A Dança

Não era pagode de esquina, mas preparação de uma quadrilha junina no meio da rua. A minha casa ficava de frente e como uma rainha, da janela assentada na poltrona animada vislumbrei aquela diversão.

Os vizinhos, todos estavam se distraindo. Já era como um ponto certo, a quem chegava do trabalho cansado e quer uma distração, que não fosse a prisão da televisão.

Minha mãe, minha filha e uma amiga estavam fazendo salão, enquanto aqueles meninos e meninas começavam a se organizar. Era um corre corre, um puxa puxa e todos fizeram um grande circulo.

Eita que a quadrilha vai começar dizia minha mãe acompanhada de Nikita.

Quando de repente chegou toda produzida uma garotinha, que não tinha visto por lá. Todos recepcionaram festivamente gritando sem parar, que a Esterzinha iria arrasar.

Começou a música, volta e meia, meia volta e todos pulavam sem parar.

Nikita observava, minha mãe rindo comentava os tempos áureos daquela brincadeira, falava –se inclusive de fogueira, das guloseimas festeiras, como o mingau de milho, bolo de fubá, entre outras iguarias. Minha amiga lembrava-se das boas festas, dos arraiais, quando num momento, pra terminar o ensaio. Aquela criança saiu-se naquela noite escura, como a bailar sob gritos eufóricos e coros. Ela dançava na comissão de frente e dançava com tanta propriedade. Ia ao chão, rebolava sensualmente, gingava venenosamente como uma moça strip erotiza.

Meu Deus, sem falso moralismo isso só pode ser uma visão, falei assim, meio que pra espantar a vergonha que fiquei ao lado de minha mãe, minha amiga e minha filha. E escandalosamente a menininha de apenas oito anos se requebrava e se enroscava num pau de fita. Tocava em seu corpo, passa as mãos em seios, que ainda não tinha, fazia posições e rebolava, envenenando as mentes e os corações.

Minha filha quis falar e eu a olhei e juntas pensamos o mesmo:

- Se nós estávamos pensado, o que estariam pensando aqueles homens, que lá assistiam atentamente hipnotizados. Mascarados de desejos, cuja mãe ignorante, não se apercebia. Apenas dizia-se orgulhosa pela filha ser de tão profunda maestria na dança.

Mais do que uma bailarina, era uma criança, cujo tempo seria para brincar, assim disse minha mãe, que saindo de onde estava deixou claro a sua preocupação descontente.

Sem saber o que fazer conversei com a minha filha sobre a cena e ela, meio que entristecida me dizia.

- Mãe é uma pena, mas a nossa sociedade machista e cruel, ainda tem a mulher como flor de cerimônia. Que só serve se for bom pra cama.

Enquanto lá fora urravam acompanhando o final do espetáculo daquela menininha, bem devagar retirei as cadeiras, fechei a janela e fui me recolher preocupada com o amanhecer. Afinal, se o futuro da esperança estão nas mãos das crianças, que crianças estamos desenvolvendo para termos a garantia de um país melhor?

Minha amiga dizendo-se horrorizada foi embora pra sua casa assustada.

Diziam os vizinhos satisfeitos na manhã do outro dia, que a menininha era uma fera, que ela dera um show.