LA VIE EST BELLE

No interior da panificadora o movimento intensificava-se ao anoitecer. A espera pelo atendimento era enfadonha.

Lemo dirigia sua impaciência entre pães, tortas, bolos e outras iguarias, enquanto aguardava ser chamado pelo número do tíquete recebido na entrada.

O cheiro da massa alimentícia que se espalhava pelo ambiente e provocava seu apetite, de modo repentino, conteve-se ante um acentuado e exótico perfume. Eis que pelos ares um valor mais alto se apurava.

Uma mulher charmosa, corpo sedutor, traje esporte fino, rosto arredondado, cabelos e olhos castanhos trouxe um novo ânimo em meio a angustiante espera. O tempo passou a rabiscar jasmins e gardênias na imaginação de Lemo...

Na verdade, todos avaliavam a elegante personagem. As mulheres, diante da indubitável competidora, em vão buscavam encontrar alguma pecha que viesse desacreditar a estonteante beleza. Os homens, em maioria boquiabertos, mostravam-se vencidos pelo encantamento.

Lemo, de modo discreto, deixava-se levar pelas propriedades magnéticas da formosura. Atendido no balcão, ele escolheu uma das filas de pagamento, justamente a mais emperrada. Algum tempo depois, a atraente mulher estava ao seu lado.

Efetuada a compra, Lemo se dirigia ao estacionamento para apanhar o carro, quando, atrás de si, ouviu passos ligeiros ritmados por sapatos de salto. O perfume volumoso que se aproximava, o fez lembrar da mulher de olhos amendoados. Dentro em pouco, temperada com mel, uma voz suave o envolveu:

- Você poderia me acompanhar até a porta daquele edifício do outro lado da rua? Ainda ontem, fui abordada de forma inconveniente por aqueles moleques que estão sentados no meio fio.

Lemo não tinha vocação para herói, mas a oportunidade de se mostrar cavalheiro, além do agrado da companhia, não lhe deixavam escolha.

Para afastar eventual gracejo dos meninos, a resguardada juntou-se ao protetor e segurou seu braço. No momento em que atravessaram a rua, Lemo sentiu delicada e deliciosamente o seio e o quadril da bela mulher. A esse gosto, por certo, ele enfrentaria não só a molecada, mas qualquer monstro que viesse pelo caminho.

Ao chegarem na entrada do prédio, Lemo foi surpreendido por um agradável convite:

- Não sei como agradecer sua gentileza. Você subiria até meu apartamento para tomar um café?

O convite era sedutor. Seria possível recusá-lo? Confuso, Lemo se viu como uma presa do fascínio, mas logo tratou de se recompor. Era fiel. Vivia com Agar há bastante tempo, além disso, a situação não autorizava conclusões precipitadas.

**************

Enquanto retornava para o lar, Lemo estranhou o fato de não ter sido procurado por sua mulher, que se mostrava impaciente quando o pão vinha arrefecido. Sempre que se demorava, por motivo ou outro, ela o interpelava através do telefone. Mas, desta feita, não lhe foram requisitadas explicações.

Ao abrir a porta de casa, Lemo se admirou ao ver Agar eufórica, vestindo um sedutor robe de chambre, a emanar almíscar e patchouli.

A sensação era mais do que justificada. Agar recebera de um dos diretores da multinacional em que trabalhava, a comunicação de que representaria a empresa no encontro sobre empreendedorismo e qualidade de gestão, a ser realizado em um luxuoso hotel nos Alpes Suíços. Junto com a notícia, vieram as rosas colombianas que perfumavam a sala.

Naquela noite, Agar e Lemo foram dormir voltados para lados opostos. Ele sonhava embriagado pelo aroma de gardênias e jasmins. Ela repousava o ego entre as pétalas cor de champanhe que perfumavam a sala de estar.