Quinta - Feira

Marineuza décima filha de Cantidia e Alfredo Quirino, morava e estudava no interior da capital Belém. Quando terminou o primeiro grau, isso em 1976, os pais de Marineuza ficaram preocupados com o estudo da menina. E como dos filhos, a única que estudava, era ela pensavam eles, dela ser a salvação da família. Sem recursos e sem muito estudo Cantidia e Alfredo decidiram pela filha. Resolveram mandar Marineuza para estudar na capital e falando, falando encontraram o compadre Ivo, que estava de boa pelo interior e iria voltar pra capital com sua mulher, dona Filomena e seus três filhos pequenos.

Então ficou acertado que a menina iria morar na cidade, na companhia daquela família e seria matriculada numa escola, para terminar os seus estudos.

Marineuza chorando partiu, partindo também o coração daquela velha e sofrida mãe.

Já na cidade vieram as adversidades, pois Filo com ciúmes do marido, em menos de três meses pôs a moça no olho da rua. Quando Ivo voltou do trabalho o acontecida já havia sido relatado da janela de uma vizinha lá no inicio da vila que eles moravam. E nem bem Ivo chegou em casa e a briga foi a lei do momento, que colocou a cabeça do rapaz em agonia, sentenciado-o ao inferno por não saber o paradeiro de Marineuza e nem o que dizer aos pais da moça se acaso voltasse a vê-los.

Passado os dias, Ivo cansado de procurar resolveu aceitar uma mentira de que a moça se perderá na volta da escola pra casa e assim os dias passaram e uma carta chegou as mãos dos pais de Marineuza, sofreram bastante, mas se conformaram.

A moça perdida, que ainda pouco conhecia da vida na cidade se envolveu com umas amigas, que sempre gazeteavam aula e juntas começaram a enveredar por um mar de lama. Marineuza e as amigas começaram a beber e fumar, iam para os cabarés e como ela precisava de dinheiro foi incentivada a fazer programas, que lhe rendia uma quantia em dinheiro razoável para pagar uma pensão.

Acostumando-se a essa vida fazia de conta que estudava, ia à escola de segunda a quarta, depois voltava na sexta, na quinta não aparecia, pois era o dia que atendia a clientela do cabaré e pra não desconfiar dela, sempre se justificava que era o dia de ir a novena de Nossa Senhora de Nazaré e nesse dia não podia faltar.

Tanto que ela fez, que lá um belo dia o servente da escola a viu no cabaré. Sem dizer nada, querendo levar vantagem se aproximou e perguntou quanto era a hora e se ela fazia de graça. A moça ao reconhecê-lo saiu correndo do local e ali nunca mais a viram.

Uns dizem que ela foi para outra cidade, outros dizem que ela voltou para o interior e há quem diga que ela se casou. O fato é que de Marineuza a única coisa que se ficou conhecido, depois que ela “ arribou o pano”, foi como o povo passou a chamá-la.

Se não era Marineuza, se não era senhora do povo, formosa como ela, acharam adequado chama-la de quinta – feira. E esse codinome soou tão forte, que foi bater no interior da capital, fazendo Alfredo Quirino vir a todo vapor tomar satisfação com Ivo seu compadre, que a partir daquela data o desconjurou.

Nas alamedas da vida, o pai muito triste encomendou promessa a São Longuinho e de tanto insistir que encontrou a sua filha em outra cidade, mas bastante maltratada pelo tempo, pela miséria e muita fome. Vítima do caminho que ela tomou, vítima de um sistema, que é incapaz de disseminar a compaixão. Ela no colo do pai, em lágrimas cabedais de seu último suspiro, estava sozinha no tempo, acolhida por uma tuberculose, mais companheira do que seu algoz. Oriunda de todo o sacrifício, indiferença e discriminação que ela passou, no chão dessa cidade civilizada.

Ali, num momento sem hora, pois Alfredo não sabia ler nem escrever soprava o vento e as palavras de um pai, que não sabia o que dizer e nem o que pensar, foi o último adeus na quinta-feira.