Drama LIA LÚCIA DE SÁ LEITÃO -NORMANDA-25/07/2007

Drama LIA LÚCIA DE SÁ LEITÃO -NORMANDA-25/07/2007

Quando se está ao volante do carro, absorto, às adversidades da estrada entram em ação; curvas, buracos, desvios, caminhões e o que seria um passeio de final de semana torna o caminho mais tenso e menos prático devido a esses perigos iminentes. Sozinho, liga-se o disc play nas alturas para livrar o sono e driblar a distância e distrair a alma, compenetrada em avançar a velocidade não permitida. Rapidamente passa o olho do lado do banco do passageiro e busca companhia, onde estará o ser amado? Desvia o pensamento e resolve tirar a imagem do ser insistente que continua a perseguir a velha história de amor com aquela musica. Irônico é o cérebro guardar os registros de tudo, até das últimas palavras à nossa música!

O carro avança como se conhecesse a autopista e os pensamentos se embaralham nas cartas da vidente que jogou o tarô na noite anterior, veementemente a vidente insistia: viaje, encontre pessoas que animem seus olhos, procure a felicidade mesmo que seja clandestina, essa é a Lei, essa é a mensagem das cartas. As mãos seguram o volante com firmeza como uma última tentativa de apoio buscando alento nos braços do ser que foi o porto seguro, agora enevoado pelo sentimento de perda.

Determina-se a aumentar o som e ouvir quase distorcido a velha musica que embalava ritmicamente preliminares do jogo amoroso a se descortinar na alcova, em penumbra do quarto de hotel, e atiçavam-se beijos mais audaciosos, deixavam-se as mãos do oleiro construir, na pele umedecida de paixão, suor e desejos, as curvas do êxtase.

O coração pulsa forte, quase uma taquicardia, borbulha na testa o suor que o vento não dissipa em conforto, os cheiros da estrada, mato queimado, cana nova, terra molhada, estrume, mais na frente o cheiro do melaço da bagaceira batem em cheio. O cheiro forte inibe a razão que exala a fragrância cortante dos perfumes mal utilizados nas noites de encontros, marca com o rótulo da impotência as vontades mal resolvidas, olhares ainda não decifrados.

O frio corta como navalha o rosto daquele que olha fixo o caminho de asfalto onde o olhar se perde nas paralelas da estrada, que nunca se encontram na linha do infinito, lembram que nada pode parecer ter fim, lembrando a dura realidade da fuga e da negação do ser, do carinho.

Quanto tempo falta para sair dali e ouvir o barulho do mundo? Quanto tempo falta para caminhar pelas areias brancas da praia e aceitar as rendas cobrindo-lhes os pés das seculares bordadeiras do mar.

Quanto tempo falta para esquecer a fala macia, as caminhadas em plumas, passar o tempo e ver fugaz o sorriso dos desesperados? Ajoelhou-se e pediu a Deus a posteridade, o sucesso, os olhos cravados nos olhos da natureza mais humana, implorou uma compaixão que insistia em não permitir o sim e chicoteava as emoções em não, não e não!

Sem despedidas, sem beijos, sem lágrimas, sem valsa, sem rendeiras do mar, o carro voa em círculos no meio da estrada, desgovernado como as esperanças do final de dia e cai do outro lado do precipício sem ninguém para aplaudir o drama do desespero.

Nomanda