"Morena, Linda, Sensual, de Olhos Verdes" = Romance = Capítulo 23

"Morena, Linda, Sensual, de Olhos Verdes" = Romance = Capítulo 23

Assim que se acalmou um pouco, sabendo que Romero estava sendo atendido, Eliane ligou para os pais dele e deu a notícia à irmã caçula com o maior tato que lhe foi possível no momento. Que procurassem por ela na entrada do Hospital Municipal do Ipiranga. Não se oferecia para ir buscá-los devido à sua imensa agitação do momento.
Menos de meia hora depois ela e os muitos parentes de seu querido amigo faziam uma sofrida vigilância na recepção do hospital. A angustiosa espera durou toda a madrugada. Só pela manhã, o dia já raiando, um médico aproximou-se deles e comunicou que Romero não corria mais risco de morte, mas que a bala alojara-se em sua coluna e eles não podiam afirmar que coisa alguma quanto ao que seria dele dali em diante. Caso os mais pessimistas prognósticos se confirmassem, aquele homem ainda jovem, cheio de vida, que na véspera irradiava alegria de viver, tornar-se-ia paraplégico, sem qualquer chance de um dia voltar a uma vida normal.
Eliane chorou desesperadamente, sentindo um misto de alívio por ele ter escapado com vida e, ao mesmo tempo, uma revolta incrível pelo crime bárbaro e sem motivo algum que presenciara sem ter podido evitar. Somado a isso, o pavor de que o amigo tão amado nunca mais saísse de uma cama ou de uma cadeira de rodas.
Foi sem qualquer preocupação em esconder a verdadeira identidade que Eliane prestou depoimento na delegacia, ajudou na confecção do retrato falado do criminoso e colocou-se à inteira disposição da família Romero. Percebendo, pelas roupas e pelos carros que possuíam, que formavam uma família de poucas posses, fez questão de oferecer-lhes também seus préstimos financeiros, afirmando e reafirmando, sinceramente, que tinha verdadeira adoração por aquele seu amigo que tanto gostava da vida, das pessoas, de rir e fazer rir. Um adorável e maravilhoso palhaço incapaz de fazer mal a quem quer que fosse.
O velho carro de seu Romero, o pai, enguiçara na entrada do hospital e Eliane fez questão que ele aceitasse o dela emprestado sem qualquer pressa para a devolução. Teve que insistir muito, mas o homem acabou aceitando ao pensar o quanto economizaria em táxis nas muitas vezes em que teria que fazer o trajeto casa-hospital-casa.
Horas mais tarde Eliane saiu do hospital, foi de táxi a uma locadora, escolheu um modelo bem diferente e resolveu dar uma chegada até sua casa para pegar uma mala de roupas e o que mais viesse a precisar, decidida que estava a ficar por um tempo em São Paulo, até que o amigo ultrapassasse a fase crítica, pelo menos.
Ao entrar na via Anchieta Eliane jurou a si mesma que haveria de rever o bandido que quase matara Romero, custasse o que custasse, levasse o tempo que levasse. Nem que ela fosse obrigada a passar dezenas de vezes pelo trecho onde acontecera o crime. E ele teria, então, o imenso desprazer de saber com quem mexera ao fazer mal a Romero. Ela saberia levar a cabo uma vingança à altura da frieza com que ele cometera o crime, atirando em seu amigo com a mesma facilidade com que se mata uma barata.
À sua maneira, eficiente em todos os detalhes, Eliane faria com que o bandido pedisse todos os dias a morte rápida depois que eles se reencontrassem.

Enquanto pensava na vingança, absorta, quase passou direto por um ciclista que julgou conhecer de vista. Não acreditou nos próprios olhos!! O vagabundo assassino pedalava tranqüilamente pelo acostamento da estrada! Absolutamente certo da impunidade, na certeza de que ninguém o vira atirando em um homem na véspera, passeava sossegadamente, curtindo o sol da manhã e usando apenas um calção vermelho e um par de tênis.
Eliane parou o carro um pouco adiante, desembarcou e ficou esperando até que o ciclista se aproximasse. Tivera tempo de observar que ele parecia não estar armado visto que o calção era justo e ele estava sem camisa, não havendo qualquer tipo de bolsa pendurada na bicicleta. Desarmado. Decerto estaria de folga em seu “trabalho”. Aproximando-se lentamente de Eliane com a velha e pesada bicicleta, o homem perguntou, sorridente:
- Algum pobrema, morena bonita?
- Moço, o senhor não vai acreditar, mas eu parei aqui porque, de repente, me deu um medo danado, um pavor enorme de ir até Santos sozinha para resolver um problema. Parei aqui pra pensar. Só para pensar. Tenho medo de causar um acidente de tão agitada que estou me sentindo.
O homem riu gostosamente.
- É um perigo mesmo, morena bonita. Mulher no volante e pensando ao mesmo tempo é um perigo dobrado. Mulher tem que fazer uma coisa de cada vez pra não se atrapalhar, pra não complicar a cabeça.
Eliane fingiu achar muita graça na piada idiota e riu com exagero.
- Que bom encontrar alguém inteligente que sabe me fazer rir, moço. Mas meu problema é sério, muito sério mesmo. Coisa de muito dinheiro.
- Dinheiro nunca é pobrema, morena. Dinheiro sempre é solução. O que afrige esse coraçãozinho? Quem sabe a gente pode ajudar...
Eliane olhou-lhe nos olhos fixamente e ele gostou de encarar aquele lindo par de olhos de um verde profundo e brilhante. Conforme o rumo que a conversa tomasse ele levaria aquela mulher linda para o mato e depois de uma boa trepada levaria o carro dela e o que ela tivesse de valor. Claro que depois de estrangulá-la para não deixar testemunha falante. Por enquanto a deixaria completar seu assunto. Podia interessar-lhe.
- Olha, moço, eu sei que o senhor é um completo estranho para mim, apenas uma pessoa que está passando pela estrada em uma bicicleta, mas vou me arriscar e me abrir com você: eu tenho que ir a Santos buscar um dinheiro para o meu pai. O dinheiro que ele vai usar para comprar um ônibus novo para a viação dele. Como o caso é de muita urgência, o maluco do meu pai telefonou para o Banco do Brasil em Santos, pediu ao gerente que separasse o dinheiro que a maluca da filha dele aqui iria buscar a grana. É possível uma loucura dessas? Já pensou eu ter que voltar sozinha em meu carro trazendo uma quantidade enorme de dinheiro?
- E daí adonde é que eu entro na história, moça?
- Quero contratar seus serviços de segurança. O senhor é forte, alto, musculoso. Vai impor respeito pela presença, e é isso que eu mais preciso agora. Você aceitaria fazer esse trabalho pra mim?
- Tô achando esquisito seu pai te mandar, uma mulher, buscar tanto dinheiro tão longe...Num podia ter pedido uma “transferença” no banco? Eu entendo dessas coisas. Já fui segurança de banco.
- Poderia, mas o tempo é curto demais. Tenho que descer depressa e voltar voando. Estou pagando bem pela segurança. Quer ir?
- Claro que aceito, morena, Nasci pra dar segurança a mulher bonita. Mas o que faço com a bicicleta? Ela não cabe no porta-malas do seu carro...,
- Jogue fora esse cacareco, moço. Na volta você poderá comprar até uma moto usada com o que vou lhe pagar.
- Vambora, morena. O que ocê tá esperando?
- Estou pensando é na camisa que você não está usando. Como entraremos no banco com você deste jeito? E o banco é o lugar mais perigoso pra mim.
- Tem pobrema não. Conheço um muquifo no caminho que vende roupa usada. Aí tu me dá um adianto e eu compro uma camiseta e uma calça. É bem ali perto da primeira favela. Me passa algum que eu volto na estica.
Jogando a bicicleta no meio do mato o bandido entrou no carro e bateu a porta com violência.
- Vamos embora, menina, que eu tô doidinho pra ver dinheiro graúdo.

Com o homem já decentemente vestido, Eliane parou tranqüilamente no “Frango Assado”, pediu um bom lanche para cada um, comeu um pouco e pediu licença ao homem para correr ao banheiro, para uma emergência feminina. Ele apenas sorriu e continuou mastigando ruidosamente.
Eliane correu até o telefone público, do lado de fora, e discou os números rezando fervorosamente, pedindo a Deus que Beluzzi estivesse na corporação naquele momento.
Foi com alívio que logo ouvia sua voz.
- Carlos, ouça com toda a atenção, querido. Tenho que falar muito rápido. Estou com um bandido em meu carro. Depois te conto com detalhes. Ele irá comigo até a agência centro do Banco do Brasil. Devo estar lá com ele dentro de uma hora. Me espere lá, meu amor, e prenda o homem assim que entrarmos no banco. Ele é alto, forte e assassino perigoso. Tchau, meu amor.
Voltando ao balcão, Eliane sorriu feliz para o bandido.
- Graças a Deus está tudo em ordem no banco. Aproveitei pra telefonar e confirmar. O dinheiro já está contado, separado e esperando por mim. Ou melhor, por nós. Você é quem terá que carregá-lo, meu amigo. Pena que você não esteja armado.
- Isso é o que você pensa, morena. Depois te mostro onde está o trabuco. Não saio sem ele nem pra mijar na porta do muquifo.

= Continua amanhã.
Fernando Brandi
Enviado por Fernando Brandi em 11/07/2007
Reeditado em 20/07/2007
Código do texto: T561040
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