EM BUSCA DA FELICIDADE

Churrascaria Eldorado. Da calçada observo o sujeito saltar do seu carro importado com a mulher a as crianças de bochechas gordas e vermelhas como um tomate.

A maioria nem sabe por que agiu dessa ou daquela maneira. Por que foi tão cruel, tão monstruosamente mau.

Nada é por acaso. Assassinato. Roubo. Estupro. O que todos procuram na verdade é a felicidade.

Nunca fui um sujeito alegre. Não que eu me lembre. Nem breves momentos, como dizem os estudiosos. Para os psicólogos a felicidade é mais do que um emaranhado de sentimentos intensos e positivos.

Procurei ajuda profissional. Mas os remédios só me viciaram, me tornando cada dia mais depressivo. A felicidade tem que durar mais que uma dose de dopamina.

Cheguei a acreditar que a caridade, ajudar os necessitados, me traria alguma alegria. Para o filosofo Aristóteles, um homem feliz é um homem virtuoso.

Acabei perdendo todos os meus bens, fazendo doações às instituições de caridade. Lembrando que não sou um sujeito rico. Nunca fui.

Hoje quando vejo meu extrato bancário me sinto ainda mais infeliz.

Decidi roubar um carro. Desses importados. Desses que só os bacanas ricos dirigem, com seu Ray Ban preto.

Existe um ditado popular que diz que o dinheiro não traz felicidade. Tinha lá minhas duvidas.

Fiquei ali parado. Na calçada. Em frente daquela churrascaria chique. Nunca achei que seria tão fácil. Logo um sujeito parou com seu carrão e me entregou a chave.

- Não estacione em qualquer lugar. E cuidado com a pintura.

O otário achou que eu fosse funcionário da churrascaria. Aqueles que estacionam os carros.

Sai acelerando. O motor potente. O cheiro de coro dos bancos. Aquilo era realmente agradável. Peguei o Ray Ban preto no porta luvas.

Foi quando ouvi um estrondo no capô. Desci do carro. Era uma velhota estatelada na faixa de pedestre. As pessoas se aglomeraram rapidamente.

Eu a reconheci. Era a velhota que eu ajudava a atravessar a rua na minha fase aristotélica. Odiava quando tinha de ajudá-la. Mas como dizem alguns estudiosos no assunto, a felicidade duradoura não só trata apenas de fazer aquilo de que gostamos. Tinha lá minhas dúvidas, mas seguia a cartilha a risca.

Ela era meio surda e corcunda. Passos lentos. Eu tinha de repetir mil vezes a mesma coisa. Gritando. Odeio gritar.

Vendo ela ali, esborrachada no asfalto, as pernas separadas do corpo, o intestino, o sangue e outras coisas que não pude identificar, cobrindo a faixa de pedestre, me deu um certo prazer, uma sensação plena de paz e contentamento.

É esta a paz interior e bem estar espiritual de que os estudiosos chamam de felicidade? Eu descobrira enfim a minha felicidade?

A advogada que esta tratando do meu caso, disse que logo serei liberado, se eu tivesse dado um tiro na velhota seria mais complicado, mas atropelamento no nosso país, com os meus antecedentes, não dá em nada, nem precisa ser rico, disse minha advogada. Compadecido, o dono do carro nem registrou o roubo, depois de lhe contar que conhecia a falecida e toda aquela historia da minha fase aristotélica.

Não vejo a hora de sair dessa prisão. Agora que descobri como ser feliz. Agora que descobri como a coisa funciona. Não importa. Seja correr no parque. Brincar com os filhos. Fazer boas ações. Ou simplesmente sair matando as pessoas por ai. Os idiotas daqueles filósofos estavam certos, a felicidade é um estado mental e, como tal, pode ser intencional e estratégica.

F Mendes
Enviado por F Mendes em 14/08/2018
Código do texto: T6419208
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2018. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.