Noite de chuva

Fazia frio.

Também, com o jeans encharcado nas pernas, o que esperar?

Mas, não era assim que o corpo de Luísa se sentia.

Parecia que o peito ardia.

Se aproximava a meia noite e seria perigoso ficar na estação aquela hora, sem eletricidade e no meio daquele temporal. Sua casa ficava cerca de 20 minutos da estação mas o caminho, naquelas condições se tornara perigoso para uma jovem de 20 anos. E daí que ela conhecia Flávio apenas "de vista"? A gentileza dele em oferecer carona no pequeno guarda chuva tornou-se uma proposta irrecusável.

Desciam a ladeira de ombros colados, conversando trivialidades, quando a chuva se intensificou:

-Você se importa? -disse ele, envolvendo-a com seu braço direito.

-É...não.

Nesse instante o pensamento desperta e toda uma infinidade de coisas passam pela cabeça. O calor daquele braço, o cheiro bom do perfume, o som da voz dele tentando deixá-la mais à vontade falando sobre a semana das provas.

O vento empurrava os fios dos cabelos perfumados dela para as narinas dele e sua mão descansava na cintura dela

Flávio não era bonito, ou melhor, passava despercebido pelos comentários das amigas da faculdade de letras. Faziam o mesmo curso, só que em turmas diferentes.

Luísa, essa sim, linda, se formaria um semestre antes dele e já tinha estudado com seus atuais professores.

Eles seguiam em passo apressado pela rua de pedras irregulares quando a bela tropeçou. Rapidamente, ele a amparou e seus olhares se encontraram. Não sentiam a chuva apesar do vento ter arrancando o guarda chuva da mão de Flávio. Sentiam apenas o hálito quente um do outro, a pulsação dos corações e o magnetismo entre os corpos, totalmente molhados a esta altura.

Fitaram-se longamente no minuto mais longo da humanidade. A rua, a cidade e o mundo estavam desertos. Estavam a beira de um abismo. A um passo de pular e descobrir que aquele beijo os daria asas. Parecia um pecado mortal não se entregar aquele desejo.

-Você está bem?

-Sim, acho que sim. Obrigada!

Ele correu para apanhar o guarda chuva e deixá-la em casa.

Desaceleraram o passo. Esqueceram até o ponto onde a conversa tinha parado. Estavam rindo mas havia um clima suspenso no ar. Aquela sensação de que "o momento" havia passado e que aquele beijo que não aconteceu teria mudado suas vidas para sempre.

Chegaram ao destino.

-Muito obrigada!

-Nem tem muito o que agradecer, você tá toda molhada mesmo.

-Que nada. Obrigada pela companhia. Seria perigoso vir sozinha nesse escuro.

-Não por isso. Bem, está um pouco tarde. Nos vemos amanhã?

-Claro. Boa noite!

-Boa noite!

Ela entrou e ele seguiu. Não dormiram pensando no que aconteceu naquela noite.

Se viram na semana seguinte.

-Oi.

-Oi, tudo bem?

Sorriram, seguiram e nunca mais se falaram.

Freddye Matias
Enviado por Freddye Matias em 12/06/2015
Reeditado em 06/07/2015
Código do texto: T5274898
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2015. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.