A Leva-e-Traz = Histórias de Amor Safado.

A fama de fofoqueira daquela mulher era enorme.e conhecida por todos os vizinhos. Linguaruda, indiscreta, leva e traz profissional, dedicava sua vida à vida alheia. Mas a maledicente era, ao mesmo tempo, engraçada, divertida e espirituosa. Eu e meu irmão adorávamos vê-la em nossa casa, falando sem parar, e minha mãe ouvindo-a, sem participar nem perguntar coisa alguma.

A língua ferina chegava, sentava-se bem próximo à minha mãe, deixava as pernas à mostra, e dava trabalho à língua. Minha mãe escutava, ria, dava um pouco de atenção a ela e continuava com seus afazeres de mãe de meia dúzia de filhos. De vez em quando se manifestava:

- Não diga uma coisa dessas, filha. Olha que é muito sério o que você está dizendo e pode prejudicar a reputação da pessoa.

Ela ria, percebendo que fora um tanto quanto longe demais, e saía com outro assunto. Ou melhor, escolhia nova vítima e mudava depressa quando minha mãe se horrorizava e chamava delicadamente sua atenção.

Eu não prestava atenção alguma ao que ela dizia. Prestava imensa atenção às suas belas, bem torneadas e bronzeadas pernas. Pernas, peitos, bunda, barriga, cara, cabelos, enfim, nela, da cabeça aos pés, é que era dirigida minha atenção.

Depois que ela se ia, eu corria para o banheiro, entrava em um banho quente e lhe rendia minha homenagem de garotão em fase de crescimento. Ainda bem que ladrilho de banheiro não engravida…

Desejava-a com toda a intensidade que um garoto de dezesseis, dezessete anos, sei lá, pode desejar uma mulher adulta e gostosa. Jurava que a comeria nem que fosse a última refeição de minha vida. O marido era um mastodonte enfezado e pelo menos duas vezes mais encorpado que eu, no mínimo. Daquele tipo imbecil que hoje em dia andaria com um boné virado para trás, traria uma imensa tatuagem no peito e diria porra e caralho a toda hora e em qualquer lugar. Amedrontador, enfim. Mas a mulher dele, a língua de trapo, era uma delícia de se olhar e desejar.

Como possuí-la? Como conquistá-la? Onde traçá-la? Porquê daria pra mim? Ela nem me enxergava direito. Aquele problema tornou-se uma obsessão. Uma mania. Uma psicose. Mais um pouco e eu poderia até me tornar um necrófilo: mataria para possuir. Ainda bem que não cheguei a tanto.

Um dia, em plena sala de aula, repetindo de ano pra variar, a idéia me veio à cabeça com tanta clareza, com tanta intensidade, com tanta convicção, que dei uma porrada na carteira e gritei “Eureca!!”. Não sei se foi um eureca com c ou com k, mas foi um belo e sonoro eureca.

A turma riu e fui expulso da sala de aula.

Expulso da sala, vibrei de alegria. Teria mais tempo para matutar sobre a idéia e para tomar coragem de colocá-la em prática. Tinha, naquele momento, mais do que certeza de que aquela madame fofoqueira e gostosa seria minha e bem depressa. Meu cérebro maquiavélico, talvez com a ajuda da cabeça de baixo, matara a charada. Eu descobrira como dar pelo menos uma comidinha naquela jovem senhora que tinha idade para ser minha mãe, mas que era a mãe mais deliciosa do bairro.

Foi com calma, com tranqüilidade, com frieza e sangue-frio que consegui meu objetivo.

Dois dias depois que eu fora abençoado com a idéia divina, ela estava lá em casa denegrindo alegremente a vida alheia, e eu fingia estar alheio a ela. Calúnia pra cá, maledicência pra lá, difamação pra encher os espaços vazios, e eu caladão, mergulhado na leitura dos maravilhosos livros didáticos que odiava.

De repente, talvez levada pelas mãos de meu Anjo da Guarda, cúmplice de minhas sacanagens e pensamentos sacanas, minha mãe nos deixou a sós. Aproveitei a rara ocasião e disse a ela, com o meu mais cândido jeito:

- Me contaram uma coisa impressionante a seu respeito.

- É mesmo? Diga o que foi que te contaram sobre mim.

- Não posso dizer agora. Minha mãe pode ouvir. Mas foi coisa cabeluda mesmo.

- Menino, não me sacrifique. Conte logo o que falaram a meu respeito.

- De jeito nenhum. Se minha mãe ouvir uma coisa dessas não vai mais deixar você entrar aqui em casa e não poderei vê-la.

- E o que te importa me ver?

- Você é bonita, bacana, inteligente, e eu gosto de ouvir você conversando. Outra hora te conto tudo que ouvi.

- Que hora?

- Minha mãe, meu pa,i e meus irmãos querem viajar na Páscoa. Eu vou ficar aqui porquê estou de castigo. Se você vier aqui eu te conto o que ouvi.

- Eu venho. Sem falta.

- Agora, silêncio. Minha mãe está voltando.

Não deu outra. Meus pais e meus irmão viajaram na Páscoa e eu fiquei de castigo em casa. Dezesseis, dezessete anos de idade, cumpri alegremente meu castigo, mas fingi que sofria para que meu pai mostrasse aos outros filhos que seus castigos eram pra valer.

Alguns minutos depois que a Kombi da família arrancou, ela surgiu, linda, gostosa e curiosa lá em casa.

- Então, queridinho, vai me contar o que soube a meu respeito?

- Claro que vou, mas antes tenho uma coisa minha a lhe dizer.

- O que é? Diga logo.

- Desde que você veio aqui em casa pela primeira vez que eu só me masturbo pensando em você. Sou tarado por esse seu corpo lindo. Dá pra mim, dá?

- Seu safado!! Tão novinho e tão sem-vergonha!! Está pensando o quê? Que sou uma dessas vagabundas que saem dando por aí sem pensar nas conseqüências? Ainda mais para uma criança…Essa é boa! Muito boa mesmo!! Eu vou é contar pra sua mãe.

- Tá bom. Então vá embora. Eu guardo pra mim o que me contaram sobre você.

- Vou embora, mas antes você vai me contar o que disseram a meu respeito.

- Não vou contar mesmo. De jeito nenhum.

- Que maldade!…Vai me deixar curiosa, me maltratar porquê estou respeitando um menino…

- Menino coisa nenhuma. Olha pra mim e veja se isso é pinto de menino.

Mostrei a ela minha ereção, que sobressaía na calça, e ela viu que eu não estava brincando. Que meu desejo por ela era indiscutível.

Sorriu, pôs a mão entre minhas pernas, sentiu a firmeza, e me perguntou se eu jurava que nunca contaria a ninguém que topara a troca. Jurei por tudo que me era mais sagrado. Até pela vida dela, que era a pessoa que eu mais amava no mundo. Sempre confundi tesão com amor.

A safada bem que gostou de ir para a cama comigo e me ensinar algumas coisas que gostaria que o marido fizesse nela. Sempre. E eu gostei muito de fazer. Senti, naquele momento, que nascera com vocação para o sexo despudorado. Mas só com mulheres fêmeas do sexo oposto ao meu.

Ela se entusiasmou ensinando, eu fiquei alucinado aprendendo, tomamos gosto pela coisa e chegamos a um ponto em que ela quase me entregou solenemente um belo diploma.

- Nossa mãe!!..Você é tão diferente daquele animal com quem me casei…Tão melhor do que ele…Puxa vida, como foi bom…Vou querer sempre.

- Eu também. Você costuma ficar sozinha em casa?

- Toda as manhãs. Pelo menos até a hora do almoço. Você pode entrar pela janela e sair por ela também. Agora, pelo amor de Deus, me conte o que disseram a meu respeito e quem foi que disse.

-Você já ouviu falar nos neurônios?

- Família daqui do bairro?

- Sim, deste bairro.

- Nunca, mas deixa comigo que descubro quem são eles. O que é que eles disseram?

- Disseram que você é tão linguaruda que seria até capaz de dar pra qualquer um só pra ficar sabendo de uma boa fofoca.

- Desgraçados!Filhos de uma puta! Ordinários!! Dizer isso de mim!! Logo de mim, que respeito tanto a vida alheia…Que ódio, meu Deus, que ódio!! Onde é que eu posso encontrar esses tais da família Neurô…como é mesmo o nome deles?

- Sabe que estou em dúvida? Neuro..Neuri…Neurimas..não, não, Neurôlimos, diabo de coisa ter tanto italiano nessa terra. Deixa estar que eu me lembro e te digo. Da próxima vez eu te digo.

Ela saiu da cama, vestiu-se com gestos raivosos, mas acabou ficando mais calma. Mais calma, ela filosofou comigo:

- Sabe que há males que vêem para o bem? Por causa dessa calúnia acabei te conhecendo melhor e passando a dar mais valor à juventude. Agora você já sabe: vai bem cedinho, logo depois das sete, pula a janela e me espera no quarto. Se meu marido não sair de casa a janela ficará fechada e você volta quando estiver aberta. Se um dos meninos estiver em casa a cortina ficará fechada até ele sair. Estamos combinados?

Depois daquele memorável dia ela não apareceu mais lá em casa para fofocar. Eu é que aparecia na casa dela para fo..fo..fofocar, digamos assim.

Êta mulher boa de língua. Tão boa que me ensinou até a usar a minha da forma certa. A diferença é que não uso a minha pra falar mal da vida alheia. Prefiro contar casos e piadas. E uma ou outra mentira.

Fernando Brandi
Enviado por Fernando Brandi em 12/06/2007
Código do texto: T523164
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