Eu e o Tempo

Em um dia qualquer, numa cidade qualquer, um homem qualquer corria para mais um compromisso. Ele olhava para o relógio em seu pulso, e cada vez que o fazia, apertava mais o passo. Fizera isso o dia todo. Acordou e olhou o relógio. Tomou café olhando para o relógio. Saiu de casa olhando para o relógio. Olhou para o relógio enquanto esperava o trem e mais algumas vez a cada parada. Olhou para o relógio inúmeras vezes durante o percurso, mas o relógio pouco tinha a lhe revelar de novo.

O fato é que ele não estava atrasado para seu compromisso, nem nunca esteve em sua vida, mas isso não o impedia de tentar superar o tempo a cada segundo, talvez achando que se tentasse o suficiente, só talvez, pudesse obrigá-lo a parar, pois o tempo era uma entidade egoísta que não entendia que ele tinha muito a fazer, muitos sonhos e metas, e apenas uma vida para conquistá-los.

“Meus sonhos”, ele pensou, “tanta coisa pra alcançar e tão pouco tempo”. Sempre tentando abraçar tudo de uma vez, ele acaba se frustrando com o menor dos contratempos e apontando o tempo como o único culpado.

– Tempo, pare! – ele teve a sensação de ter dito em voz alta.

De repente, o tempo parou, assim como tudo à sua volta, e o homem ouviu uma voz:

– O que quer de mim?

– Eu preciso de mais tempo – Disse o homem depois de um momento de hesitação.

– Tempo? Já não lhe dou tempo o suficiente? De fato, possuis tanto tempo quanto qualquer outro, e até mais do que alguns têm a sorte de dispor.

– Mas... tenho tantas metas. Tanto que ainda tenho de conquistar... e sinto como se você me deixasse pra trás por mais que eu tente lhe alcançar.

– Falas como se eu estivesse indo a algum lugar. – Disse o tempo, não sem um leve tom de escárnio em sua voz. – Por que, exatamente, acredita que precisa me alcançar?

– Porque tudo se resume a tempo. Quando meu tempo acabar, também terá acabado a minha vida. – O homem sentiu uma conhecida aflição ao pronunciar as palavras. – O tempo é uma entidade imortal. Não seria capaz de entender.

– E por que vocês humanos, sempre acham que a morte é tudo que lhes aguarda?

O homem fez menção de responder, mas percebeu que não tinha palavras para tal. De fato, não conhecia a resposta. Embora passasse tanto tempo pensado em cumprir metas e alcançar sonhos, os pensamentos que mais povoavam sua cabeça eram sobre a morte. Uma morte vazia depois de uma vida vazia.

– Por acaso, nunca conquistou nada em sua vida? – O tempo perguntou, não para saber a resposta, mas simplesmente para ouvir o homem dizendo.

– Sim... na verdade, conquistei muitas coisas, mas...

– Mas nunca parou para celebrá-las? - O tempo o interrompeu.

O homem sabia que era verdade. Ele possuía suas conquistas, mas, depois de alcança-las, ele traçava novas metas, e assim, tudo o que ele possuía já parecia velho, vazio, pouco atraente.

– Vocês humanos são demasiadamente afoitos. Sempre tentando segurar mais do que suas mãos podem carregar, jamais valorizando o que já têm – Agora, o tempo soava quase paternal. – Não há nada de errado em sempre traçar novas metas, mas sempre haverá tempo para persegui-las, alcança-las e celebrá-las. Você deve entender que eu não sou um destino que um dia poderá ser alcançado, mas sim, uma estrada, sempre presente e sempre em frente. Então, caminhe no seu ritmo e, por que não, dê uma olhada na paisagem, de vez em quando.

O homem levantou a cabeça, e quando foi dizer mais uma coisa, percebeu que o tempo voltara a correr. Olhou para o relógio que marcava onze e trinta e sete, e pensou por um momento. ‘Eu tenho tempo,’ ele disse a si mesmo. Olhou para os lados, ouviu os sons à sua volta e deixou escapar um sorriso.

Havia vida.