O Homem de Sapato Vermelho

Terno de linho branco, um grande charuto entre os lábios e reluzentes sapatos vermelhos.

Todos os dias segue a mesma rotina. Acorda, veste seu traje branco, calça aqueles sapatos vermelho, tranca o cubículo onde mora e vai tomar café da manhã na venda da esquina.

Põe o dinheiro no balcão e não fala nada. O rapaz da venda já sabe o que ele deseja. Café, tapioca e torradas. Come. Recebe o troco e vai até a praça olhar o tráfego. Pessoas passam apressadas, motoristas reclamam dos pedestres imprudentes, pássaros queixam-se da poluição.

Chega o menino engraxate. A pobreza é refletida em seu olhar. O senhor estende os sapatos vermelhos e abre um sorriso. O menino retribui o sorriso e começa seu trabalho. Engraxa os sapatos vermelhos que sequer precisavam de mais brilho. Abre a mão e recebe do senhor as moedinhas. Até amanhã.Pensa o menino.

Agora que já tomou café, engraxou os sapatos e viu a vida passar levemente como tudo que Deus faz, compra o jornal e segue à casa. Derrama o troco na latinha do mendigo.Há tempos aquele mendigo estava naquela calçada, sempre a espera do homem de sapato vermelho que aparecia todos os dias despejando um pouco de sossego em suas mãos.

Naquela tarde ele não chega a ler o jornal. Mas a manchete do seguinte relata a morte de um senhor solitário à porta de sua casa.

Em sua casa é encontrado um bilhete. O quartinho que morava deixa para o pobre mendigo e seus sapatos vermelhos, aqueles aos quais dava tanto valor e zelo, ele oferece ao negrinho engraxate, que promete, ás lágrimas, lustrá-los todos os dias e futuramente utilizá-los assim como o senhor o fez.

A praça não é mais a mesma; perdeu alguém que, mesmo anônimo, era importante. Amigos? Só o mendigo, o engraxate, os pássaros e os sapatos vermelhos

Jucarvalho
Enviado por Jucarvalho em 24/07/2007
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