DONA ENCRENCA.

Logo depois da minha casa, desenhava um vasto sertão , com arvores da altura do céu, com campos cobertos por vasta vegetação onde a boiada gozam num repasto grandão, tem um riachinho bem gordinho , com peixes espertalhões , uma pinguela e um corre-mão de dar medo . Logo abaixo depois de um capão de arvores retorcidas, mora a Dona Encrenca, mas quem é dona encrenca? Ora eu a vi e vou lhe contar. Era uma mulher maior que papai, tinha lá seus dois metros de altura, magrela e ossuda, um cabelo mortuário recaído sobre os ombros, na boca se não me falhe a memória apenas dois ou três dentes , um nariz agudo e recurvado dividindo as bochechas sulcadas pelo tempo, umas pernas peludas de só ver. Morava só, havia perdido o marido numa tocaia , teve seis filhos , dois morreram no parto, um foi ofendido por bicho mau , os outros três ela contava com uma voz triste, que se foram de barriga d'água . Meu contato com ela foi pouco, e as poucas vezes que me colocava de frente com ela me perdia no seu jeito desajeitado de lidar com as coisas, andava se apoiando num cajado rústico , e era de poucas palavras,para zangar era um pulinho só.Vivia na solidão que conquistou, porque a vida é uma eterna conquista.O retrato melhor que trago dela, é quando ela se metia nos roseirais, ai eu via nela um pouco de encanto,as flores tem o poder de contaminar os corações endurecidos. Um dia minha casa reinava na fartura, meu pai tinha abatido um capado, bicho grande, e minha mãe mulher de coração derretido, enviou a dona encrenca umas miudezas a ela, confesso que suei para vencer a pinguela com aquele peso, ao abrir a cancela, lá vem ela com a mesma cara carrancuda,olhar azedo,nunca a vi sorrindo, nem com os olhos. Chegou, e sem dizer nada pegou a sacola e guinou para a cozinha, arrisquei perguntas, vai a missa? Nem um monossilabo, nem um resmungo, voltei com medo cheguei a arrepiar.

Mas o tempo passou, cresci, e voei no mundo como as Andorinhas que sempre me encantaram , porque o homem nasceu para voos .Minha família ainda resistiu naquelas bandas, mas por pouco tempo. Perdemos o contato ,o que me restou foram as escrituras das lembranças. Dia desse voltei a visitar o pequeno arraial dos Dantas, e assim as lembranças reviveram em mim, me endireitei até o encantado bosque, a pinguela ainda existe, o riachinho emagreceu, esta desnutrido, mas ainda escorre. A casa e sua história existe, cheguei a ir ao terreiro, bate palmas como antes, me tornei o menino medroso de outrora, mas nada além de um silêncio mortuário que afundava dentre tantas arvores . Não volteei a casa, rebobinei a fita, e assim me retirei. Fui então procurar João Lesma , um velho amigo, queria saber o destino de Dona Encrenca. E aqui descrevo o que ele me falou sobre seu destino, não sustento nenhuma

palavra ouvida, porque depois que ganhei letras,endureci para estas coisas misticas , mas esta é a historia colhida. Diz ele, João, que um dia amanheceu claro de cegar, e lá quando o dia envelhecia , e o sol dava de começar a recolher, ouve um estrondo medonho, coisa de arrepiar, e é assim que me sinto ao retratar este fato. O leitor deve ter notado que continuo o mesmo menino medroso, e sem querer ,crendo nas coisas misticas. Que um imenso vulto mergulhou no espaço azul do céu , coisa vista , ele afirmou, que após aquele dia a velha nunca mais foi vista. Outro já me disse que ela nunca existiu , que sempre foi uma alma penada que ali residiu, eu sei lá, não vou palpitar neste caso, para mim, na verdade essa história esta é mal contada.

Angelo Dias
Enviado por Angelo Dias em 08/01/2017
Código do texto: T5875660
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2017. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.