As férias

Comparando a vida a uma plataforma de embarque: cheia de encontros e desencontros, assim era Ângela;amada por Carlos , Ângela não conseguia - esforçava-se ao limite- corresponder a esse amor. Trabalhavam juntos, moravam juntos, podiam fazer sexo juntos.Carlos ia de encontro a essa possibilidade.Não aceitava tê-la apenas pela metade, defendia o ponto de vista de que só o amor poderia preencher todo seu vazio existencial.

Eram tão amigos, ao ponto de planejarem onde iam passar as próximas férias: fazenda de dona Zuleika, tia de Carlos. Tia Zuleika, como ambos a chamavam, ainda jovem, decidiu deixar a cidade grande, e com economias de anos de trabalhos comprou uma pequena fazenda, bem distante dos movimentos enlouquecedores e da competição brutal; era assim que ela se referia ao seu antigo habitat.Passaram poucos dias, e estavam os dois como cúmplices fugitivos, olhando à paisagem. O trem ziguezagueando na curva, já era possível sentir o clima : quantas ambições diminuídas naquele estranho percurso. No entanto, Carlos acreditava que poderia conquistar Ângela; quem sabe o clima daquele lugar bucólico ia mexer com o seu coração. O trem pára em um povoado qualquer. As casas de tão pequeninas igualam-se aos anseios de Ângela.Logo avistaram tia Zuleika ,que vinham ao encontro dos dois e os envolvem com um forte abraço. Afagava as costas de Carlos, enquanto olhava para Ângela, e pergunta se já casaram.Os dois olham-se, e faz uma pequena pausa, depois riem.Tia Zuleika pede desculpa e diz que eles são modernos demais para esse tipo de coisa.E os puxa pelos braços,caminharam.

A casa da fazenda era antiga , mas muito bem cuidada. Os móveis, a decoração da parede ,lembravam um quadro renascentista.

---dorme bem aqui? pergunta Ângela

-- claro - diz tia Zuleika, e brinca dizendo que é só ficar na varanda olhando as estrelas e ouvindo a sinfonia das râs.

-- ótimo - diz Ângela rindo, sem levar a sério à receita de tia Zuleika.

Adaptaram-se logo aquele lugar diferente.Ângela gostava de passear a cavalo nas tardes ensolaradas. E essa prática deixava sua pele mais morena ,e mais sensual. Brincava com os colonos .Um deles insinuava-se sempre, deixando tia Zuleika preocupada, que alertava Carlos, dizendo que ele conquistasse o coração de Ângela o mais rápido possível, senão -dizia ela -vai ser um eterno desencontro.Carlos devolvia a brincadeira, perguntando a tia Zuleika qual daqueles colonos era o seu namorado.

- que isso sobrinho ! isso é pergunta que se faça a uma dama -

falando com um sorriso infantil e olhando para um homem alto, forte, de meia idade que tentava esconder o rosto sob a aba do seu chapéu

de palha.

As tardes eram longas, parecia intermináveis, mas enfim a noite chega. Os jogos de cartas na varanda era o passatempo preferido. Tia Zuleika entregava-se as cartas como um caminhante noturno, guiado pela lua , e desprezando a importância das estrelas.Dividia a atenção das cartas com a visão do homem alto , forte ,de meia idade; que agora libertado de sua engraçada vergonha fazia o papel do herói romântico.Carlos e Ângela ficavam desejando o final daquele embate, cansativo. Os dois tinham certeza que a ênfase de tia Zuleika era um disfarce para suas embriagantes noitadas de amor

--- bati - gritou tia Zuleika quebrando aquele silêncio monástico ,como Carlos definia.

Começaram as aventuras de corpos amadurecidos como se fossem brincadeiras pueris: tia Zuleika e o homem de meia idade. Carlos e Ângela permaneciam na varanda. A brisa morna acoitava os desejos esquecidos.E aconteceu ali, iluminados pelas luz das estrelas e ouvindo a serenatas das rãs. Estavam entreguem ao destino,ou ao acaso. E as férias terminaram. Um apito, era o trem.Tia Zuleika, com lágrimas nos olhos, imploravam o breve retorno. Os dois juravam que logo estariam de volta. No trem, através da janela, Ângela observa um cavalo correndo no cercado próximo, que tentava acompanhar o trem. Ângela olhava a cena com ar de satisfação, rindo , como aliviada pelo reparo de algo errado que fizera. Carlos, bem instalado na poltrona, com os olhos fechando-se, não tinha mais dúvida quanto a sua felicidade.

Soleno Rodrigues
Enviado por Soleno Rodrigues em 20/06/2007
Reeditado em 13/08/2016
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