A aurora dos meus sonhos

Era um dia qualquer de inverno rígido e chuvoso, um céu bastante nublado e cheio de silêncio. Os dias em Itaporanga eram sempre silenciosos e densos, muito densos. Casas modestas, jardins pelos quintais, muros baixos e portões de madeira.

O dia caminhava lento e, ao final das cinco, o sol sempre estatelava seu reluzente amarelo em despedida. Ruas calmas, folhas passeando pela grama entre os canteiros, nem o som de pássaros se ouvia.

Logo as seis, todas as donas de casa corriam para seguir o capítulo da novela, enquanto o feijão cozia no fogo. Dava para ouvir o chiar das panelas e o plim plim da TV anunciando a hora. Nesse tempo, o Joaquim corria para a praça com o violão nos braços, porque ensaiar em casa naquele instante era impossível. Mas a friagem constante não pausava e sua ansiedade em tocar lhe corroia as têmporas.

Não podia imaginar-se distante, mesmo que unido ao violão, aquilo que mais amava, a música e só depois... não conseguia enxergar o que viria depois da música que lhe era tão sutil proporcionando o sentir da alma e cada membro de seu corpo em sintonia, mesmo que por instantes.

Pôs-se a refletir com os cotovelos na janela e os joelhos assegurados na cama encostada na parede. Pensou que nada nesse mundo pudesse oferecer tanta segurança e certeza de viver, como se pudesse saber todas as respostas, embora sem palavras. Energia contaminando-lhe o corpinho franzino e espichado.

Os olhinhos fundos de tanto acreditar no infinito podiam lhe trazer a dor e o sentimento mais humilde, mas preferia amar a música, o vento, o crepúsculo das seis e o mar, a chuva, borboletas, pássaros, árvores, nuvens, estrelas e o amar. Simples assim.