PRORROGAÇÃO DO BETE

 

Nós, como fazíamos todos os dias, jogávamos bete na rua. Bete é um jogo esquisito, tipo um baseball de pobre. Uma bola de meia, não gostávamos das de borracha, 2 latas dessas de óleo, dois círculo no chão, e 2 tacos. Jogava-se em duplas. Quem estava no círculo rebatia a bola, e o jogador que estivesse atrás, tinha que buscá-la, enquanto isso quem estivesse no cículo ía até o centro e contava de um a dez: o "catinodé". Contávamos somente a pronúncia da palavra, que era a sinopse de um a dez... Acho que todo mundo conhece o jogo, não vou explicar mais, é muita regra. Acontece, que estávamos jogando na rua e eu devia ter uns 11 anos, atrás de mim estava o Marruco, que hoje deve estar em Jacksonville na Flórida limpando bunda de aposentados, uns dois anos mais velho que eu. Num intervelo ele chegou e disse:
_ Hoje eu estava no banheiro, passei a mão no meu pinto e ele ficou duro. Ele ficou bem maior. Mexi pra lá e pra cá. E gozei. Saiu um negócio tipo grude de fazer pipa. Agora farei  isso todo dia. É bom demais!
_...!!!???
_ Quem te ensinou isso? - alguém perguntou.
_ Foi o Lucinho!
Sempre o Lucinho. Mais velho e professor especialista em novidades. Quanta à ciência do Marruco, sujeito que sempre mereceu esse apelido, era algo digno de admiração. De repente o Marruco virou o mais sabichão da rua. Eu nunca tinha ouvido falar naquilo. Como assim ficar duro e maior? Era impossível. De repente as coisas mudaram. Naquele momento eu não gostei das mudanças. Parece que o jogo perdeu a graça. Alguma coisa tinha acabado, e algo mais importante estava surgindo. As mulheres começaram a adquirir outro sentido, ficaram mais bonitas e atraentes. Foi dando um desespero. Até uma raiva. Não queria parar de jogar bete, biloca, pique-esconde, nadar escondido no rio... isso era bom demais. Mas essas brincadeiras não pareciam combinar com essa coisa de pinto duro. Voltamos pro jogo. A bola veio, e eu a rebati, e foi parar, dada força da raiva, lá na Fábrica de tijolos e telhas, do outro lado do muro. Só que o taco, uma ripa cheia de quinas, escapuliu e bateu bem no cocoruto do Marruco. Ele caiu desmaiado no chão. A mãe dele, que era crente da Assembléia de Deus, veio acudí-lo, orando que não parava: "Sangue de Jesus tenha o poder!". Aquele jogo acabou. Mas matei o diabo, minha infância duraria por mais três anos. Sob muitos aspectos ela dura até hoje. E deve durar até o pinto parar de endurecer, pelo menos naturalmente.