrado.

- Trinta e setenta. Trinta por cento pra mim e meu apoio integral nas horas de aperto.

- Cem por cento pra mim e seu apoio integral.

- Não vou construir nem alugar templo algum pra você.

- Tudo bem. Vou pedir a separação, escrever uma autobiografia e nela vou contar tudo, tudo, tudo, tudo que sei a seu respeito, meu querido pastor de almas.

- Em que bairro você vai querer o seu templo?

Fernando Brandi
Enviado por Fernando Brandi em 10/06/2007
Código do texto: T520854
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