"Morena, Linda, Sensual, de Olhos Verdes" = Romance = Capítulo 15

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Romero pai foi o último a começar a rir, mas o fez mais por alívio do que por ter entendido a brincadeira.
- Pai, acho que o senhor vai morrer do jeito que sempre viveu: igual telefone público com defeito.
- O que quer dizer isso, seu palhaço?
- A gente tem que bater de lado pra ficha cair.
- Não entendi.
- Eu sei.
Romero era mais “perigoso” quando parecia conversar seriamente. Qem não o conhecia bem acabava caindo em suas armadilha e os demais em volta riam sem pena do incauto. Certa vez o pessoal da empresa estava muito calado na mesa do almoço e Romero puxou o assunto sobre modelos e desfiles. Quando lhe deram uma chance comentou:
- Gente eu tenho uma prima que é maravilhosa. Uma gostosura de mulher. Incrível. Um monte de homens vai buscá-la em casa todos os dias. Mas ela cobra um clichê altíssimo.
Plínio, que parecia distraído, corrigiu-o no ato:
- Michê, você quer dizer…
- Cachê, Plínio. Michê quem cobra deve ser a tua prima. Ela é o modelo e os homens fotógrafos. Michê quem cobra deve ser a tua mana.
Plínio saiu da mesa injuriado e a turma riu sem pena.
- Esse Romero é “soda”…
Um dia um candidato a prefeito de uma das cidades em que trabalharam entrou pelo hotel adentro pedindo votos indistintamente.
Romero abraçou o homem com total falta de cerimônia, com muito exagero de gestos e perguntou falando bem alto:
- O senhor fará uma administração séria, honrada e competente?
- Claro que farei. Juro.- o candidato respondeu no mesmo tom de voz e com alegria.
- Então não votarei no senhor.
- Por que não? Essa eu não entendi…
- Porque há mais de cem anos que minha família só vota em político safado. E não serei eu a quebrar tão bela tradição.
A risadaria desapontou o candidato, que foi pedir votos em outra freguesia.

Eliane, mesmo depois de passado tanto tempo, ainda se ri ao lembrar de uma outra atuação de Romero, acontecida no salão grande de reuniões da Editora onde o conhecera. O Diretor Geral de Vendas, figura grande e imponente, do tipo que impõe respeito pela simples presença, resolvera dar uma chamada geral em todo o pessoal de vendas. Todos levariam uma bronca séria e demorada. Diretores de teritório, gerentes, supervisores e, principalmente, os vendedores. cujas atuações estavam deixando muito a desejar naquele mês.
A certa altura de sua preleção o Diretor Geral chamou ao acaso um vendedor até o quadro. Por um acaso, chamou Romero entre todos os outros que poderia ter chamado, e pediu a ele que, quando avisado, escrevesse com o pincel atômico certas normas de venda.
Quando Romero chegou ao tablado, muitos riram por antecipação.
Romero subiu, deu um sorriso para o homem cirscunspecto, e postou-se atrás dele.
Quando o Diretor disse a frase:
- Teremos, então, que tomar algumas atitudes drásticas, impopulares. ..- a cara de Romero foi de terror total. Arregalou os olhos desmesuradamente, esticou a boca para baixo e deu uma violenta tremida geral no corpo.
A custo, todo mundo conseguiu controlar o riso e a preleção continuou:
- Alguns elementos, infelizmente, terão que ser cortados de nossos quadros…
Romero pareceu conseguir fazer parecer a quem o olhava que acabara de ser cortado e dividido ao meio, caindo de lado lentamente.
Muitos “tossiram” por trás das mãos e pastas, fazendo sons “parecidos” com risos abafados.
- Com as novas medidas, tenham certeza, os ganhos melhorarão sensivelmente para todos que ficarem e se dedicarem com afinco.
Difícil encontrar-se maior expressão de felicidade do que a de Romero naquele instante. Parecia em êxtase, quase em delírio de felicidade. E a “platéia” remexia-se nas cadeiras, olhando de lado ou para o chão.
Quando o homem parecia estar terminando sua preleção, resolveu ser um tanto quanto auto-biográfico e passou a contar trechos de sua vitoriosa vida, mas da maneira mais floreada possível. Aí Romero começou a mostrar que era mesmo um incrível mímico. O homem floreava os fatos de seu passado de muitas lutas e Romero interpretava, e linguagem nua e crua, o que ele contava. Só com gestos, sem uma única palavra:
Diretor: há apenas cinco anos atrás eu estava passando por apertos financeiros…
Romero: Estava na merda total (gestos rápidos e super expressivos).
Diretor: Passamos, em casa, a controlar os gastos, cortando os supérfluos…
Romero: Passando uma puta fome (mão esfregando a barriga e boca aberta, com a língua de fora.)
Diretor: Tivemos até mesmo que recorrer a aportes financeiros de alguns bons amigos…
Romero: Afanando aqui e ali ( gestos fáceis, indo e voltando).
A sala explodiu em gargalhadas incontroláveis e o Diretor parou de falar, confuso, pensando em onde errara, que motivo de risos dera ao contar o quanto sua vida fora apertada até entrar naquela maravilhosa empresa como simples vendedor e nela galgar todos os postos até chegar onde chegara.
Depois de esclarecido o motivo da risadaria, os diretores de território e gerentes tiveram dificuldade em impedir a demissão de Romero. Ele faria muita falta, inclusive como excelente vendedor.

Quando Carlos Beluzzi chegou à casa da amante, assustou-se com seus olhos inchados e vermelhos de tanto chorar.
- Meu Deus do céu! O que houve, minha morena? Morreu alguém da família? Me diga o que houve, minha morena linda.
- Graças a Deus não morreu ninguém, meu querido. Mas estou passando por uma coisa…Ah, meu Deus do céu! Uma coisa terrível. Você não pode nem imaginar, Carlos. Desculpe-me, espere um pouco. Não estou conseguindo nem falar direito. Deixe-me chorar mais um pouco…
Enquanto durou a choradeira sentida, Beluzzi conseguiu arrancar dela que era alguma coisa relacionada ao filho. Ao tal filho que ele não conhecera ainda.
- Mas diga lá, mulher. O que houve, afinal de contas? O menino está mexendo com drogas?
- Não. Não é isso.
- Foi atropelado?
- Deus me livre…
- É veado?
- Não, pô! Que grosseria…
- Já sei: entrou pra política.
A custo ela não riu, mas mantendo um lenço junto à boca conseguiu engolir o resto do choro e contou que a tal irmã que viera buscar o menino iria morar nos Estados Unidos por pelo menos um ano e cismara de levá-lo com ela. Como é que ela poderia viver um ano longe do filho amado? Mais calma, acabou conseguindo contar que brigara muito, discutira muito com a irmã e com o filho, mas que acabara convencida e vencida pela argumentação dos dois. Seria ótimo para ele aprender inglês lá nos States, conviver com uma cultura mais adiantada, que ela, a mãe, estava sendo egoísta em não pensar no futuro dele e muitos outros argumentos que ela não soubera refutar. Seu filho era muito adiantado, muito dedicado aos estudos, muito inteligente e muito “pé no chão” e seria uma pena não deixá-lo ir-se com a tia. Acabara deixando, mas estava duro demais engolir aquela separação repentina. Os dois safados, tia e sobrinho, haviam feito as coisas tão na surdina que ela só ficara sabendo no último instante. Eles embarcariam na manhã seguinte. Vê se pode…
Fernando Brandi
Enviado por Fernando Brandi em 01/07/2007
Reeditado em 20/07/2007
Código do texto: T547632
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