AS LEIS DA FÍSICA

Em atividade extra veicular, preso à estação espacial por um cabo de aço, Will Adam Jr. substituía peças em um dos módulos da estrutura aérea. Muito abaixo dos seus pés flutuantes, dunas vermelhas serpenteavam desertos. Águas volumosas fluíam nos oceanos a interagir com a luz do sol. Para refrigério do espírito, numa zona despovoada do Tibete, em forma de coração, um lago pintava-se de azul intenso.

Tudo corria normalmente em órbita da terra a uma altitude de mais de 400 km, até Will detectar um problema na pressurização do seu traje. O incômodo surgiu repentino e se foi pelos caminhos da aflição.

A adversidade se agravava. O oxigênio começou rarear e a temperatura sentida por Will lhe conferia desconforto. Para aumentar a pungência, o cabo umbilical que o ligava à estação se partiu após ser atingido por um micrometeorito. A angústia tomava conta do aventureiro espacial que se viu asfixiado e na iminência de perder os sentidos.

Vozes abafadas, cada vez mais distantes, chegavam aos seus ouvidos:

- Sem pânico. Iremos trazer você de volta. Sem pânico, Will. Iremos trazer...

Enquanto membros da tripulação se dedicavam a um dificultoso resgate, flutuando a esmo e no limiar do desfalecimento, Will se lembrou da infância passada em Benson, um povoado do Arizona com menos de cinco mil habitantes.

Vieram-lhe à memória as montanhas e formações areníticas que reverberavam entre o âmbar e o carmim durante auroras e crepúsculos.

Will lembrou-se de sua mãe preparando o jantar no feriado de ação de graças. Naquele povoado, onde o noturno elevava o pensamento e melhor expunha a imensidão dos céus, viu-se mapeando estrelas ao lado do pai.

Embora nascido em uma pequena localidade, decididamente, ele não se contentara em ficar com os pés no chão. Para orgulho doméstico, teve êxito nos estudos. E o contentamento elevou-se ainda mais entre os missionários da pequena cidade, pois a ciência não o distanciou do criador que houvera, de acordo com as normas espirituais, conferido um propósito ao universo e ao ser humano.

Will Adam Jr. educou-se sob princípios religiosos. A família confessava regularmente sua crença no modesto templo da localidade onde moravam. E justo agora, era sua fé que evocava um prodígio. Will lembrou-se então das palavras do profeta:

- “Ele livra e salva, faz sinais e maravilhas nos céus e na terra...”

Mas como deus o ajudaria? Afinal, precisava de oxigênio. Era necessário que fosse de imediato resgatado. Milagres, contudo, eram improváveis. Na quietude das alturas, as maravilhas como vistas da terra são outras e não se compadecem com a fragilidade humana. Naquele momento, era em uma pequena comunidade religiosa do Arizona que a divindade estava presente. Lá no alto, cabia a Will submeter-se às leis da física e a perícia dos seus pares.

Coincidentemente, na exata ocasião em que lutavam para resgatá-lo com vida, alheio à desdita, o coral sacro da comunidade em que Will nascera, na sua diária profissão de fé, contagiante e emotivo, entoava glórias ao criador.

Naquele preciso momento, as montanhas e formações areníticas da pequena localidade, retocadas pelo crepúsculo, brilhavam em vestes rubras e douradas.

A ousadia humana, a aflição e o destino do astronauta pouco importavam ao dinamismo universal.

As vozes do resgate sumiam abafadas... Will começava a ouvir um silêncio maior do que o universo.

Logo, sujeitas ao equilíbrio estético e as leis da gravidade, estrelas frias e distantes pontilhariam os céus de Benson.