Sabedoria!...

-Sonhei com a senhora sem nunca, antes, tê-la visto, e era justamente neste banco que a vi sentada!

-Então ouça moça o que tenho a contar...

Sentindo uma excitação incomum, sentei próxima da senhora, que em seus 80 e poucos anos, ainda tinha um brilho vistoso nos olhos castanhos.

-Há muito tempo, eu vi, em um dia de outono como este, uma linda mulher pálida de olhos pretos como carvão sorrir pra mim, eu era apenas uma jovem, com todo o viço, ingenuidade, com a característica sede de viver, e quando a vi eu tremi com o pavor de quem está próximo a perder o que mais ama....-respirou fundo- era a morte minha filha, linda como um anjo, ali, em busca da alma que se desprendia desta vida, por que eu a vi? Não sei.. Mas ela sabia que eu a via, e sorriu, com os dentes sobrenaturalmente brancos, se aproximou de mim, inclinando a cabeça, chegando próximo a meu ouvido e disse: “O futuro é hoje, é agora, pois o tempo é apenas uma ilusão”, se endireitou em sua postura elegante e caminhou por um caminho de folhas secas, sumiu como uma nevoa branca, e eu senti um arrepio na nuca, confirmando a verdade daquela afirmação, por algum motivo, dali em diante vi tudo de um outro modo...

-Quando reparei, eu já não era mais um mocinha tola, e sim uma mulher com paixões profundas, que queria mudar o mundo, e assim, fui caminhando com suor e lagrimas numa busca quase vã de ajudar o maior número de pessoas, doei a roupa do corpo, a casa, a vida. Dei cada gota de mim, e hoje, sentada aqui nesta praça penso em algo..

-Em quê?

-No tempo que eu poderia ter desperdiçado sendo só mais um número na estatística, acomodada em meu sofá macio vendo o mundo se acabar, eu venci, e darei sempre graças ao bom Deus que um dia me permitiu ver um anjo, mesmo que o mais temido, mas que me deu a lição mais simples, e a mais importante, a de nossa pequenez e insignificância diante da eternidade do universo, da complexibilidade da vida. Ah minha querida, ouça o que digo, nada vale a pena a não ser os sorrisos, os segundos que perdemos ajudando os outros são os únicos que ganhamos, não vou falar de céu, pois o céu é o descanso de nossas almas, e para chegarmos lá temos que morrer- sorriu- e nem é necessário dizer que do outro lado colhemos o que plantamos, mas fazer aqui sem amor, não junta bônus do outro lado não! Não acredite pequena no que a TV diz, eles prometem coisas, sendo estas promessas coisas que eles gostariam que fossem verdade, se nosso vazio fosse preenchido por algo que podemos comprar em um shopping o mundo seria perfeito.- respirou fundo novamente- mas, para finalizar, ouça sempre seu coração, não abra mão daquilo que você acredita, ame a natureza, ame as pessoas, não veja uma massa disforme, veja indivíduos dotados de sentimentos e carências...-as lagrimas teimavam em escorrer pelo rosto, se escondendo entre os sulcos da pele branca- a vida é o segredo...

Ela olhou para um ponto da praça, tentei acompanhar o foco de seus olhos, mas, nada vi, ela pôs a mão no pescoço e sussurrou:

-Ela está ali, tão linda quanto naquele dia...

Desesperada eu segurei nas mãos dela, não queria que alguém com tanta sabedoria morresse ali, na minha frente, tendo tanta coisa para me ensinar.

-Peça para ela esperar!

-O verdadeiro sábio espera a morte como a uma visitante importante, veste sua melhor roupa, esboça eu melhor sorriso e diz com toda a certeza: cumpri minha missão.

Quando terminou esta frase a voz estava fraca, e muito baixa, as mãos que estava junto das minhas ficaram tão frias quanto gelo, e as lagrimas caíram abundantes de meus olhos. Quando ergui a cabeça pude vê-la, sim ela era mesmo linda, e ia caminhando calmamente, com a senhor a seu lado, por um caminho de folhas secas, me olharam com uma calma celestial e sumiram como uma nevoa matutina. Eu tinha recebido um presente muito especial, que era a oportunidade de dividir, de fazer o meu melhor...

T Sophie
Enviado por T Sophie em 30/06/2007
Reeditado em 06/08/2007
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