"Morena, Linda, Sensual, de Olhos Verdes" = Romance = Capítulo 36


Eliane quase chamara o homem de volta ao ver a belíssima cifra apresentada no papel, mas lembrou-se a tempo que a pressa é uma grande inimiga dos bons negócios. Pensaria por alguns dias. A tentação era grande...
Naquela mesma noite Eliane sentiu de repente que “a ficha lhe caíra” e, como de hábito nestas ocasiões, deu tapas na própria testa xingando-se com veemência:
- Burra! Cretina! Idiota! Retardada mental dos infernos! Precisou que um sujeito saísse de São Paulo, viesse aqui em um helicóptero para que eu me tocasse!! Esse loteamento não é para o bico de merda de classe média nenhuma!
É coisa pra rico!! Pra quem tem o rabo cheio de dinheiro!! Um lugar maravilhoso, um ar puro fantástico, águas maravilhosas e curativas, e a estúpida aqui querendo colocar ao alcance de qualquer pé-de-chinelo...Cavala velha que não aprende...Vou mudar tudo e depressinha: preços, condições de pagamentos, valor da entrada, vai tudo mudar amanhã de manhã. Quem quiser um pedacinho do meu paraíso vai morrer com muita, muita grana mesmo. Ah,se vai...

Eliane não conseguiu dormir a noite inteira. Os planos acumulavam-se em seu cérebro e ela imaginava mil maneiras de chamar a atenção dos paulistanos endinheirados para aquela região, para a sua fazenda, espcíficamente.
Alguns dias depois o grandalhão do helicóptero recebeu um telefonema de Eliane e já se preparava para aumentar substancialmente a oferta inicial.
Eliane foi a simpatia em pessoa:
- Não, senhor Zafir, não quero mesmo vender a área, mas telefonei para lhe agradecer de todo o coração.
- Que merda é essa? Não quer vender e telefona para agradecer a proposta que não aceitou?
- É isso mesmo. Quero lhe agradecer por ter aberto meus olhos. Depois que o senhor se foi naquele seu paláciozinho voador, que custa o preço de um prédio de apartamentos, eu percebi que meu loteamento merecia outro tipo de investidores. Agora eu não o venderia nem pelo dobro do que o senhor me ofereceu. Mas muito obrigada por ter feito a visita. O senhor quer aproveitar para reservar alguns lotes?
- Vá à merda, moça.
Eliana recolocou o fone no gancho dando gargalhadas de felicidade. O homem não gostara mesmo de ter-lhe aberto os olhos para o óbvio. Para o potencial de exploração daquela área.

- Um idiota completo! Deve ser rico por herança ou por sorte. Se tivesse aparecido aqui em um carro comum, mesmo que de luxo, roupas comuns, sem aquela ostentação toda, e sondado devagarinho, como quem não quer nada, sem dar a entender o que pretendia, talvez até acabasse comprando meu loteamento pelo preço que ofereceu. Era capaz da burra aqui aceitar. Mas aquela exibição toda de poder financeiro acabou foi me abrindo os olhos. Um dia ele aprende...

Tendo agora em vista um novo público-alvo, Eliane viu-se diante de um pequeno problema: não conhecia pessoas ricas em número suficiente para os primeiros contatos, nem mesmo em número insuficiente, para iniciar as vendas. Os primeiros lotes teriam que ser vendidos a pessoa notoriamente abonadas, do tipo formadores de opinião, do tipo que outros do mesmo nível quereriam ter suas casas por perto. Algum médico famosíssimo, algum cantor em plena ascensão, ou um apresentador de tevê imensamente conhecido. Enfim, pessoas especiais com contas mais que especiais nos bancos brasileiros ou suíços. Serviam também políticos enlameados ou não, desde que reconhecidos pelo poder econômico.
Eliane, entretanto, iria com calma. O importante no momento era preparar um paraíso impecável. Depois conseguiria os Adões e Evas, Caims e Abeis para povoá-lo nos finais de semanas e nas férias.

Beluzzi, cheio de saudades da namorada, e pleno de orgulho pelo progresso e dinamismo da moça, cansava-se indo e voltando de Santos a São Pedro e de São Pedro a Águas de São Pedro , aparecendo no meio da semana, nos fins-de-semana, e geralmente não demonstrava a menor vontade de ir embora. Apaixonara-se pelo lugar quase tanto quanto se apaixonara pela nova proprietária da fazenda. Andava pelo loteamento enchendo os pulmões de ar puro como se quisesse levar para casa uma boa reserva dele, e fazendo planos de se mudar definitivamente para lá.
- Minha morena, acho que minhas filhas se dariam bem aqui. Águas de São Pedro é bem perto e a cidade está sempre cheia de velhinhos. Minha filha médica poderá fazer uma clientela imensa em algum tempo, e à que é advogada acho que não faltará trabalho com heranças e outras causas. A velharada poderá encher uma delas de dinheiro enquanto tenta viver um pouco mais e à outra antes ou depois da morte. Sei não, menina, mas acho que vou comprar alguns de seus lotes e mandar construir uma linda casona pra nós. O que você acha?
- Você não precisa comprar lotes, meu amor. Venha ver os que já reservei para nós. Reservei para mim, mas pensando em nós. Vamos ver juntos o quanto eles são bonitos e bem localizados.
- Por falar em filha advogada, já te contei a da contenda judicial entre Deus e o Diabo?
- Ainda não. Conte.
- Dizem que Deus e o Diabo se desentenderam e entraram na Justiça. Logo no primeiro Diabo o Diabo ligou e disse a Deus que Ele perdera a causa de antemão- Porquê? – Deus quis saber- e o Diabo respondeu: Quero ver você conseguir unzinho que seja , só um advogado aí em cima. E aqui em baixo tá lotado deles.
Eliane riu e comentou que ele tinha uma filha na profissão.
- A piada é sobre advogados. Advogadas não entram na história, amor. E além do mais minha filha é um anjinho de advogadinha.
- Então é melhor que ela mude de profissão. Advogado sem uma boa pitada de safadeza, maldade, jogo de cintura é igual feijoada sem carne de porco. Mas, falando sério, será que as suas meninas gostariam de morar aqui? É lindo demais o lugar, mas não tem badalação, vida noturna, não creio que agrade à juventude. Além do mais elas estão na idade de pensar em casamento...
- Não sei...As meninas não me parecem muito ligadas nesse assunto. Pelo menos no momento. Há tempos que não as vejo namorando, saindo com rapazes. Nem mesmo com a antiga turminha delas. Atualmente é do trabalho para casa, de casa para o trabalho. Acho que estão pensando mais é nas carreiras. Por falar em carreira, estou chegando ao fim da minha.
- É mesmo? Vai parar assim, de repente e tão novo ainda? Tão cheio de saúde, de disposição para tudo...
- Vou sim, mas não depende apenas de mim. Quando a PM achar que está na minha hora, não tem conversa. Saindo da ativa, serei promovido e passarei a viver da aposentadoria e de minhas rendas. Sem contar os meus invetimentos. Financeiramente não poderei me queixar, graças a Deus. Felizmente multipliquei várias vezes tudo que meus pais me deixaram. E não foi pouco. E, por falar em investimentos: quanto você me fará cada um dos lotes melhores e maiores?
Eliane não discutiu. Pegou a tabela de preços que havia preparado para os clientes da classe média, quando ainda pensava em “jogar fora” os lotes,e entregou-a a ele:
- Pronto, vou te vender pelos preços da tabela antiga. Você é rico, mas vai comprar a preços de classe média. E isso é um descontão imenso. E tem mais, se os preços não agradarem ao meu coronelzinho, darei ainda mais descontos.

= Continua amanhã.
Fernando Brandi
Enviado por Fernando Brandi em 28/07/2007
Reeditado em 28/07/2007
Código do texto: T582945
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