A Morte Pela Desobediência

Uma vez, um caçador, em conversas com o soba gabou-se das suas qualidades de caçador, afirmando que já caçara várias espécies de animais mas nunca conseguira apanhar o pericano. Disse ainda que gostaria de provar a carne e especialmente o coração dessa ave.

O soba por sua vez respondeu que para apanhar o pericano era necessário, antes de tudo, apanhar um gafanhoto que servisse de isca na ratoeira porque o pericano gostava de alimentar-se de gafanhotos mortos. De seguida o homem retirou-se e o soba foi ter com o pericano escondido debaixo de uma kimbala e advertiu-o a não comer gafanhotos encontrados mortos em qualquer parte onde fosse porque o caçador o iria apanhar.

Não tardou, o caçador armou uma ratoeira utilizando gafanhoto como isca. Passando algum tempo, o caçador foi vigiar a ratoeira e encontrou o pericano morto. Levou-o consigo e entregou-o à mulher para prepará-lo para o jantar e retirou-se para os seus passeios.

A mulher cumpriu a ordem do marido porém, ao provar o caldo notou que o conduto estava delicioso e retirou o coração da panela e comeu.

Logo à chegada do marido, a mulher apressou-se a convidá-lo para o jantar e o marido, ansioso, procurou na tigela, o coração que tanto desejava provar mas não o encontrou porque a mulher já o tinha consumido.

O homem perguntou a mulher onde estava o coração da ave, mas a mulher responde-lhe simplesmente que o pericano não tinha coração.

Aborrecido, o caçador dirigiu-se ao soba para esclarecer o caso, mas o soba confirmou que o pericano na realidade não tinha coração porque no dia em que o caçador recebeu instruções sobre a melhor maneira de apanhar o pericano, este também foi aconselhado que deixasse de comer gafanhotos mortos para não se deixar apanhar pelo caçador que o procurava. “Se você conseguiu apanhá-lo foi porque o pericano não tinha coração, por deixar-se apanhar através da isca de que fora avisado a não comer”, concluíu o soba.

A partir de então, todos os caçadores ficaram a saber que o pericano não tinha coração.

salueira costa, 25/6/07

Conto de transmissão oral da comunidade ovimbundo do Chiumbo-Angola.