A Especialista = Histórias de Amor Safado

Que figurinha difícil!! Estava mais do que na cara que era de origem modesta, modestíssima até, e queria passar por grã-fina; ignorante, esforçava-se por demonstrar cultura; mal vestida, dizia-se elegante; mal educada, falava muito em etiqueta e bons modos.

Vê-la e ouvi-la divertia-me sempre, e com poucas frases conseguia espicaçá-la e levá-la à defensiva. Disparava, em segundos, a dizer besteira atrás de besteira, como se respaldada por uma formação acadêmica indiscutível, e passava de um assunto a outro sem qualquer transição. Dizia barbaridades do tipo “quando a gente se formamos e foi todos da família em férias para a França, capital de Paris…”.

Literatura, política, finanças, economia, culinária, moda, terrorismo, religião, jornalismo, filosofia, pedagogia, psicologia, não havia assunto que não entrasse em sua conversa, bem misturado a todo o restante, formando sempre um verdadeiro samba-do-crioulo-doido.

Às vezes eu achava que ela era totalmente maluca, mas logo via que era apenas exibicionismo explícito de ignorância acumulada no decorrer de sua ainda jovem vida.

Era gostoso provocá-la. Gostoso e fácil fazer aquela bela boquinha disparar a dizer asneira atrás de asneira. Ela era toda bonitinha apesar da cafonice com que se vestia, misturando trapos que certamente adquiria em algum brechó de periferia. Bonitinha e sempre cheirosa. Gostosinha.

- Menina, eu fico impressionado cada vez que converso com você. É impressionante como você absorve conhecimentos, como defende seus pontos de vista, como sabe explicar as coisas para a gente. Acho, sinceramente, que você nasceu para ensinar, para dar aulas.Talento nato. Vocação pura.

- Você não é o primeiro a me dizer-me isso. Já falaram que nasci com a terapêutica da pedagogia e com o dão do magistéri . Sabe que já tive uma coluna em um jornal importante? Eu fazia uma coluna para jovens, que era publicada toda semana.

- É mesmo? Puxa vida! Em que jornal?

- Sabe que fiquei tão aburrecida com eles, com os cara do jornal, que até já me esqueci-me totalmente deles. Não consigo mais recordar nem me alembrar nem do pseudônio que usava para escrever.

- E porquê você usava pseudônio ?

- Meu pai, meu amigo. Meu pai era muito ocioso do nome da família e dizia que jornalismo era coisa de gentinha. Tive que inventar um pseudônio para escrever. Pode uma coisa dessas?

Era tanta besteira, tanta bobagem dita com cara séria que eu tinha vontade de cair na risada na cara dela, sem cerimônia alguma. Mas ficava sério e dava corda. O corpinho dela era muito, muito atraente mesmo.

Um dia, já firmada nossa amizade, eu demonstrando respeitá-la cada vez mais intelectualmente e consultando-a sobre os mais diversos assuntos, achei que chegara a hora de desafiá-la pra valer. Pra valer alguma coisa para mim.

- Minha querida amiga, aposto que tem um assunto no qual eu ganho longe de você.

Ela me olhou com aquele arzinho superior, de quem sabe que é imbatível em qualquer área, e condescendeu em ouvir a barbaridade que eu lhe diria.

- Sexo. Aposto que de sexo você não entende nada. Quem estuda tanto quanto você, quem vive mergulhada na leitura de jornais, livros, revistas, manuais, tratados, não pode, não tem tempo, de aprender nada sobre sexo.

- Isso é o que você pensa? Não é através do sexo que a vida surge e aparece? Claro que eu não poderia deixar de desconhecer tudo sobre sexo. Estou pensando até em escrever outro livro sobre sexo para a juventude.

- Outro? Você já lançou um?

- E não? Fez tanto sucesso que acabou em tudo quanto é livraria. Nem eu consegui ficar com um para mim.

- Qual era o título dele?

- Espere um pouco. Escrevo tantas coisas que até me confundo toda. Acho que era “Sexo para a Juventude”. Só me lembro que ele foi vendido mais ou menos na faixa etária de uns trinta reais nas livrarias e foi um sucesso enorme.

-É. Devia ser um livro ótimo pra custar na faixa etária de uns trinta reais…

E eu tinha que ficar sério para o meu plano dar certo.

-Então eu estou falando com a pessoa certa. Sabe o que é, minha querida? Estou com um problema sério, desses que a gente tem mesmo é vergonha de contar aos outros.

- Que tipo de problema? Quer me contar?

Olhei para o meio de minhas pernas e lamentei baixinho:

- É com ele…

- Que isso, um jovem ainda tão novo, na flor da cidade…

Na flor da cidade..Brincadeira….Se eu risse estragaria tudo. Consegui só balançar a barriga, em uma boa risada interna e ela deve ter confundido isso com início de choro.

- Não fique assim, meu caro. Pra tudo nessa vida tem remédio.

- Eu não consigo…

- Não consegue o quê? Contar pra mim?

- Não. Eu não consigo que ele dê sinal de vida. E já faz um bom tempo. Ainda bem que encontrei uma especialista em sexo em quem confio.

- Isso é bom. Sua confiança em mim ajudará muito no tratamento.

- Que tratamento?

- Você não quer se tratar-se?

- Quero muito. A coisa que mais quero é me tratar-me e voltar a ter uma vida sexual ativa.

Ela colocava a mãozinha no queixinho delicado e balançava a bela cabecinha, pensativa.

- Onde você acha que a gente poderíamos conversar em sossego?

- Não tenho a menor idéia. Minha casa é cheia de gente. Na sua eu sei que não vai dar certo. Seu pai não aceitaria uma pessoa simples como eu em sua casa. Acho melhor deixar pra lá.

- Não, meu querido amigo. De jeito nenhum. Vamos, pense em um lugar sossegado onde eu possa lhe dispensar um tratamento deficiente.

Achei que àquela altura a coisa já estava bem encaminhada e arrisquei:

- Você levaria a mal se eu sugerisse um motel? Claro que seria apenas para que a gente pudesse conversar em paz. Você confia em mim?

- Certamente que confio. Ainda mais no estado que você se encontra-se.

Dirigi o mais devagar que pude até o motel mais distante que pude me lembrar. Ela, ao meu lado, não parava de falar sobre meu problema e as possíveis soluções sobre as quais já lera muito e se aprofundara pra valer.

Quando entramos no quarto do motel eu a abracei emocionado, rodei-a em meus braços e enchi seu rostinho de beijos:

- Menina, você é fabulosa!! Simplesmente fabulosa!! Dá para acreditar numa coisa dessas? Com uma única sessão, com uma única boa conversa com você, já estou curado! Olha só, ponha sua mãozinha aqui e veja o resultado!! Está duro, durinho, no ponto, pronto pra deixar qualquer mulher feliz. Você é um fenômeno!!

De repente parei no meio do quarto, soltei-a e encarei-a com minha melhor expressão de assustado:

- Será que ele vai funcionar mesmo? E se for só uma coisa passageira? Não posso nem pensar em uma recaída…Eu me mataria.

- Ora, meu amigo. Amigos são pr´essas coisas. Vamos ver se está funcionando de verdade ou se você ainda necessitará ou precisará mesmo de mais tratamento.

Para minha surpresa e grande espanto, “ele” não apenas funcionou muitíssimo bem como também funcionou melhor e por mais tempo do que conseguia me lembrar havia muito tempo.

Sexo na prática era uma coisa que minha polivalente amiga podia, se fosse o natural dela, contar vantagem.

Com algumas sessões posteriores de tratamento ela não apenas me ensinou todo o Kama Sutra como também indicou algumas correções a serem feitas na obra consagrada.

Fernando Brandi
Enviado por Fernando Brandi em 11/06/2007
Reeditado em 11/06/2007
Código do texto: T522781
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