O Porquê do mau humor

O que hoje relato não é nenhum estudo psicológico. Deixo essa parte para os profissionais dessa área. É apenas uma ligeira reflexão que faço a respeito de um senhor que conheci (?) e vivia eternamente mal humorado. Era como se ele estivesse diuturnamente de mal com a vida, ou, quem sabe? Mal amado. Era um vizinho, mas o cara era tão mal humorado, mas tão mal humorado que as minhas filhas, ainda pequerruchas, apelidaram-no de “Cara de Cachorro”. Com todo respeito a esses fiéis animais.

Era assim: se estivesse no elevador e qualquer pessoa entrasse e o saudasse, ele simplesmente ignorava. Fazia cara de paisagem, como se ali não houvesse entrado pessoa alguma. De igual modo agia ao entrar no elevador, ignorava quem ali estivesse e ainda lhes dava as costas. Fico até a imaginar, e perco a conta de quantos e quantas “Caras de Cachorros” existem nesse mundão de meu Deus. Para essas pessoas, as quais me deixam muitíssimo indignado pelas suas deselegantes atitudes, aviso, que a educação está sempre mandando lembranças.

Para que essa condenável atitude não contaminasse ou servisse de mau exemplo para os meus pimpolhos, sempre que com eles eu entrava no elevador, mesmo que não estivesse pessoa alguma sendo transportada e a depender do horário, eu falava: “bom dia, boa tarde ou boa noite elevador”. Falava de forma jocosa, mas subliminarmente tinha o propósito de condicioná-los a noutras oportunidades em que eles estivessem sozinhos e entrassem no elevador, saudassem quem estivesse utilizando aquele meio de transporte.

O apartamento no qual “Cara de Cachorro” morava era contíguo ao meu. Ele era tão de mal com a vida que certo dia à noite eu voltava do Monumental do Barradão, - aonde fui assistir ao Glorioso leão massacrar um adversário que, pelo tempo ido, não me recordo se foi o rival, nem o placar - Êta, acabo de comprar briga feia - e ao chegar a casa observei que as chaves de seu apartamento estavam pelo lado de fora da porta. Acionei a campainha do seu Apê. Ele atendeu e eu lhe falei: - vizinho você esqueceu sua penca de chaves pelo lado de fora da porta. O infeliz, esboçando cara de poucos amigos, pegou as chaves e, sem me agradecer pelo meu gesto praticado, fechou a porta.

Ainda tentei noutras oportunidades vencê-lo pelo cansaço, o saudando no elevador, mas não logrei êxito. O “Cara de Cachorro” simplesmente não correspondia. Pensei ser um caso pessoal, apesar de eu nunca ter visto ele mais gordo antes de ir morar no mesmo prédio que eu. Não, não era caso pessoal. Ele agia assim com todos os demais moradores do prédio. Meses depois prepostos da Caixa Econômica o despejaram do apartamento por ele não estar honrando o compromisso assumido com aquela agência bancária, quando da compra do imóvel.

Talvez fosse essa a razão do seu doentio mau humor.

Ah, ele nunca soube que o seu apelido era Cara de Cachorro!

Moral da história: As pessoas não nascem mal humoradas. As circunstâncias da vida é que as tornam azedas.

Salvador, 19 de abril de 2017.

Valmari Nogueira

Valmari Nogueira
Enviado por Valmari Nogueira em 19/05/2017
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