"Morena, Linda, Sensual, de Olhos Verdes" = Romance = Capítulo 43

   Eliane colocou a mão na enorme chave da eletricidade, desceu-a suavemente, encaixou-a um tanto quanto forçadamente nas presilhas ainda novas e viu, satisfeita, que as lâmpadas do escritório acendiam-se. Deu então uma sonora risada.
- Acho que acabo de deixar uma família inteiramente chocada...
Voltou a chave à posição em que a encontrara e, já inteiramente vestida e com os cabelos secos, que não deixara molhar, esperou a chegada do funcionário da companhia de eletricidade.
O homem não demorou muito.
- Bom dia, dona Eliane.
- Bom dia, moço. Estava esperando ansiosa pelo senhor. Não tive coragem de mexer em nada enquanto esperava a ligação da eletricidade. Do momento maravilhoso em que verei meu loteamento iluminadinho. Ai, meu Deus...Que aflição...
- Não há porque ficar aflita, dona Eliane. Ontem nós testamos tudo e está tudo na mais perfeita ordem.
- Se estiver mesmo, moço, eu vou lhe dar o beijo mais demorado que um homem já ganhou até hoje.
- Olha lá, dona Eliane. Eu sou casado e pai de filhos...
- E um beijo tira pedaço, meu amigo?
- Minha mulher é ciumenta que dói.
- Eu não uso batom, bobo. Ela não vai saber nunca. Quer saber de uma coisa? Se a luz acender direitinho, sem problema nenhum, eu vou te levar lá pro banheiro do escritório e comemoraremos com a melhor trepada da sua vida.
   O homem ficou vermelho até a raiz dos cabelos, mas riu satisfeito. Desde o começo do trabalho que vinha sentindo muita vontade por aquela morena linda, sensual, de olhos verdes. Abaixou a chave e sorriu para Eliane.
- Então vamos pro banheiro, dona Eliane?
- Vamos correndo.
  Quase uma hora depois os dois saíam do banheiro e o homem pensava em quanto precisaria para repor seu estoque de esperma. Aquela bela mulher o fizera gozar como nunca antes em toda sua vida e lhe ensinara coisas que ele teria que dar um jeito de ensinar à mulher e dizer que aprendeu em um livro.
- Caio, meu querido, agora nós vamos juntinhos dar uma volta pelo loteamento todo e ver se está tudo em ordem mesmo.
    Alguns minutos depois Eliane chorava desesperadamente, alucinadamente, descontroladamente à beira do laguinho onde jaziam três corpos inanimados, sendo dois ainda bem jovens e um já encanecido. Caio, o eletricista, apenas os olhava com olhos tão arregalados que pareciam querer saltar das órbitas. Ao inaugurar a eletrificação do loteamento ele matara, inadvertidamente, três banhistas, ficara sabendo depois, para seu desespero total de homem decente e amoroso. Um dos fios havia caído com a ponta dentro do lago e fizera dele uma armadilha mortífera.

   Providenciado o traslado dos corpo para Santos, já enterrada a família Beluzzi, Eliane voltou a São Pedro, examinou toda a bagagem dos três, recolheu tudo que havia de valor nela, tal como jóias, dinheiro, relógios, roupas finas, sapatos caros, talões de cheques que poderia vender a vigaristas conhecidos, e resolveu desfazer-se do loteamento de uma vez por todas. A morte de Beluzzi e de suas filhas abalara-a profundamente. Ao ouvir o coronel falando sobre ela em sua própria casa, sentira que todos seus planos para o futuro com ele iam por água abaixo e que nunca esteve tão próxima de uma cela. Venderia o loteamento ao tubarão do helicóptero, alegando urgência em tratamento de saúde, e passaria um bom tempo quietinha em seu canto.
- Que família abonado a do meu coronelzinho ! Só o que as meninas tinham de jóias já dá pra se viver na moleza por um bom tempo.   Cada coisa tão linda e cara que até me emociona. E a dinheirama viva que ele trouxe...Acho que queria comprar todo meu loteamento à vista...Que exagero o meu...mas que trouxe uma bela grana, isso trouxe. Vai ver queria comprar uma casa por aqui antes ou depois de me jogar em uma cela. O coitadinho gostou mesmo daqui. Tanto que cheguei a pensar em enterrá-lo no cemitério daqui. Grana, grana, grana, como eu te amo, graninha...Opa, o que é isso que estou vendo? Cheques assinados em branco pelo meu coronelzinho? Ah, vai ver que eram para a Andréa, que esqueceu o talão em Santos e queria fazer umas comprinhas. Maravilha das maravilhas, meu Deus! Mais dinheirinho na continha da Elianinha logo logo.

   A investigação policial sobre a morte do coronel e filhas resultou na conclusão de que o fio de alta tensão simplesmente se soltara do poste após algum problema sério no gerador. Uma explosão de um dos geradores seria a explicação certa para o fio ter se soltado, mas ninguém, das poucas pessoas das proximidades, chegou a ouvir o ruído que isso causaria. Depois de muitas idas e vindas ao local da tragédia, um policial encontrou um pedaço bonito e bem trabalhado do que parecia ter sido uma mesa redonda feita em pedra-sabão, o mesmo material que fora encontrado no fio, como se ali tivesse sido raspado. Intrigado, procurou pelo restante da mesa e acabou por encontrá-lo esfarelado. Só aquele pedaço que tinha em mãos, menos da metade de um tampo de cinqüenta centímetros de circunferência, mantivera inteiro por ter caído em cima de uma moita alta e densa.
- Bem, ninguém teria forças para jogar isso pra cima e arrebentar o fio na volta. Só pode ter vindo de cima.
   Seguindo seu palpite, o policial chegou ao aeroclube mais próximo e finalmente deslindou o mistério: uma família voltava em seu bimotor de uma viagem a Ouro Preto e na volta, por problemas em um dos motores, tivera que se desfazer do excesso de peso que havia no avião. Uma das coisas que jogaram fora foi uma bela e pesada mesa de pedra-sabão. A mesa, pesada, vinda do alto, foi o suficiente para arrebentar o fio e causar a morte das três pessoas.
   O investigador já ia saindo quando se lembrou de um detalhe e voltou a falar com o encarregado do hangar:
- A que horas o avião passou e teve que se desfazer do peso?
- Pouco antes das seis da tarde de ontem. Mais ou menos umas quinze pra seis. Estava claro ainda àquela hora, felizmente.
Estava tudo mais que claro e bem explicado: o fio se partira, caíra com a ponta no lago, ficara escondido pela vegetação e não fora, portanto, percebido. O funcionário da companhia de eletricidade não sabia do ocorrido e ligou a chave-geral inocentemente. Mortes totalmente acidentais, sem sombra de dúvida.

    Enquanto ele terminava suas investigações, Eliane sacava todo o dinheiro da conta de Carlos Beluzzi utilizando apenas um dos cheques, um documento falso e uma aparência totalmente diferente. Sem qualquer dificuldade. Sem qualquer obstáculo acrescentara muito mais dinheiro à sua própria conta.
- Pronto. Agora o meu coronelzinho dará uma ajuda póstuma ao meu querido Romero. Agora cuidemos de vender bem vendido o loteamento. O tubarão do helicóptero que me aguarde.

   O tubarão do helicóptero não a esperou. Por coincidência, passou-lhe pela cabeça novamente a vontade de arrematar aquelas terras e dois dias depois lá chegou. Voltava ao loteamento com uma oferta que só uma maluca total recusaria. E aquela moça bonita podia ser qualquer coisa, menos maluca.
   Ele entrou no escritório, jogou um cheque em cima da mesa sem ao menos cumprimentar Eliane e disse com arrogância:
- É pegar ou largar, sem mais conversas fiadas.
  Ao ver o tamanho do cheque Eliane apenas olhou para o homem com um sorriso e disse:
- No meu cartório ou no seu?
  Nesse meio tempo, nesse curto espaço de tempo, um homem de boné de motorista particular, de dentro do fabuloso “Mercedes” do tubarão do helicóptero, olhava fixamente a figura distante de Eliane. E fazia tudo para conter-se. Para conter-se e não sair do carro e matá-la com as próprias mãos.
   Eliane e o homem foram para o cartório da cidade no carro dela e o “Mercedes” acompanhou-os.

   À tarde, quando voltavam para São Paulo, o motorista, pedindo muitas desculpas pela liberdade que tomaria, pediu com muitos bons modos que o patrão lhe fornecesse o endereço de Eliane em Santos.
- O que houve, Geraldo? Acha que vai conseguir comer aquela coisa linda?
- Não é isso, patrão. A verdade é que tenho uma boa conta a acerta com ela. A gente tivemos uns desentendimento no passado de antigamente e ela tá entalada nos meus gragomilho.
- Tudo bem, Geraldo. Vou anotar o endereço e deixar com você. Não negaria isso ao melhor motorista que já tive até hoje. Você a conhece de onde?
- Ela era companheira de um preso, de um cara que conheci nos meus tempos na Penitenciária, quando eu era carcereiro. E ficou me devendo umas coisa de homi e muié, sabe? Tenho que cobrá dela.

- Bem, isso é problema seu, meu caro. Não me deixe esquecer de lhe dar o endereço quando chegar lá em casa. Você sabe que sou distraído, que ando sempre com a cabeça cheia de negócios a resolver.
- Sim senhor, patrão. Eu alembrarei o senhor.

= Continua amanhã
Fernando Brandi
Enviado por Fernando Brandi em 14/08/2007
Reeditado em 14/08/2007
Código do texto: T606431
Copyright © 2007. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.