Notas do cotidiano #6

As tardes de sábado têm um sabor especial, lhe dão a sensação de ser o todo do mundo.

Ser o dono da sua vida, do seu tempo.

Até alguém bater em sua porta...

Ao abrir a porta lá estava Betti

bantendo seu sapato com sola de madeira no chão,

impacientemente

- Demorou para abrir a porta, estava fodendo com alguma vagabunda? - disse ela ao entrar

Ignorei suas saudações.

- Vim buscar minhas coisas - disse ela

- Pode levar, está tudo aí- lhe disse apontando para uma caixa de papelão jogada no corredor.

- Seu desgraçado! Você jogou fora meu livro de poemas - disse ela ao revirar a caixa

- Aquilo era um completo lixo! - disse-lhe

- Foda-se! Eu gostava. Assim como gostava dos seus poemas - disse ela

- Sinto falta deles. Sinto sua falta.

- Foi você que me largou feito um cachorro sarnento!

- Você bebia demais!

- Mas ainda sinto sua falta - disse ela

- Continuo bebendo...

- É diferente, você é famoso agora. Várias pessoas leem suas coisas

- Só os idiotas leem o que eu escrevo

- Eu leio!

- Pois bem...

- Fique à vontade e leve tudo o que quiser - lhe disse, enquanto ia até a geladeira buscar mais uma cerveja.

...

- EI, AONDE VOCÊ VAI COM ISSO! DEIXE A PORRA DO GATO AÍ! - Berrei-lhe.

- Ele é meu, eu quem o trouxe para cá.

- Você o abandonou, assim como ME abandonou!

- Ele ainda me pertence, como seus pensamentos ainda são MEUS, eu sei!

- Meu coração um dia foi seu! E você o destraçalhou!

- Fique calmo docinho, não vou levar seu coração

- Não se pode levar o que não mais existe...