A Incerteza

De repente, vinha uma coisa estranha. Uma dorzinha, algo como uma falta de ar, tristeza repentina, tudo junto. Há muito tempo que Isabela não se sentia assim, e ela odiava aquela sensação. Era assim que ela se sentia quando estava apaixonada.

Não, não, não podia ser. Estava tudo tão bom, tão certinho, por que se apaixonar agora? Ela não queria estar apaixonada; se pudesse, arrancava o próprio coração, só para não sentir o que estava sentindo. Parecia que qualquer sentimento fosse ameaçar seus planos, suas idéias. Amor, que antes era prioridade, agora estava em segundo plano. E quando tudo caminhava direito, o que acontece? Ele chega, de mansinho, e conquista espaço.

Não era nada de tão extraordinário, nenhum príncipe saído das histórias que as mães contam para as filhas na infância. Era um tantinho mais baixo que ela, os lábios não eram muito grossos, nem finos demais, os olhos castanhos eram bastante expressivos. Econômico nos gestos, de poucos sorrisos, inteligente. E era bem agradável ouvi-lo. Tinha uma bonita voz e não estragava tudo falando bobagens, como os outros meninos que ela conhecia. Logo se tornaram amigos.

Se falavam todo santo dia, nem que fosse só para trocar duas palavrinhas rápidas. Às vezes, apenas trocavam sorrisos; outras vezes, tinham conversas quilométricas.

O tempo passava, e as coisas iam se transformando. Então Isabela se viu assim, sem a atenção que costumava receber costumeiramente do novo amigo. E sentia aquela agonia, aquela tristeza, como se algo faltasse. Era assim que ela se sentia quando estava apaixonada por alguém. Mas será que estava mesmo?

Ele era muito bonito, o mais bonito dos garotos que ela conhecia. Então talvez se tratasse de uma simples atração física, normal em garotas como ela, nos seus 16, 17 anos. E era só se distrair um pouco que ela já punha a imaginação para trabalhar, imaginando uma cena romântica.

Mais ou menos assim: eles estavam em um campo, campo não, praça. Conversando, ele alisava a mecha mais clara do cabelo dela. Logo estavam trocando um beijo, sob a luz do luar e do poste. Isabela queria muito que esse beijo acontecesse, mesmo que fosse um só.

Depois ela lembrava que não podia dar asas demais à imaginação, senão não conseguia se concentrar em mais nada, e tudo dava errado.

Uma amiga percebeu que ela estava triste. Não adiantou dizer que não era nada, que estava bem; ela simplesmente não sabia disfarçar os sentimentos. Estava aprendendo a disfarçar. Na rua, indo ao ponto de ônibus, a amiga pediu:

- Vamos, fale... Diga o que sente.

- Não sinto nada especial.

- Não é verdade. Ninguém fica assim por nada. Eu sei; você gosta de alguém. Quem é?

Por alguns instantes Isabela relutou, não quis dizer, temia que alguém ouvisse e fosse contar para ele. Depois, resolveu contar, fazendo a amiga prometer que não contaria nada a absolutamente ninguém. Disse, e depois emendou um “eu já sei que não tenho chance...”

Pobre Isabela! Já estava bem convencida de sua má sorte. Achava que só conseguiria arranjar um namorado legal se Deus lançasse um raio sobre ela. Exagero, exagero.

Depois de declarar que estava apaixonada e não tinha chance alguma com o moço, se consertou.

- Mas eu não sei se é isso mesmo. Não sei se estou apaixonada de verdade, sabe?

A amiga ficou calada, sinal de que entendia. Isabela não queria dar um passo sem ter certeza; temia afugentar o garoto, perder a amizade dele. Isso já tinha acontecido com ela uma vez, não podia acontecer de novo. Então a melhor coisa a fazer seria dar um tempo e seguir com a vida normalmente, consultando o coração de vez em quando para ver se seus sentimentos com relação ao amigo haviam crescido, estancado ou voltado ao que era no princípio. Por enquanto ela não sabia. Simplesmente não sabia.

Evana Ribeiro
Enviado por Evana Ribeiro em 23/09/2005
Código do texto: T53182
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