O VENTO

Aquela tarde tinha algo diferente, estava especial, por isso resolvi sair para caminhar e relaxar (fazia muito tempo que não tinha um momento só para mim).

Enquanto caminhava, a luz do sol passava entre as folhas das árvores e me atingia suavemente, eu podia escutar o canto dos pássaros. A minha alma foi se enchendo de uma paz que eu jamais havia sentido antes, e fiquei tão maravilhada que parei para apreciar a beleza encantadora daquele lugar.

Virei-me e, quando estava olhando para o horizonte, senti o vento acariciar meu rosto. Foi quando me recordei do que uma velha amiga sempre dizia: “Deus é como o vento, nós não podemos vê-lo, mas podemos senti-lo, por isso sabemos que ele existe”. Nesse momento minha face entristeceu, pois era uma recordação que estava guardada no mais profundo da minha memória e que realmente mexia com meus sentimentos.

Agora eu não podia mais lutar contra essa lembrança. Minha mente já estava completamente envolvida... Eu a conheci aos doze anos, no colégio. Aos poucos nos tornamos grandes amigas. Inseparáveis. Quanto mais o tempo passava, mais forte nossa amizade ficava: crescemos e passamos por diversos momentos juntas, o que incluía as confusas transformações, descobertas e experiências da adolescência.

Nós éramos muito diferentes: agitada e extrovertida eu era. Ela, meiga e tímida, parecia um anjo. Acho que por essas diferenças nos entendíamos tão bem: eu sempre a encorajava, e ela me aconselhava.

Mas a vida não era tão perfeita quanto parecia: Letícia precisou, a partir de um tempo, fazer tratamentos semanalmente. Às vezes, tinha recaídas e precisava ser internada. E eu, ao lado dela. Ela devia continuar. Eu não deixava transparecer a tristeza que sentia ao vê-la naquele estado: os longos cabelos em queda, e uma fraqueza inegável. Mas o sorriso ainda permanecia em seu rosto, agora pálido.

Era como se meu coração estivesse sendo dilacerado sem que eu pudesse fazer nada. Mesmo que eu quisesse estar em seu lugar para não vê-la passar por todo aquele sofrimento, isso não era possível. Por isso me sentia inútil diante daquela situação, mas era ela quem me consolava, pois mesmo sendo tão sensível ela era forte, muito mais forte do que eu. Quem não a conhecia não podia imaginar o problema que minha amiga enfrentava. Mas ela era surpreendente, porque, apesar de tudo, não perdia a fé e não se revoltava com sua condição: ao contrário, vivia como uma pessoa normal e continuava confiante na melhora (talvez isso tenha amenizado o nosso sofrimento).

Depois de algum tempo, seu organismo já não respondia aos tratamentos e houve a confirmação do que todos temiam: não existia mais a possibilidade de cura. Todos entraram em desespero, mas ela continuou com a mesma serenidade, como se já estivesse preparada.

Logo após completar dezessete anos, ela se foi, levando consigo uma parte de mim, pois nos completávamos. Eu sofri muito. Quem já passou por isso sabe que não há nada pior do que a dor da perda de uma pessoa querida... Mas, antes de fazer sua passagem, ela me chamou e disse, com voz calma: “Não se preocupe, vou me encontrar com Deus, mas estarei sempre com você”. Suas palavras doces soaram como um conforto para mim e meus olhos encheram-se de lágrimas, quando a única coisa que consegui fazer foi abraçá-la.

Apesar de não ter vivido muito, Letícia viveu o suficiente para dar um grande exemplo, transmitindo amor e luz à vida de todos que a conheceram e ensinando muitas lições, principalmente para mim.

Após recordar de tudo isso, emocionada, é como se eu me sentisse aliviada, pois, mesmo tendo passado dezessete anos, a lembrança de minha amiga ainda está viva em mim, como se ela estivesse aqui, junto comigo.